Comerciantes e moradores exigem solução para Cracolândia além da isenção do IPTU


André Bueno | REDE CÂMARA SP

Audiência Pública da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente desta terça-feira (22/8)

ANDREA GODOY
DA REDAÇÃO

A Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente realizou nesta terça-feira (22/8) a primeira Audiência Pública para o PL (Projeto de Lei) 448/2023, de autoria da Prefeitura, que pretende isentar por dois anos o IPTU de imóveis em um perímetro delimitado da Cracolândia, no centro da capital. A iniciativa já foi aprovada em primeiro turno no Legislativo paulistano e ainda cabem modificações no texto antes da segunda e definitiva votação.

O debate contou com secretários municipais, comerciantes, moradores e integrantes de movimentos da sociedade civil em prol da revitalização da região central da cidade. A maioria dos participantes com comércio ou moradia na Cracolândia apoia a medida de isenção fiscal, porém não sem uma solução para o fluxo da drogadição, que tem causado insegurança e o fechamento de lojas.

O secretário chefe da Casa Civil, Fabricio Cobra, pontuou que o Executivo entende que o PL é um paliativo. “Esse Projeto de Lei não é a solução, ele é apenas um gesto de solidariedade a residentes e comerciantes que sofrem com este fluxo. A solução é o enfrentamento que a Prefeitura e o governo do Estado têm feito de um lado no tratamento de saúde e de assistência social dos usuários e do outro lado no combate ao tráfico de drogas”.

O PL 448/2023 foi apresentado pelo subsecretário da Receita Municipal, Thiago Rubio Salvioni. Ele mostrou um mapa da área delimitada para a isenção do IPTU, que pode ser verificado aqui e dentre outras vias inclui trechos das ruas Gusmões, Guaianazes, Vitória e Conselheiro Neves. “Foram selecionados alguns trechos pela Secretaria de Projetos Estratégicos, perímetros que foram prejudicados pela Cracolândia e a Secretaria da Fazenda teve a incumbência de listar os imóveis que fazem parte, inclusive os imóveis de esquina”, expôs.

Porém, o subsecretário Thiago Salvioni destacou que os imóveis pintados de vermelho no mapa são os que não cumprem suas funções sociais e, portanto, estão inseridos no IPTU Progressivo, não podendo ser beneficiados com a isenção. O IPTU Progressivo aumenta a alíquota do imposto paulatinamente para combater a ociosidade dos imóveis em regiões com infraestrutura básica, forçando os proprietários a dar utilidade ao imóvel.

O secretário-executivo de Entregas Prioritárias, Edson Ortega, acrescentou que o critério utilizado para definir o perímetro mais afetado pelos usuários de drogas foram as imagens feitas pela Secretaria Municipal de Segurança Urbana com o programa de monitoramento por drones Dronepol da Guarda Civil Metropolitana, no período de janeiro a julho de 2023. “Foram identificadas 100 ou mais pessoas durante 15 dias, consecutivos ou não, no mesmo local”, ressaltou.

Moradores e comerciantes sugerem modificações ao PL

Moradores e comerciantes que se inscreveram para participar da discussão relataram os reflexos sofridos com o fluxo da Cracolândia no centro e fizeram sugestões para modificar o Projeto de Lei. O empresário José Renato Bonventi, que tem um shopping de motocicleta há 25 anos, contou que chegou a ter 60 lojas na Alameda Barão de Limeira, porém que esse número caiu para 30 lojas por causa da Cracolândia. “Eu acompanho a degradação do centro ano a ano, é um contrassenso pois o centro é um bairro que tem tudo”.

O presidente do Conselho Comunitário de Segurança do Bom Retiro, Saul Ananias, sugeriu que a ideia deve ser expandida para toda a Subprefeitura Sé. “Não digo que deve haver isenção para todos, mas sim um desconto, pois tem o problema da droga, mas também da violência e da sujeira”, reclamou.

O vice-presidente da Associação Pró-Centro, Fábio Redondo, explicou que o setor hoteleiro sofre muito prejuízo com a desistência de reservas. “A gente entende que é necessário haver algum benefício para o entorno também com a São João, Triunfo, Duque de Caxias e Ipiranga. Houve saque em farmácia, no mercado da São João, foi colocado fogo na Gusmões, então acredito que deve haver uma mitigação dos prejuízos”.

