Entenda como deve ser o “imposto do pecado”, previsto na reforma tributária


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Via @cnnbrasil | Na madrugada do dia 7 de julho, a Câmara dos Deputados aprovou em dois turnos o texto da reforma tributária. O projeto prevê, principalmente, a simplificação da carga tributária no país, substituindo cinco dos principais tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

Além do IBS, uma outra nova tributação chamou a atenção dos brasileiros nas últimas semanas. O Imposto Seletivo Federal (IS), chamado popularmente de “Imposto do Pecado”, é um novo tributo que vai taxar produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

A seguir, entenda como vai funcionar o IS e quais produtos podem ser afetados pelo tributo.

Imposto do pecado

A ideia de um “imposto do pecado” é desestimular o consumo de determinados produtos.

No caso do imposto seletivo, a tributação incidirá sobre a produção, comercialização ou importação dos produtos danosos à saúde, ou ao meio ambiente.

O IS vai substituir parte das arrecadações do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Assim, permitindo ao mesmo tempo aliviar a carga do IBS federal, preservar a Zona Franca de Manaus e a cota-parte dos municípios no IPI, que deixará de existir.

A proposta do imposto é baseada no “Sin Tax” norte-americano. Nos Estados Unidos, os valores têm variação estadual. Entre os principais produtos taxados pelo “Sin Tax” estão o álcool, produtos derivados de tabaco, doces e combustível.

E o valor das cobranças tem grandes diferenças a depender do estado. De acordo com levantamento da organização USAFacts, o preço médio de uma caixa de cigarros no Missouri é de US$ 6,11 (R$ 29,33), das quais US$ 0,17 (R$ 0,81; 2,7% do preço total) são do “Sin Tax”. Já em Nova York, onde o preço do pacote é US$ 11,96 (R$ 57,41), o valor do imposto é de US$ 4,35 (R$ 20,88; 36,4% do preço total).

“Quanto maior for o objetivo do governo em desestimular o consumo de um determinado tipo de produto, maior será a alíquota que recairá sobre ele”, pontua Leonardo Villela, advogado tributarista sócio do Pinheiro Villela Advogados. 

Contudo, os críticos dessa medida lá nos Estados Unidos apontam para os efeitos controversos da cobrança. Villela reforça essa possibilidade uma vez que “quanto maior for a tributação a um produto, mais rentável tende a ser a comercialização de produtos contrabandeados dessa categoria”.

A professora da FGV Direito SP, Tathiane dos Santos Piscitelli, especialista em direito tributário, relembra que o enfrentamento ao contrabando de cigarro já é uma realidade no Brasil.

Insumos como tabaco e álcool já sofrem com taxações mais elevadas na atual conjuntura. Segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) feito em 2022, do total pago pelo consumidor de tabaco, 83,32% deriva de impostos – sejam eles estaduais ou federais.

A partir do atual texto da reforma, a CNN consultou Piscitelli para saber quais itens podem ter a alíquota elevada, quais não e os motivos.

Confira a seguir os “pecados” do Imposto Seletivo:

*Álcool

Hoje em dia, bebidas alcoólicas já possuem uma taxação gravosa, e a tendência é a repetição dessa cobrança. A média do peso dos impostos sobre vinhos nacionais e cervejas é de 43%, segundo dados do IBTP em 2022.

*Destilados

Nos Estados Unidos, os spirits tem uma taxação maior pelo “Sin Tax” do que bebidas fermentadas. Enquanto isso, no Brasil, o genuíno destilado brasileiro, a cachaça, está hoje em dia na segunda maior posição de peso de impostos, com uma alíquota de 81,87%.

*Cigarro

Hoje em dia, é o produto danoso à saúde com a maior carga de impostos incluída na composição de preço. 83,32% do valor do cigarro é convertido em receita para estados ou a federação.

*Alimentos ultraprocessados

Com o IS, a cobrança deve ser estendida para alimentos ultraprocessados, afirma Tathiana Piscitelli. Nos últimos dez anos, o consumo desse tipo de alimento no Brasil teve aumento médio de 5,5%. Estudos feitos na Itália e nos Estados Unidos em 2022 indicam que comidas como cachorros-quentes, salsichas, batatas fritas e outras estão ligadas a casos de câncer colorretal nos homens e doenças cardíacas e morte precoce em homens e mulheres.

*Doces

Por serem alimentos ultraprocessados, e ainda com alto teor de açúcar, o consumo de doces entra na lista de pecados. De acordo com estudo feito em 2020 nos Estados Unidos, a taxação de doces no estado do Colorado levou à queda de 11,2% do consumo entre 2009 e 2010.

