A mais recente edição do Talk Show “A Voz do Mercado”, exibida em 9 de julho de 2024, trouxe à tona discussões importantes sobre o Plano Safra 2024/2025 e seu impacto no crescimento do agronegócio brasileiro. A edição contou com a participação de especialistas do setor, proporcionando uma análise aprofundada dos pontos mais relevantes do plano.
A jornalista Suelen Farias, juntamente com Ivan Wedekin, consultor e ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, conduziram o programa. O debate foi enriquecido pela presença de Gilson Bittencourt, subsecretário de Política Agrícola e Negócios Agroambientais do Ministério da Fazenda; Gustavo de Castro Freitas, diretor de Negócios, Crédito e Produtos do Sicredi; e Antônio da Luz, economista-chefe da Farsul e CEO da Agromoney.
Suelen Farias destacou a importância do Plano Safra 2024/2025, um dos maiores da história, com um montante recorde de R$ 476 bilhões. No entanto, a medida foi recebida com críticas por diversas entidades do setor, que apontaram a falta de redução das taxas de juros para a agricultura empresarial, fator fundamental para a redução dos custos de produção em um cenário de queda nos preços dos principais produtos agropecuários.
Juros e Crédito Rural
Gilson Bittencourt foi questionado sobre a decisão do governo em não atender ao pedido dos produtores rurais por taxas de juros menores. Ele destacou os desafios enfrentados pelo governo para manter taxas de juros mais baixas nas operações de custeio e investimento para médios e grandes produtores. “Apesar da redução da taxa Selic, os custos de equiparação aumentaram devido à redução de fontes de recursos, com cerca de R$ 20 bilhões a menos provenientes de depósitos à vista destinados à agricultura neste ano”, afirmou. Bittencourt ressaltou que houve uma queda de quase R$ 30 bilhões na poupança, recurso que possui um custo de equiparação menor, de aproximadamente 3,5% ao ano. “Para manter as taxas de juros entre 7% e 8,5% para o Pronamp, enfrentamos um aumento de 16,4% nos custos para a agricultura empresarial. Tentamos buscar uma redução, mas foi necessário disponibilizar mais recursos devido à falta de recursos no ano passado”, explicou. Ele concluiu que a expectativa é alcançar um maior número de produtores, especialmente com a performance das instituições financeiras como o BNDES, que aplicaram mais recursos no ano passado.
Gustavo de Castro Freitas abordou a questão da taxa Selic, que, embora tenha sido reduzida em 325 pontos-base, não teve uma redução equivalente nos juros para o crédito rural. Ele explicou que os juros mais altos nunca são benéficos, mas essa é a realidade atual. “Idealmente, gostaríamos de taxas menores, tanto para a Selic quanto para custeio e investimentos. Tivemos muitos choques sucessivos e há uma preocupação com o aumento da inadimplência e endividamento dos produtores. Juros elevados podem prejudicar as próximas safras, mas mantenho uma perspectiva positiva. Apesar de os juros para custeio terem se mantido iguais para médios e grandes produtores, houve uma redução para os menores. Além disso, temos boas notícias no setor de investimentos, com aumentos importantes para os programas Moderna Agro e Nova Agro, e uma redução de juros para o Moderfrota, principal investimento dos produtores. Portanto, embora preferíssemos juros mais baixos, não acredito que este ano traga uma piora significativa no cenário. Nossa maior preocupação está no clima e seus impactos na vida dos produtores”, enfatizou.
Avaliação dos produtores
Antônio da Luz trouxe a perspectiva dos produtores do Rio Grande do Sul, especialmente após os impactos de uma tragédia climática recente. O economista-chefe da Farsul e CEO da Agromoney destacou que “o Rio Grande do Sul costuma ser o maior tomador de crédito do Plano Safra do país, devido ao grande número de produtores, mais de 300 mil, e ao tamanho médio pequeno das propriedades. Os produtores gaúchos, considerados grandes no estado, seriam pequenos em outras regiões do país. Estados como Paraná, Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais também são grandes demandadores do Plano Safra. O Rio Grande do Sul enfrenta um problema grave: duas estiagens consecutivas seguidas de uma enchente, tudo parte de eventos climáticos extremos que afetam a região. Esse cenário complexo resultou em condições creditícias complicadas para os produtores. É fundamental alongar as dívidas para permitir que os recursos do Plano Safra cheguem aos produtores em dificuldades. Já passaram dois meses desde que fizemos nossos pleitos, e as prorrogações vencem em 14 de agosto. Estamos preocupados com o risco de muitos produtores serem inscritos em cadastros negativos de crédito. O Conselho Monetário Nacional deveria ter emitido uma resolução para permitir a renegociação dessas dívidas, mas isso ainda não aconteceu. Se não abordarmos esses problemas, os agentes financeiros terão dificuldade em encontrar produtores no estado com liquidez suficiente para acessar o Plano Safra como de costume.”
Gilson ainda ressaltou que “toda instituição financeira pode oferecer aos produtores rurais um conjunto de produtos e serviços, sem exigir reciprocidade, o que seria irregular e ilegal. Em relação aos custos cartorários, há uma demanda no Congresso para reduzir ou homogeneizar esses custos, que muitas vezes são muito altos em alguns estados. Quanto ao seguro agrícola, houve uma revisão no Proagro para ampliar a cobertura, mas eventos climáticos recentes aumentaram os custos, elevando-os de R$ 2 a 3 bilhões por ano para quase R$ 10 bilhões na região Sul. O Estado brasileiro tem aportado significativamente mais para garantir o seguro, e é importante adotar novas tecnologias e medidas para reduzir os riscos.”
