Manobra política, caneta na mão e aliança com os EUA: o que está por trás da reeleição de Noboa?


A vitória veio após um primeiro turno acirrado, em que Noboa superou sua principal adversária, Luisa González, por uma diferença de apenas 17 mil votos. O que mudou em dois meses?
Victor Cabral, doutorando em relações internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e pesquisador do Observatório Político dos Estados Unidos (OPEU), analisou o pleito.
“O presidente tinha a caneta na mão. Decretou estado de exceção, intensificou a presença militar nas ruas e inaugurou obras públicas nesse intervalo. Ele teve tempo e recursos para se tornar o protagonista da campanha“, explicou o pesquisador.
A legalidade da candidatura de Noboa também foi questionada. A Constituição equatoriana exige que o presidente se desincompatibilize do cargo para concorrer à reeleição, algo que Noboa não fez.

“Ele deveria ter passado o cargo para a sua vice, Verónica Abad, mas manobrou para afastá-la politicamente e permanecer no poder”, destacou.

Diante do resultado, Luisa González se recusou a reconhecer a vitória de Noboa e alegou possível fraude eleitoral. Segundo ela, o presidente manipulou o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) e usou o estado de exceção para intimidar opositores. No entanto, até o momento, não há evidências concretas que sustentem as alegações.
Mesário entrega cédula a eleitor durante a eleição presidencial em Quito. Equador, 9 de fevereiro de 2025 - Sputnik Brasil, 1920, 10.02.2025

“Ela tem o direito de pedir recontagem dos votos, mas precisa apresentar provas. Tanto a missão da OEA [Organização dos Estados Americanos] quanto a do COPPPAL [Conferência Permanente de Partidos Políticos da América Latina e Caribe] — organismos com linhas ideológicas opostas — atestaram a normalidade do processo eleitoral“, disse Cabral. Mesmo figuras influentes de seu próprio partido, a Revolução Cidadã, como o prefeito de Guayaquil e a prefeita de Guayas, já reconheceram a derrota.
Para Adriano Cerqueira, professor de relações internacionais do Ibmec Belo Horizonte, o contexto internacional teve papel fundamental na consolidação da campanha de Noboa. A influência norte-americana na região, intensificada com a vitória de Donald Trump e os recentes gestos diplomáticos — como o encontro entre Noboa e Trump em Miami e a visita de autoridades como Marco Rubio ao Panamá — criaram um ambiente favorável à narrativa de alinhamento com os EUA.

“Essa aproximação foi percebida pelo eleitorado como algo positivo. Noboa soube capitalizar isso, principalmente ligando a cooperação com os Estados Unidos ao combate ao narcotráfico, tema central na campanha“, explicou Cerqueira. Segundo ele, Noboa sinalizou uma aproximação pragmática com Washington, sem adotar um perfil submisso, o que fortaleceu sua imagem diante do eleitorado.

Outro ponto relevante foi o contexto de insegurança pública no país. A escalada da violência e o crescimento de gangues, principalmente em cidades como Guayaquil — hoje, entre as mais violentas do mundo — impulsionaram medidas duras de segurança adotadas por Noboa. Apesar de sua popularidade ter oscilado, o presidente ainda surfou na imagem de líder firme diante do caos.
Apoiador de Daniel Noboa segura um recorte do chefe de Estado equatoriano perto da Assembleia Nacional, onde o presidente apresenta seu primeiro relatório à nação após seis meses no cargo, em Quito, em 24 de maio de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 10.02.2025

Cabral pondera que, embora Noboa adote medidas autoritárias, ainda não se pode classificar seu governo como autocrático. “Há riscos quando se brinca com os limites democráticos, mas por enquanto, o Equador segue sendo uma democracia — com desafios evidentes”, afirmou.
Internamente, Noboa enfrentará o grande desafio de responder à escalada da violência e à expansão do narcotráfico, em meio à expectativa popular por medidas mais efetivas. O professor ressalta que o modelo salvadorenho de combate à criminalidade, embora citado como referência, tem sido alvo de críticas por seu viés autoritário. “O desafio é enfrentar esses problemas sem romper com o regime democrático”, alertou Cerqueira.
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Fonte: sputniknewsbrasil

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