Subcomissão da Tarifa Zero recebe precursor de projeto sobre a gratuidade nos ônibus


Gabriel Daniele | REDE CÂMARA SP

Reunião da Subcomissão da Tarifa Zero desta quarta-feira (3/5)

ANDREA GODOY
DA REDAÇÃO

A Subcomissão da Tarifa Zero, vinculada à Comissão de Finanças e Orçamento, recebeu na reunião desta quarta-feira (3/5) a representante do MPL (Movimento Passe Livre), Milena Souza e o engenheiro Lúcio Gregori, ex-secretário municipal de Transportes de São Paulo, considerado o precursor da tarifa zero por apresentar um projeto para implantar a gratuidade nos ônibus na capital.

Lúcio Gregori, que atuou na gestão Luiza Erundina (1989-1993), explicou porque considera ruim o atual modelo de transporte coletivo, que “incentiva o empresário a lotar os ônibus” e apresentou seu projeto para custear o sistema através da contribuição de carros particulares pelo uso do sistema viário, com valores progressivos conforme o tamanho do veículo e a potência do motor, exceto caminhões, que pagariam taxas menores.

“O primeiro contrato de concessão pública para transporte coletivo urbano no Brasil foi feito por Dom João VI em 1817 para o sargento-mor do palácio imperial, nos moldes vigentes até hoje, onde o passageiro é considerado um custo para o sistema. Para transportá-lo é calculado combustível, salário do motorista, entre outros insumos. Esse conceito leva a um equívoco, pois na verdade a tarifa é receita e não custo. Se você considerar a tarifa como custo, isso irá estimular o empresário a andar com ônibus superlotados, pois o custo dele é o mesmo, seja transportando 10 ou 100 passageiros. Portanto, quanto mais lotado, maior é a receita”, revelou Gregori.

O engenheiro também apontou que o modelo de transporte de São Paulo compromete a concorrência em função da divisão da cidade por lotes na concessão, onde cada empresa opera e estabelece sua garagem em uma área, sendo que há áreas mais rentáveis que outras.

“A garagem passa a ser um elemento estratégico, ou seja, uma mesma empresa passa a operar uma mesma área por anos a fio. Em São Paulo tem áreas onde a mesma empresa opera há mais de 60 anos. Na prática, você deixa de ter concorrência na oferta do serviço”, destacou.

Ele apontou algumas soluções para este problema como fazer garagens municipais, fretar ônibus na quantidade necessária para fazer o serviço e contratar um conjunto de empresas para operá-los, segundo as linhas. “Com isso você pode alugar, fretar a maior quantidade de ônibus possível evitando as lotações, a remuneração do fretamento não terá nada a ver com a quantidade de passageiros transportados”, declarou Gregori.

Já o projeto apresentado pelo engenheiro para custear a gratuidade da tarifa visa criar a ConUSV (Contribuição pelo Uso do Sistema Viário), onde carros particulares pagariam um valor progressivo conforme o porte do veículo e potência do motor. Assim quanto mais potente o motor e maior for o tamanho do carro, maior será a tarifa.

“Eu fiz um teste e apliquei esses valores na cidade de São Paulo com a frota de 2019 e o resultado foi uma receita de R$ 6,5 bilhões, valor aproximado ao que custou o sistema de transporte coletivo por ônibus no mesmo ano”, afirmou.

Porém, ele advertiu que para implantar essa ideia, há necessidade de uma lei federal autorizativa para que os municípios criem a ConUSV.  No momento, a proposta que incentiva a Tarifa Zero no Congresso Nacional é a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) nº 90/2011 da deputada federal Luiza Erundina (PSOL-SP), que introduz o transporte como direito social.

Ao ser questionado pelos vereadores sobre como São Paulo poderia começar a trilhar o caminho da gratuidade nos ônibus com as condições atuais, Gregori sugeriu adotar um dia do final de semana para liberar a catraca e recalcular adequadamente os custos do transporte. “Precisamos acabar com essa questão de considerar a tarifa um custo do sistema e não uma receita”, disse.

A representante do MPL, Milena Souza, também criticou o modelo de transporte público vigente, que, de acordo com ela, nasceu com uma ideologia racista. “É um modelo muito baseado no transporte de carga, que por sua vez está associado ao transporte do navio negreiro. Quando começa a ter transporte público no final do século19 para o século 20 ele é pensado seguindo a segregação, onde as pessoas negras e periféricas permaneceriam em seus bairros para que as pessoas brancas pudessem circular pelo centro da cidade. Como o transporte público no início do século 20 passou a ser das pessoas negras, entendemos o motivo de deixarem tão precarizado. É uma mobilidade com ideologia racista”, declarou.

Milena afirmou ainda que existe um ciclo vicioso no transporte público, em que cada vez menos pessoas conseguem pagar por causa da pobreza e a tarifa aumenta excluindo ainda mais os vulneráveis. “Então a gente acha que a tarifa zero deve existir para que as pessoas tenham uma qualidade de vida melhor, andem pela cidade que elas mesmas constroem e seus corpos não sejam mais segregados”, ponderou.

O presidente da Subcomissão da Tarifa Zero, vereador Paulo Frange (PTB), considerou que a implantação da gratuidade no transporte público é um caminho sem volta.“Já são 70 cidades no país que adotaram a tarifa zero. O prefeito Ricardo Nunes (MDB) está neste momento no Rio de Janeiro discutindo sobre financiamento do transporte público com a Confederação Nacional dos Prefeitos, quer dizer, não está parado esse tema no Brasil inteiro”.

O relator, vereador Dr. Sidney Cruz (SOLIDARIEDADE), também destacou que a tarifa zero é um tema que está avançando no país. “É irreversível este processo, só não sabemos quando, mas, com certeza, isso irá acontecer. É um tema que está sendo discutido a nível nacional e trata de inclusão social, acesso a serviços, equipamentos públicos, renda e empregabilidade”, pontuou.

Também participaram da reunião o presidente da Comissão de Finanças, vereador Jair Tatto (PT), o vice-presidente, vereador Isac Félix (PL), a vereadora Rute Costa (PSDB) e o vereador Rinaldi Digilio (UNIÃO).

O colegiado aprovou ainda dois requerimentos de autoria do vereador Paulo Frange (PTB), para convidar pessoas que colaborem com a Subcomissão da Tarifa Zero nas próximas reuniões. Os convidados são: a deputada federal Luiza Erundina (PSOL-SP) e o ex-senador e atual ministro do TCU (Tribunal de Contas da União), Antônio Anastasia e um representante do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional – setor do departamento de Projetos de Mobilidade e Serviços Urbanos.

Assista à reunião completa no vídeo abaixo:

 

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