Em mais uma disputa que opôs a tradicional e conceituada HBO e a moderninha e faminta Netflix, na entrega de troféus do 74° Emmy desta segunda-feira, a primeira levou a melhor, reconquistando seu histórico título de suprassumo da televisão americana.
Com “Succession” e “The White Lotus” abocanhando dois dos três principais prêmios -os de melhor série de drama e minissérie–, a emissora deixou para trás o gigante do streaming, um ano depois de ele conquistar, pela primeira vez, as estatuetas dessas mesmas duas categorias.
A mais incerta disputa da noite estava entre “Succession” e a novata “Round 6”. A primeira levou a melhor na categoria de drama, mas recebeu uma quantidade menor de troféus –foram três contra seis, o que pode indicar o início de seu esgotamento.
“Succession” triunfou nesta segunda também em ator coadjuvante, para Matthew Macfadyen, e roteiro. Já “Round 6” foi a preferida em ator principal -uma vitória histórica para Lee Jung-jae- e direção.
Boa parte dos troféus, vale lembrar, foi entregue antes da cerimônia principal, no Creative Arts Emmy, festa com ênfase nas categorias técnicas. “Round 6” saiu dela com mais quatro prêmios, por direção de arte, performance de dublês, efeitos especiais e atriz convidada, para Lee You-mi.
Ao escolher o drama familiar sobre ricaços em vez do sucesso da Netflix na seção principal, no entanto, o Emmy decidiu não embarcar na onda de cultura sul-coreana que tem tomado o Ocidente, dois anos depois de o Oscar fortalecer tudo isso com o prêmio de melhor filme que deu a “Parasita”. Ao menos não cegamente.
Não que a Academia de Artes e Ciências Televisivas dos Estados Unidos tenha se negado a abraçar o frenesi em torno da produção audiovisual do país. Mas ao optar pela terceira temporada de um drama previamente premiado e, antes mesmo da cerimônia, barrar “Pachinko” das indicações principais, mostrou que a torre de Babel criada pelo streaming com suas superproduções em língua não inglesa ainda encontra resistência.
É também uma mensagem que a academia manda às plataformas que se desesperam para aprimorar algoritmos e lançar uma infinidade de produções semanalmente. O prêmio de “Succession”, afinal, mostra que a indústria não busca diversidade pela diversidade e que apuro técnico e refinamento ainda são imprescindíveis para definir quem se destaca no mar de títulos que desnorteia o espectador.
Neste mar tem desaguado, principalmente, um tsunami de minisséries. A grande vencedora da noite, aliás, foi “The White Lotus”, que ficou à frente de dramas e comédias como o mais premiado título desta edição, com dez troféus.
O caminho para a consagração estava óbvio havia semanas, com a produção da HBO levando também ator coadjuvante -Murray Bartlett-, atriz coadjuvante -Jennifer Coolidge-, direção, roteiro e, claro, melhor minissérie, além de categorias técnicas previamente anunciadas.
Apesar de apenas confirmar expectativas, a seção foi das mais acirradas na hora de selecionar os indicados, o que insinua um aumento na relevância dessa seção do Emmy, normalmente preterida em relação a drama e comédia.
Isso porque o formato tem se consolidado entre nomes poderosos de Hollywood e atraído cada vez mais público, por ficar numa espécie de meio-termo entre cinema e TV. Uma minissérie, afinal, não é um compromisso de prazo tão longo, mas permite que os fãs passem mais tempo com os personagens.
Várias grandes minisséries do ano ficaram de fora deste Emmy e, mesmo entre as que entraram para os indicados, sobrou pouco espaço diante da rapa de “White Lotus”. “Dopesick” e “The Dropout” conseguiram troféus em ator -Michael Keaton- e atriz -Amanda Seyfried–, mas só.
Em comédia, “Ted Lasso” levou pelo segundo ano o prêmio principal. A produção da Apple também recebeu as estatuetas de ator –Jason Sudeikis–, ator coadjuvante -Brett Goldstein- e direção.
Entre as poucas surpresas da noite, “Abbott Elementary” venceu em roteiro e atriz coadjuvante de comédia, o que gerou uma reação de incredulidade em Sheryl Lee Ralph e, pouco depois, um agradecimento musical e emocionado.
Quanto à cerimônia, ela optou em seu início pela solução óbvia e excessivamente feliz dos números musicais, já usada à exaustão no Oscar e no Tony. O apresentador, Kenan Thompson, abriu a noite com dançarinos ao som de temas famosos, como os de “Friends”, “Stranger Things” e “Game of Thrones”. O resultado foi confuso e, como normalmente acontece nesses casos, levemente embaraçoso.
Também houve mais autorreferência que o normal. Foram montagens homenageando os gêneros televisivos, aparições de personagens de “Os Simpsons” e “Star Wars” no Microsoft Theater e aplausos para elencos de clássicos.
Importante é dizer que, no quadro geral, a HBO também reconquistou o trono, depois de a Netflix, no ano passado, a ter superado, com 44 prêmios contra 19. Nesta edição, a primeira embolsou 37, e o gigante do streaming, 26.
O resultado pode dar fôlego a um estúdio que passou as últimas semanas mergulhado em instabilidade, o que gerou piadas na cerimônia. Com a recente fusão da defunta WarnerMedia com a Discovery, surgiram promessas de cortes na HBO Max, apagamento de títulos da plataforma e insegurança generalizada quanto aos rumos da produção serializada da HBO.
Agora, os troféus talvez pesem na escolha dos executivos para seus rumos. Mas para saber será preciso sintonizar nos próximos episódios.