Produtores de uva do Circuito das Frutas Paulista – uma região que abrange dez municípios de São Paulo conhecidos pela fruticultura – estão enfrentando grandes perdas devido ao avanço da podridão da uva madura, uma doença causada pelo fungo Glomerella cingulata. De acordo com as informações que foram divulgadas pela Embrapa, o fungo encontrou condições ambientais favoráveis para se proliferar nos vinhedos da região e, há pelo menos quatro anos, tem prejudicado os vitivinicultores locais. Nesta última safra, os danos provocados pelo patógeno atingiram níveis sem precedentes, com perdas variando de 30% a até 100% da colheita.
Renê Tomasetto, presidente da Associação Agrícola de Jundiaí, destaca que 2023 foi um ano atípico, marcado por chuvas acima da média durante a época de poda e colheita, intercaladas por períodos secos. “Essa não é uma doença desconhecida, mas, da forma como ela se deu neste ano, assustou muita gente. Alguns produtores até arrancaram o vinhedo inteiro, achando que não conseguiriam mais controlar de forma viável”, afirma Tomasetto.
Na Câmara Setorial de Uva e Vinho do Estado de São Paulo, a Associação Agrícola de Jundiaí apresentou à Embrapa uma demanda por medidas para reduzir a pressão da doença e, se possível, erradicar a Glomerella nos vinhedos da região. Com representação nesta Câmara, a Embrapa Territorial (SP) articulou a participação de pesquisadores da Embrapa Uva e Vinho (RS) e dos órgãos estaduais. Com especialistas das prefeituras e das entidades do agro locais, esse corpo técnico traçou um Plano Emergencial de Controle à Podridão da Uva Madura em auxílio aos vitivinicultores paulistas.
A doença
Causada pelo fungo Glomerella cingulata, a podridão da uva madura provoca manchas circulares marrom-avermelhadas sobre o fruto, que posteriormente atingem todo o cacho, deixando a uva escura e murcha. Temperaturas entre 25 °C e 30 °C e alta umidade proveniente de chuva, orvalho, irrigação ou cerração são condições ideais para a esporulação, disseminação, infecção e o desenvolvimento da doença.
Práticas de controle
O analista da Embrapa Rafael Mingoti atuou diretamente na fase inicial do plano. Ele avalia que, a partir da união das instituições, poderão ser realizados ajustes nas práticas de controle da doença, desde os tratamentos de inverno, adubação, tratos culturais e controles biológico e químico, o que por si só já trará resultados benéficos.
A primeira fase do plano consiste na seleção de produtores receptivos à instalação de ensaios de controle da podridão da uva madura. No período de 1º a 4 de julho, o grupo de especialistas visitou propriedades localizadas em Jundiaí, Louveira, Itatiba, Itupeva, Jarinu, Indaiatuba e Elias Fausto, para conversar com os proprietários sobre o projeto e coletar restos culturais – amostras nas quais o patógeno sobrevive no período de dormência das plantas, como cachos mumificados, ráquis e gemas dos ramos da videira.
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Isolamento do patógeno
Esse material será levado para o Laboratório de Fitopatologia da Embrapa Uva e Vinho, onde se desenvolverá a etapa seguinte, visando ao isolamento do patógeno, a sua identificação por meio da morfologia e testes para detectar a presença de isolados resistentes a determinados grupos de fungicidas. “É preciso identificar as espécies da fase assexual da Glomerella e avaliar a sua sensibilidade e tolerância aos fungicidas, pois alguns isolados podem se tornar resistentes a determinados produtos devido ao uso indiscriminado”, explica o pesquisador Lucas Garrido, um dos especialistas da Embrapa Uva e Vinho convidados para essa ação.
Linhas de enfrentamento
Garrido ressalta que o conjunto de ações propostas prevê duas linhas de enfrentamento: a primeira, com medidas para adoção imediata, visa reduzir a pressão do patógeno presente nos vinhedos; e a segunda, a redução da taxa da doença ao longo da safra. “É importante a atuação em pelo menos duas safras para colher resultados. Nesse primeiro momento, serão visitados alguns vinhedos para mitigar as causas que contribuíram para a epidemia da doença na região e corrigir algumas práticas adotadas pelos produtores. Depois, a médio prazo, vem a adoção dos melhores produtos e práticas, que serão estudadas ao longo dessas duas safras, de tal forma que se torne um protocolo rotineiro”, reforça Garrido.
Transferência de conhecimento
O grupo de especialistas também instalará ensaios nas propriedades selecionadas e acompanhará os resultados. Garrido adianta que esses trabalhos vão averiguar a eficácia dos produtos em testes para acelerar a decomposição dos restos culturais do vinhedo – materiais nos quais o patógeno sobrevive de uma safra para outra. Eles irão também realizar a aplicação de indutores de resistência, aumentando a capacidade de defesa da planta; além de elaborar recomendações de manejo integrado para os produtores que tiveram grandes perdas.
O conhecimento gerado por esses experimentos será transferido aos produtores do Circuito das Frutas em eventos a serem organizados. “A realização de experimentos no campo e no laboratório resultará num grande benefício, que é a certeza de qual é a espécie do fungo e quais medidas e produtos biológicos e químicos são mais eficazes para seu controle. Tudo isso devolverá a confiança dos produtores nas práticas e na condução da lavoura”, afirma Mingoti.
Fonte: agrolink