Polícia investiga caso de racismo após mulher se referir a juíza aposentada como ‘preta desgraçada’


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Via @folhadespaulo | O 11º Distrito Policial de São Paulo abriu um inquérito para investigar a ocorrência de um suposto crime de racismo contra a advogada e juíza federal do trabalho aposentada Mylene Ramos Seidl, 58. A informação foi confirmada à coluna pela Secretaria da Segurança Pública de São Paulo.

A magistrada diz que Jamara de Oliveira Moretti, proprietária da empresa Capital do Mosaico, localizada em Santo Amaro (zona sul de São Paulo), a chamou de “preta desgraçada”. O episódio ocorreu em 19 de dezembro passado, após uma funcionária de Mylene cobrar Jamara por um serviço contratado que ainda não teria sido entregue.

“Eu vou entregar essa bosta, eu nem quero receber essa merda. Quero é ficar livre dessa preta desgraçada”, disse Jamara para a funcionária. A ligação estava no viva-voz e foi ouvida e gravada por Mylene, além de outras pessoas que estavam no local. O caso foi revelado na quarta-feira (3) pelo site Jornalistas Livres.

“Perdi até a voz [ao escutar a ofensa], porque eu não esperava. Senti uma tristeza muito grande, uma incredulidade”, afirma a juíza aposentada à coluna.

Procurada, Jamara diz que o ocorrido foi “um erro” e se deu em um momento de “destempero”. Ela afirma também que nada justifica o que foi dito e que se tiver que “pagar pela situação na Justiça, irá pagar”.

“Não estou nem um pouco orgulhosa. Não estou confessando uma coisa porque eu não me dirigi a ela diretamente […]. Não teria coragem, jamais, de falar isso para ninguém, mas num momento de raiva, de desespero, de problemas no trabalho, eu acabei fazendo um comentário infeliz.”

Mylene afirma que todo o problema começou após a empresária supostamente atrasar a entrega de um mosaico para piscina que a juíza aposentada tinha contratado.

Por conta dessa situação, Mylene registrou um boletim de ocorrência no dia 16 de dezembro com o objetivo, segundo ela, de deixar documentado que já tinha pago R$ 12 mil pelo serviço que não foi feito. O valor total do contrato firmado com Jamara, diz a magistrada, foi de pouco mais de R$ 17 mil e seria quitado após a entrega total.

Três dias depois, em 19 de dezembro, ela conta que uma equipe de profissionais estava na sua casa para instalar o painel, mas o mosaico ainda não tinha sido entregue pela empresa de Jamara. Uma das profissionais que faria a instalação decidiu, então, ligar para a comerciante para cobrá-la novamente. Foi quando teria ocorrido a ofensa racista.

Na mesma data, Mylene foi novamente ao 11º Distrito Policial para fazer um complemento ao primeiro boletim de ocorrência e relatar o crime de racismo. Ela também diz que entregou o áudio da conversa à polícia.

“Eu resolvi gravar porque, como toda a equipe estava ouvindo e era uma questão de entrega de material, falei: ‘Vamos gravar para deixar tudo registrado’.” afirma.

A juíza aposentada, que mora na Alemanha e mantém uma casa no Brasil, conta que teve que voltar ao país europeu para as festas de fim de ano, mas avalia entrar com ações judiciais na Justiça brasileira por danos morais e pelos prejuízos da obra que não teria sido concluída.

A advogada e juíza aposentada diz que já sofreu outras situações de racismo, mas jamais algo “tão violento”.

“A gente vivencia uma rotina de racismo e não é só no Brasil, mas também no exterior. Isso não pode continuar. Não é ‘mimimi’, é a realidade, é a vida diária de muitas pessoas, de mais de 56% da população do Brasil”, acrescenta.

À coluna, Jamara diz se arrepender pelo ocorrido. “Minha mãe é negra, meu pai é branco, eu saí branca por acaso. Não fui criada num ambiente racista, não tenho antecedentes [criminais] de racismo. Nunca na minha casa falei para uma filha: ‘Olha, não vem um amiguinho aqui porque é negro ou não namora um negro’. Jamais eu disse isso.”

Ela afirma também que não sabia que a ligação estava sendo gravada e que se sentiu acuada na discussão. “Fiquei muito, muito chateada porque tenho 28 anos de profissão e estava sendo tratada como se fosse uma bandida na obra, uma profissional lixo. E aí fiquei realmente muito nervosa e discuti.”

Após o caso vir à tona nas redes sociais, ela afirma que tem recebido muitos ataques e que teve de desativar sua conta no Instagram. “Ontem [na quarta, 3], fiquei com medo de sair na rua com o meu filho. ‘Gente, será que vão me bater?’ [pensou].”

Mônica Bergamo
Karina Matias
Fonte: @folhadespaulo

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