Moradora da Rua dos Gusmões, Rose Corrêa relatou que se sente acuada dentro da própria casa, sem o direito de ir e vir, e reclamou que a quadra dela não foi contemplada no PL. “Nós não dormimos e somos ameaçados quando chegamos em casa. Um dos meus vizinhos tomou um tapa na cara, outra furaram de seringa, já roubaram óculos do rosto dos moradores, Uber é atacado, perua escolar também”, descreveu.

O comerciante Rosano Iaconelli, dono de estacionamento na Rua dos Gusmões, contou que no mês passado recebeu cobrança de 10 parcelas de R$ 329 mil do IPTU Progressivo, sendo que o estabelecimento dele gera 20 empregos diretos. “Geramos emprego, livramos a rua de ficar obstruída com carros, damos acesso seguro até o comércio da Santa Ifigênia. Ouvir dizer que a gente não cumpre a obrigação social é uma ofensa”, disse, emocionado, explicando que o valor excede em muito o faturamento da empresa e inviabiliza a atividade.

Luiz Castro, representante do Movimento Cura São Paulo, disse que é importante definir bem o conceito de Cracolândia no texto da proposta porque também há focos de drogadição no Brooklin.

Vereadores discordam sobre soluções para a drogadição

A vereadora Sílvia da Bancada Feminista (PSOL) criticou o que ela definiu como “desmantelamento” do programa De Braços Abertos, política municipal implementada em 2014 para o álcool e outras drogas, coordenado pela Secretaria Municipal da Saúde. “Isso aconteceu exatamente em 2017 quando entrou o João Doria na Prefeitura, dizendo que iria acabar com a Cracolândia. Porém o fluxo só cresce, de janeiro a julho deste ano, houve aumento de 27% e está em 1.200 pessoas”, detalhou.

A vereadora também afirmou que as pessoas preferem pagar o IPTU e ter uma solução. “O que está sendo proposto aqui é uma medida paliativa, não estou contra a isenção de impostos, mas em ter isenção por dois anos sem atacar a raiz do problema”.

O presidente do colegiado, vereador Rubinho Nunes (UNIÃO), discorda do modelo do programa De Braços Abertos. “Essa política é a grande responsável pelo crescimento da Cracolândia, porque quando a gente para pra analisar é justamente quando você dá dinheiro para o usuário que você acalma o fluxo, porque está alimentando o traficante com o dinheiro público. Já passou da hora de ter internação compulsória para o usuário”, declarou.

Rubinho também afirmou que a drogadição no centro é um problema muito complexo. “Isso se arrasta há anos e não vai ser solucionado da noite pro dia, concordo que tirar o imposto não vai resolver o problema, só que atrai a responsabilidade para o Executivo, porque a partir do momento que ele se desonera da obrigação de tributar ele precisa solucionar o problema para voltar a tributar”.

O vereador Sansão Pereira (REPUBLICANOS) afirmou que já são 30 anos que diferentes gestões tentam resolver o problema da drogadição no centro. Ele deu apoio às medidas realizadas atualmente pelo Executivo em parceria com o Governo do Estado. “Tenho a informação que o programa Redenção tem mil vagas destinadas a dependentes químicos da Cracolândia e não somente isso, mas também a contratação de profissionais especializados em dependência química, ampliação de oferta de vagas em comunidades terapêuticas, projetos de habitação e assistência social, policiamento da região”, enumerou.

Líder do governo na Câmara Municipal, o vereador Fabio Riva (PSDB) falou em “determinação para acabar com a Cracolândia”.“Vamos cuidar de quem precisa e com a polícia prender os traficantes para requalificar o bairro, mas tem que ter determinação”, ponderou. Já o vereador Rodrigo Goulart (PSD) destacou a participação da sociedade para aprimorar o texto de forma democrática. Também participaram do debate os vereadores Xexéu Tripoli (PSDB) e Arselino Tatto (PT). Para acompanhar a Audiência Pública completa assista o vídeo abaixo:

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