Ele concluiu destacando as ações tomadas após os eventos climáticos extremos no Rio Grande do Sul. “A primeira medida foi autorizar a prorrogação das dívidas até agosto para dar tranquilidade aos produtores enquanto avaliamos a extensão das perdas. A agricultura, diferente de outros setores, precisa de mais tempo para se recuperar de erosões ou inundações que afetam o patrimônio. Estamos trabalhando para encontrar uma solução mais efetiva, considerando as diferentes situações dos produtores. O foco é identificar quem teve perdas mais significativas e não adotar uma solução uniforme, que poderia ser insuficiente. Estamos buscando alternativas para o crédito de custeio e investimento, visando atender especificamente aqueles afetados pelas enchentes entre abril e maio.”
Gustavo afirmou que “o cooperativismo desempenha um papel relevante no processo de financiamento da atividade agropecuária, especialmente com o Plano Safra recém-anunciado. Nossa avaliação preliminar é que devemos atender bem aos nossos associados, como fizemos na safra passada, quando crescemos 11% em volume, totalizando R$ 56,9 bilhões em financiamentos. Para a próxima safra, nossa perspectiva é crescer novamente 11%, atingindo R$ 66 bilhões, representando uma fatia significativa do Plano Safra de R$ 475 bilhões. Vale destacar que 83% a 84% dos nossos associados que financiam conosco são de pequeno e médio porte, com programas como PRONAF e PRONAMP, enquanto 15% a 16% são de maior porte.”
Ele ainda acrescentou que “apesar das dificuldades de locomoção e da recente tragédia climática, estamos comprometidos em continuar a expansão das cooperativas e atender bem nossos cooperados. Incentivamos nossos associados a enviarem suas percepções e perguntas, pois estamos com dificuldade de visitar a ponta como normalmente faríamos. A manutenção das taxas de juros, mesmo que altas, é melhor do que um cenário de piora, e estamos otimistas com a execução do novo Plano Safra.”
Sustentabilidade e Recursos para o Seguro Rural
Outro ponto importante discutido foi a insuficiência de recursos para a subvenção do seguro rural no Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR). Diversas entidades e analistas têm se queixado da necessidade de maior segurança jurídica e preservação do direito de propriedade no Brasil, especialmente diante dos desafios climáticos.
Da Luz comentou que se o sistema de seguro funcionasse bem, não estaríamos discutindo renegociação de dívidas. “No Rio Grande do Sul, onde normalmente chove 100 a 110 milímetros em maio, registramos 600 milímetros, causando danos severos até mesmo em áreas distantes dos rios. Esses eventos climáticos extremos estão conectados e precisam ser tratados com urgência. A natureza não espera para plantar, e o recebimento dos insumos está diretamente relacionado à liberação de novo crédito. Recentemente, mais de 5 mil produtores se reuniram em Cachoeira do Sul para protestar pacificamente, exigindo soluções imediatas. A pressão está alta e precisamos de um endereçamento adequado para esses problemas.”
Ele acrescentou que “o seguro rural deve ser a principal política agrícola do Brasil, mas temos visto um retrocesso significativo. O Proagro é caro e ineficiente, e o último Plano Safra sequer mencionou o seguro rural. As seguradoras não estão confiantes, e os produtores não têm garantia de receber os prêmios. Além disso, houve uma discrepância entre os valores anunciados e os efetivamente liberados no último Plano Safra, penalizando principalmente a agricultura familiar. Recursos livres têm sido a base dos planos safra, mas os recursos controlados diminuíram 12%. É importante que os valores anunciados sejam realmente disponibilizados, evitando a maratona para acessar o dinheiro, como foi o caso do último ciclo, em que faltaram R$ 1,5 bilhão a R$ 2 bilhões para cumprir o prometido.”
Na reta final do programa, os convidados fizeram suas considerações sobre a capacidade de sobrevivência do crédito rural. Ivan Wedekin sintetizou os pontos principais discutidos e destacou a importância do debate para o futuro do agronegócio brasileiro, sublinhando cinco pontos principais. Ele enfatizou a complexidade da política agrícola moderna, que exige dinamismo e criatividade, ao contrário do passado, quando se limitava ao crédito rural e apoio a preços. Destacou a importância dos recursos controlados e o papel crucial da Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) na oferta de crédito. Wedekin apontou a necessidade de lançar o Plano de Safra em maio e a avaliação do custo-benefício das políticas agrícolas, especialmente no que diz respeito ao PRONAF. Ele também abordou a importância do seguro rural e a eficiência dos programas existentes. Por fim, ressaltou os custos da política agrícola, que somaram R$ 22 bilhões em 2023, e a necessidade de priorização na alocação de recursos públicos. Em sua síntese, agradeceu aos colegas pelo enriquecedor debate e destacou o papel da Secretaria de Política Agrícola na melhoria da agricultura brasileira.
A Voz do Mercado foi finalizada com agradecimentos aos participantes e ao público, reforçando a importância da continuidade dessas discussões para o desenvolvimento sustentável do agronegócio no Brasil. E assim, o Talk Show, mais uma vez, cumpriu seu papel de ser um espaço de debate e análise, contribuindo para a formação de opiniões e tomada de decisões no setor agrícola.
Para assistir na íntegra: clique aqui.
A Voz do Mercado tem apoio da Asbram (Associação Brasileira das Indústrias de Suplementos Minerais) e da Abisolo (Associação Brasileira das Indústrias de Tecnologia em Nutrição Vegetal)
Fonte: agrolink