*Refrigerantes

Ultraprocessados e “ultra-açucarados”, os refrigerantes estão na lista de alimentos que já tem uma alíquota maior e devem seguir sendo taxados. Segundo o IBPT, o peso dos impostos sobre esses produtos é de 45%.

*E o açúcar?

Os alimentos açucarados que estão na mira do IS não figuram entre os “frutos do pecado” só pelo alto teor de açúcar, mas principalmente por serem ultraprocessados. Apesar do açúcar em excesso ser prejudicial à saúde, o texto-base aprovado pela Câmara prevê alíquota zero para produtos que integrem a cesta básica nacional. “Dificilmente você vai ter um aumento. Ao contrário, teremos a garantia de que a carga tributária vai ser zero”, afirma Tathiana Piscitelli. A professora da FGV acrescenta que “o ponto dos ultraprocessados não é o teor de açúcar, mas sim o teor de aditivos químicos no alimento”.

*Armas e munições

Apesar de serem taxados pelo “Sin Tax” norte-americano, armamentos não devem entrar na lista de itens taxados pelo IS. Mesmo com a recomendação de juristas, deputados e especialistas, a professora explica que o formato atual do texto não abre margem para inclusão de armas e munições na taxação do “Imposto do Pecado”. Ela indica que “quando se fala em arma, argumenta-se que o uso é para defesa pessoal, integridade, não se relaciona com saúde em si”. Piscitelli também defende a alteração no texto para que seja instituído o IS sobre armas. 

*Mas e a energia elétrica?

Com a aprovação do texto-base da reforma pela Câmara dos Deputados, uma preocupação que surgiu no setor de energia foi o encarecimento das contas. Com a taxação de produtos prejudiciais ao meio ambiente, o temor era de que a produção de energia elétrica fosse cobrada. Isso em decorrência do impacto causado pelo alagamento das áreas próximas às usinas hidrelétricas. Contudo, o Supremo Tribunal Federal (STF) afirmou que energia e telecomunicações são serviços essenciais, logo não terão aumento na alíquota.

*Agrotóxicos

Apesar de um grande número de pedidos a favor da taxação, os agrotóxicos devem ficar de fora da lista de pecados. Tathiane explica que se forem classificados como insumos agrícolas, pesticidas e seus correlatos terão uma redução na alíquota e não poderão ser onerados pelo IS. A professora também defende a taxação dos agrotóxicos pelos impactos causados no meio ambiente e acredita que a tendência é que sejam taxados progressivamente com o passar do tempo.

*Combustível

Nos Estados Unidos, combustíveis fósseis, dos automobilísticos aos aeronáuticos, estão na mira do “Sin Tax”. Com os incentivos fiscais propostos para produção de biocombustíveis, Piscitelli avalia que a tendência no Brasil é de que o “Imposto do Pecado” recaia sobre combustíveis de origem fóssil.

*Até as apostas?

Sobre o “Sin Tax”, alguns estados norte-americanos dizem que sim. No Brasil, nada está definido, mas a se valer da interpretação de que as apostas podem causar vícios e por tanto prejudicar a saúde mental, “é algo a se pensar e discutir”, indaga Piscitelli.

Tramitação no Senado

O texto da PEC ainda não definiu a seleção de produtos que serão taxados no Brasil. A reforma tributária ainda precisa ser aprovada pelo Senado, o que significa que o texto pode sofrer alterações.

Apesar do temor da oposição de que sejam taxados produtos como agrotóxicos e armamentos, o Imposto do Pecado não é o principal foco dos críticos em relação ao texto.

Mas mesmo após ser aprovada a reforma, para que o IS comece a ser cobrado, é necessário que seja regulamentado por lei.

No relatório, afirma-se que “dessa forma, os diversos setores terão tempo de esclarecer suas particularidades e a legislação poderá ser alterada de acordo com a evolução do consumo da sociedade”.

A PEC que está em discussão agora, sob relatoria do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), é o quarto projeto apresentado desde 1988 e, ao que tudo indica, deve ser aprovado.

O texto é um substitutivo às PECs 45 e 110, e define a substituição dos tributos sobre o consumo por um imposto sobre o valor agregado, o IBS, pago pelo consumidor final.

Especialistas estimam que o novo tributo unificado deve ser de 25%, mas a alíquota não está definida e será regulamentada após estudos da Receita Federal.

Setores como educação, saúde, medicamentos, transporte público e produtos agropecuários terão uma alíquota de 50% da cifra padrão do IVA. Medicamentos e serviços de educação do Programa Universidade para Todos (Prouni) seguem com programas de isenção total.

*Sob supervisão de Ana Carolina Nunes
João Nakamura
Fonte: @cnnbrasil

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