Foreign Policy: China está silenciosamente tentando derrubar o dólar


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Um roteiro para o uso de moedas locais no comércio e o desenvolvimento de sistemas alternativos de pagamento faz parte do plano econômico da OCX há anos.
Esta agenda está em consonância com as políticas dos membros mais proeminentes do grupo, incluindo a tentativa da Rússia de amortecer o golpe das sanções ocidentais, a deterioração das relações da China com os Estados Unidos, a iniciativa da Índia de não usar o dólar em seu comércio com a Rússia e a recente proposta do Irã de criação de uma única moeda para os países-membros da OCX.
De acordo com a revista Foreign Policy, o presidente chinês Xi Jinping propôs resolver os déficits de desenvolvimento por meio da integração regional, especialmente ampliando as transações em moeda local, fortalecendo o desenvolvimento de sistemas de pagamento e liquidação transfronteiriços em moeda local e promovendo a criação de um Banco de Desenvolvimento da OCX. Xi não discutiu abertamente o risco geopolítico da dependência do dólar americano na recente cúpula da OCX. No entanto, sua proposta refletia as profundas preocupações dos líderes chineses sobre a vulnerabilidade da economia chinesa à hegemonia do dólar e seu desejo de desenvolver sistemas alternativos para se protegerem da dominância do dólar.
Pequim não está, por enquanto, tentando fazer do yuan uma moeda internacionalizada. Os chineses não pretendem destronar completamente o dólar americano e substituir a dominância da moeda americana no sistema global pelo yuan. Em vez disso, estão tomando medidas para tornar o yuan uma moeda regionalmente poderosa através de instituições locais na China e organizações intergovernamentais regionais, como a OCX. Pequim quer aumentar o uso do yuan nos acordos comerciais e investimentos transfronteiriços da China, reduzir sua dependência do dólar, minimizar os riscos cambiais da OCX e a escassez de liquidez do dólar e manter o acesso aos mercados globais durante crises geopolíticas.
As iniciativas de desdolarização da China não são apenas implementadas pelo governo central em Pequim. Algumas das iniciativas também foram realizadas por governos regionais e instituições financeiras locais. Um exemplo é a Aliança Financeira Sino-Russa. Em outubro de 2015, o Harbin Bank da China (um banco comercial da cidade de Harbin) e o Sberbank da Rússia (o maior banco russo de poupança) fundaram a Aliança Financeira Sino-Russa como uma organização de cooperação financeira transfronteiriça sem fins lucrativos. O objetivo principal da aliança é estabelecer um mecanismo eficiente para apoiar o comércio sino-russo, facilitar a cooperação financeira bilateral abrangente e promover o uso de moedas locais nas transações bilaterais.
© Fotolia / ZwiebackesserDolar nadando em água (foto referencial)

