MPF quer revogar norma que proíbe indígenas de falarem língua materna


mpf quer revogar norma que proibe indigenas falarem lingua materna

Via @nsctotal | O Ministério Público Federal, através da Procuradora da República em Blumenau, deu prazo de quatro dias para que o prefeito de José Boiteux, Adair Antonio Stollmeier, revogue ou altere o decreto em que determina que somente a língua portuguesa seja falada nas repartições públicas municipais. Conforme a procuradora Lucyana Marina Pepe Affonso, o objetivo é evitar embaraços para que servidores indígenas dialoguem entre si em sua língua materna, sempre que assim desejarem ou entenderem necessário, mesmo que se trate de reuniões institucionais.

A promulgação do Decreto n. 106, data de 1º de agosto de 2023. O caso foi levado ao MPF por uma representação da Equipe Florianópolis do Conselho Indigenista Missionário Regional Sul (CIMI Sul). Lideranças indígenas também denunciaram o caso na Assembleia Legislativa de Santa Catarina e para a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, a APIB, durante audiência pública que discutiu o Marco Temporal, dia 16.

De acordo com a comunidade indígena, a situação atinge setores importantes, como o trabalho das duas conselheiras tutelares Xokleng quando fazem atendimento de famílias indígenas. As lideranças entendem como um caso de racismo.

Na recomendação, a procuradora lembra que o município de José Boiteux tem considerável parte da sua população formada por indígenas das etnias Xokleng, Kaingang e Guarani, os quais se encontram em situação de vulnerabilidade caso seus idiomas não possuam valor legal.

O MPF diz que as línguas indígenas devem ser reconhecidas tanto em favor de servidores públicos municipais indígenas, crianças indígenas em processo de alfabetização, cidadãos indígenas que buscam informações, apresentem demandas ou se defendam perante o Poder Público. “Considerando que, muito embora o art. 13 da mesma Constituição Federal preceitue que a língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil, essa disposição há de ser lida em conjunto com o citado art. 231, de modo a se conferir igual valor a outras maneiras de comunicação e expressão, tais como as línguas faladas pelas comunidades indígenas”.

“A língua falada não é só comunicação e expressão”

Em outro ponto, a procuradora recorre ao que diz a Convenção n. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro com condição de norma supralegal, dispondo, em seu art. 28, § 3o, que “Deverão ser adotadas disposições para se preservar as línguas indígenas dos povos interessados e promover o desenvolvimento e prática das mesmas. Considerando, portanto, que a língua falada por determinado povo não só funciona como meio de comunicação e expressão, mas também de reconhecimento e reafirmação da sua identidade”.

Conforme o documento enviado ao Executivo Municipal, foi fixado prazo de quatro dias – encerrando-se dia 25 – para que o prefeito informe acerca do acatamento da recomendação e das eventuais medidas adotadas. Se não houver acatamento ou o MPF entender que as providências adotadas são insuficientes, outras ações poderão ser determinadas.

A Associação dos Conselheiros Tutelares e o Conselho Estadual da Criança e do Adolescente (Cedca) se posicionaram contrários ao decreto por entenderem prejuízos ao trabalho das profissionais e desrespeito aos direitos das crianças indígenas. Os caciques dos três povos originários presentes em Santa Catarina – Kaingang, Guarani e Xokleng – vão se reunir amanhã e o assunto está em pauta.

A reportagem da NSC entrou em contato com a prefeitura de José Boiteux. Até o fechamento da matéria a Assessoria Jurídica não havia retornado.

Ângela Bastos
angela.bastos@somosnsc.com.br
Fonte: @nsctotal

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