Facções buscam lucro, não derrubar governos; classificá-las como terroristas ‘não faz sentido’


Pelo menos quatro ações estão em evidência entre Executivo e Legislativo: CPI do Crime Organizado; Projeto de Lei (PL) Antifacção, o PL que equipara facções a organizações terroristas; e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública.
Nesta quarta-feira (4), o Senado elegeu Fabiano Contarato (PT-ES) para presidir a CPI. Alessandro Vieira (MDB-SE) será o relator. A proposta, de modo geral, pretende investigar o crime organizado.
Segundo Ignacio Cano, professor do Departamento de Sociologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coordenador do Laboratório de Análise da Violência (LAV), a proposta é ampla, pretendendo discutir diversos temas, desde lavagem de dinheiro e crimes digitais a controle de territórios. “A CPI, a princípio, vai falar de tudo, o que quer dizer que não vai falar de nada”, resume.
Para o analista, a medida tende a surtir maior efeito no campo político-eleitoral do que nas políticas de segurança pública propriamente ditas.
“Essa CPI vai ser apenas um palco para que alguns atores políticos apresentem suas visões. E dificilmente surgirá daí uma proposta legislativa concreta”, avalia.
Além disso, no âmbito do Legislativo tramitam o PL 1283/2025, do deputado Danilo Forte (União-CE), que propõe estender a aplicação da Lei Antiterrorismo a organizações criminosas e milícias privadas; e o PL 724/2025, do deputado Coronel Meira (PL-PE), que quer ampliar a lei incluindo a definição de narcoterrorismo como passível de punição.
A proposta de definir facções criminosas como terroristas divide governo e oposição. Quem quer levar o projeto à frente são parlamentares oposicionistas, endossados por governadores da direita.
Segundo o jornal O Globo, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), estaria há pelo menos seis meses fazendo campanha para a administração Donald Trump para que os Estados Unidos classificassem o Comando Vermelho como uma organização narcoterrorista e impusessem às facções criminosas as sanções devidas.
Cano define essa ofensiva do governo fluminense como um “elemento estapafúrdio”.

“O governo do estado do Rio tem que governar o estado do Rio. Não é um governo federal, não tem nenhum mandato para negociar com autoridades estrangeiras, e esse contato é completamente descabido.”

Conforme explica o pesquisador, não existe uma definição universal de terrorismo, mas, em geral, considera-se terrorista aquele que procura objetivos políticos através de violência indiscriminada. Como a criminalidade no Brasil visa ao lucro, e não derrubar governos, a classificação de facções como terroristas não faz sentido.
O especialista chama a atenção também para a execução da Lei Antiterrorismo, que vem sendo distorcida e aplicada fora das previsões.
De acordo com Cano, as leis antiterroristas que existem no mundo costumam contemplar o alongamento dos prazos de prisão provisória ou a diminuição de algumas garantias processuais.
“Nenhuma lei antiterrorista no mundo permite a execução sumária, nem a morte de uma pessoa só porque foi acusada de terrorismo.”
No entanto, é exatamente isso que os Estados Unidos estão fazendo ao explodir lanchas no Caribe, diz o especialista. “E é isso que o governo do Rio está fazendo ao organizar uma operação policial que deixa 121 mortos.
Já em relação à intervenção dos Estados Unidos no Brasil através de uma lei antiterrorismo que permitisse esse tipo de ação, o analista avalia uma possibilidade remota, já que as relações dos norte-americanos com o Brasil são diferentes das relações com a Colômbia e a Venezuela.
Em Caracas, por exemplo, Washington busca “abertamente uma mudança de regime”. O argumento de que as drogas do país escoam para o solo norte-americano também encontra certa fundamentação, ao contrário do que ocorre no Brasil.

“O comércio de drogas do Brasil vai para a Europa. Em geral, o comércio para os EUA passa por outros países mais próximos, como a Colômbia e, sobretudo, o México. Então não tem nenhuma justificativa para os Estados Unidos tentarem qualquer ação no Brasil.”

Embora a possibilidade seja distante, o especialista destaca que, dada a pressão sobre a pauta, é preciso acompanhar os desdobramentos com atenção.

Governo federal contra-ataca

Diante da ebulição em torno do tema segurança pública, o governo federal enviou ao Congresso o PL Antifacção, que aumenta as penas dos criminosos faccionados e visa atingir a operação financeira desses grupos, na contramão de projetos que querem internacionalizar o combate.
Também voltou à ordem do dia a PEC da Segurança Pública. O governo inclusive voltou a falar sobre o tema e chegou a impulsionar publicações sobre o assunto nas redes sociais para trazer visibilidade à discussão.
Apresentada em abril pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, a PEC tem como objetivo aprimorar a integração entre forças de segurança em todo o país e constitucionalizar o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP).
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Fonte: sputniknewsbrasil

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