Dolar nadando em água (foto referencial) - Sputnik Brasil, 1920, 22.09.2022

Dolar nadando em água (foto referencial)
Pequenos bancos chineses que não têm muita exposição ao sistema financeiro global baseado no dólar são entidades ideais para pôr em prática mecanismos alternativos de pagamento e liquidação. Trabalhando com entidades russas, eles provavelmente vão adquirir prática na implementação de estratégias de desdolarização, de maneira a permitir contornar as sanções.
Após as sanções dos EUA contra instituições financeiras russas em resposta à operação russa na Ucrânia em fevereiro, o Banco Harbin e a província de Heilongjiang não parecem ter sido dissuadidos por medo de possíveis sanções secundárias. Segundo a análise da revista Foreign Policy, em maio deste ano, o Harbin Bank emitiu o que chamou de “Cem Medidas” como tentativa de apoiar a ambição dos líderes locais do partido de avançar na abertura financeira à Rússia.
Bancos chineses importantes, como o Banco da China e o Banco Industrial e Comercial da China, cessaram imediatamente o processamento de transações com entidades russas após o anúncio do governo dos EUA de sanções contra bancos russos. No entanto, os bancos de pequeno e médio porte da Aliança Financeira Sino-Russa ajudam as entidades russas a evitar sanções usando infraestruturas alternativas de pagamento e liquidação, como o Sistema de Pagamento Interbancário Transfronteiriço (CIPS) ou dinheiro.
Esse mecanismo vem sendo desenvolvido e expandido por vários pequenos bancos na província de Heilongjiang desde 2018. Uma filial local do Harbin Bank entregou com sucesso 15 milhões de yuans (cerca de US$ 2 milhões) em dinheiro no posto aduaneiro da Rússia de Poltavka em 2019.
A presença de Xi na cúpula da OCX, apesar da rigorosa política de “zero COVID” da China, sugere que Pequim está se preparando para se proteger contra um isolamento ocidental, fortalecendo o engajamento com os blocos regionais liderados pela China. Pequim conta com a OCX de forma a que ela seja “uma espécie de almofada geoeconômica para Pequim”. Nas últimas duas décadas, a OCX tornou-se silenciosamente um bloco geoeconômico regional não ocidental que se esforça para obter um nível mais alto de autossuficiência coletiva.
Inicialmente estabelecida em 2002 como uma organização de cooperação regional de segurança de seis membros (China, Rússia, Cazaquistão, Uzbequistão, Quirguistão e Tajiquistão), a OCX expandiu sua agenda para incluir as dimensões econômica, energética e tecnológica. A Carta da OCX de 2002 definiu os objetivos da organização, que incluíram cooperação em economia, comércio, finanças, energia, infraestrutura e outras áreas além da segurança.
Em setembro de 2003, os então seis membros da OCX, que agora se expandiu para nove (Índia e Paquistão se juntaram em 2017, e o Irã em 2022), emitiram “Um esboço para a cooperação econômica e comercial multilateral”.
Desde 2011, a China assinou acordos bilaterais de troca de moeda com vários membros plenos da OCX (Uzbequistão, Cazaquistão, Rússia, Tajiquistão e Paquistão) e parceiros de observação e diálogo da OCX (Mongólia, Turquia e Armênia). Esses acordos bilaterais de swap são denominados em yuan e a moeda de contrapartida, permitindo que a contrapartida do Banco Popular da China acesse a liquidez do yuan por curtos períodos a taxas de juros relativamente mais baixas em troca de sua própria moeda como garantia implícita.
O embaixador chinês na Rússia, Zhang Hanhui, divulgou recentemente que a proporção de acordos comerciais China-Rússia usando o yuan aumentou de 3,1% para 17,9% entre 2014 e 2021, um aumento de 477%. Em 2020, a proporção de transações bilaterais China-Rússia usando o yuan atingiu 44,92% do valor do acordo total, o que representou US$ 48 bilhões (R$ 248 bilhões).
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A China tem defendido a cooperação dos membros da OCX nas áreas de financiamento bancário e de desenvolvimento para facilitar a cooperação nos pagamentos e acordos na região.
A possibilidade de um Banco de Desenvolvimento da OCX sugere um caminho seguindo os passos do bloco BRICS, composto pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — construindo instituições formais para promover o uso de moedas locais no financiamento e desenvolvimento comercial para reduzir os riscos cambiais e o alto custo do financiamento em dólares dos EUA.
Um alinhamento mais próximo entre o BRICS e a OCX em relação à desdolarização já está ocorrendo. O então secretário-geral da OCX, Vladimir Norov, confirmou no ano passado que os membros da OCX têm trabalhado em uma transição gradual para o uso de moedas locais. Ele também sugeriu que a OCX estabeleça parcerias com o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura, o Novo Banco de Desenvolvimento, para desbloquear totalmente o potencial de investimento da OCX.
Os Estados Unidos têm negligenciado a existência e a expansão da OCX. As relações entre os Estados Unidos e os dois membros fundadores proeminentes da OCX — Rússia e China — pioraram, afirma análise da revista Foreign Policy. Diante do crescente isolamento do Ocidente, o verdadeiro significado da OCX para a China não tem a ver com a sua relação com a Rússia, mas sim com a criação de mecanismos para ampliar a segurança geoeconômica da China em caso de grave isolamento ocidental. Essa lógica se aplica a outros membros vulneráveis às sanções ocidentais ou que buscam reduzir a dependência do dólar, como o Irã e a Índia.
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