Volkswagen revolucionou os anos 90 com Gol, Passat e Santana; relembre


O que você fez entre 1988 e 1991? Eu ainda não era nascido — viria ao mundo apenas no fim do século XX. Porém, desde sempre ouvi dizer que as décadas de 1980 e 1990 foram memoráveis, tanto pelas inúmeras bandas de rock que surgiam como pelas vitórias de pilotos brasileiros na F1 e pela revolução da informática.

Todas essas experiências eu pude vivenciar depois, e tive a certeza de que realmente foram anos dourados. As músicas se tornaram parte da playlist, pilotos entraram para a história e a evolução tecnológica permite que hoje eu escreva este texto da forma como estou fazendo (atrás de um computador, usando Wi-Fi e editando via aplicativo) para você ler.

Só que os anos 1980 e 1990 entregaram ainda mais que isso, principalmente na indústria automotiva nacional. Não sei o que você fez entre 1988 e 1991, mas a Volkswagen tentava de alguma forma revolucionar o mercado nacional de veículos. Primeiro com o Passat GTS Pointer, um esportivo raiz desenhado por Giorgetto Giugiaro; depois veio o Gol GTI, primeiro modelo nacional com injeção eletrônica; e, virando a década, chegou o Santana EX, com o qual a VW mostrou que sabia contruir carros mais luxuosos.

Quando chegou ao Brasil, há 70 anos, a Volkswagen com certeza não sabia que faria tanto sucesso, que teria uma trajetória tão grande e se tornaria uma das principais marcas no território nacional. Os três veículos citados acima são dos mais importantes nessa história, e conduzimos cada um deles (praticamente em estado de 0 km), nas instalações da fabricante em São Bernardo do Campo (SP), para contar nossas sensações e os detalhes dessas verdadeiras lendas do passado.

A carreira de Executivo do Santana durou pouco tempo. Era esse o significado do emblema “EX” que o sedã carregava na tampa do porta-malas e no para-lama dianteiro. A versão foi lançada no início de 1990 e, apenas um ano depois, deixou o mercado para dar espaço à segunda geração do sedã.

Embora poucas unidades tenham sido fabricadas, é um carro que marcou a história da Volkswagen. Concentrada em vender veículos mais básicos, de entrada, que não tinham muito requinte, a montadora trouxe no modelo tudo aquilo que tinha de melhor.

Basta olhar para o Santana EX para ver que se trata de um veículo bem superior aos que eram feitos na época — claro, era muito mais caro também.

As próprias rodas BBS, por exemplo, vinham importadas da Alemanha. Quando entrei e me sentei no banco do motorista, a sensação é de que estava em um carro premium — sem exageros.

Essa versão merece esse rótulo. O volante é todo emborrachado, o painel das portas tem revestimento claro para combinar com os bancos e ainda oferece porta-objetos, algo não tão comum como é hoje.

O que mais chamou a atenção é que o Santana possui comando dos vidros elétricos em todas as portas, e o motorista também pode controlá-los por acionamentos secundários na porta ou no console central. Tem ainda ajuste elétrico para os retrovisores externos (que realmente contrastam com os quebra-ventos dianteiros).

Ajeitar-se no banco é fácil. O Recaro tem apoios laterais largos e encaixa bem o tronco. Os ajustes, claro, são todos manuais, mas a alavanca é leve para acionar. Basta soltar, puxar para a frente e para trás o assento até que o “cleck” mostre que está encaixado.

Retrovisores no lugar, câmbio em “ponto morto” e dei a partida. Pegou de primeira, mesmo tendo mais de 30 anos e pouco mais de 100 km rodados. Primeira marcha engatada e ele sai tranquilamente.

Aqui vale dizer como o motor 2.0 aspirado de 125 cv de potência e 19,5 kgfm de torque era forte. Tanto que o Santana até parece leve. Claro que a injeção eletrônica dá um toque especial ao sedã, que abandonava o afogador e ficava mais moderno.

Segunda, terceira, quarta e quinta marchas entram de forma bem suave. O câmbio manual de cinco marchas é bem gostoso de manusear, engata com facilidade e sem arranhar. Outro ponto positivo é que o ruído interno é bem mais baixo do que o de outros carros da VW vendidos na época.

Olho para o velocímetro e ele ganha velocidade rapidamente. Hora de controlar o pé, pois estamos dentro da fábrica. As reduções são serenas também.

Do lado de fora, os trabalhadores da Volkswagen param para ver o sedã passar como se fosse um lançamento. Mas dá para entender: o Santana EX tinha quatro portas quando quase nenhum carro oferecia isso, além de vidros verdes, aerofólio traseiro (mesmo não sendo hatch) e a pompa de um carro metido a importado. Tudo isso em uma raríssima versão dos anos 1990 que poucos viram nas ruas — inclusive eu. Mas, por alguns minutos, eu pude voltar no tempo.

Nasci ouvindo que o Volkswagen Passat GTS Pointer era “animal”. É dessa forma que meu pai, Roberto Eduardo, se refere a um dos carros que sonhou ter durante sua adolescência. Um pensamento que deve fazer parte da vida de muitos brasileiros.

O Passat é um carro que envelheceu muito bem. Nasceu das mãos de Giorgetto Giugiaro, um dos designers mais renomados da história da indústria automotiva. As linhas da carroceria são bem fluidas, e há uma queda bem acentuada na coluna C (o que, hoje em dia, faria qualquer um chamar o carro de cupê).

Mas a importância da configuração GTS Pointer é muito grande na história do modelo. O hatch da VW não estava lá tão bem em vendas, e a linha esportiva veio para dar-lhe uma sobrevida no mercado.

O vermelho da carroceria faz o Passat se destacar e os detalhes pintados de preto dão o equilíbrio necessário para a proposta de esportivo. As rodas são conhecidas popularmente como snowflakes, por causa do desenho que (de fato) lembra um floco de neve.

O GTS Pointer do acervo da VW é de 1988, um dos últimos exemplares do modelo. A maçaneta da porta tem aquele “click” característico e está bem alinhada, afinal são pouco mais de 400 km rodados no hodômetro.

Encaixei-me no banco Recaro, este um pouco mais duro que o do Santana, e ele logo me abraçou. Aqui, vale ressaltar que o revestimento de tecido é bem bonito.

Comparado ao do Santana, o interior é mais simples. Embora o volante e o painel de instrumentos sejam iguais (este último só muda a cor do grafismo), toda a parte frontal, de plástico preto, é diferente. O console central é mais curto e é nele que se alojam o ar-condicionado e o rádio.

O Passat não é injetado — sua alimentação é carburada. Para pegar foi preciso puxar o afogador por um tempo (momento nostalgia). Depois que o motor a etanol esquentou, pudemos provar um pouco do 1.8 aspirado. Tem comando de válvulas do Golf GTi alemão e rende bons 99 cv de potência e 14,9 kgfm de torque declarados pela VW.

E anda muito bem, obrigado. Tem auxílio de um bom câmbio de cinco marchas manuais de engates precisos. No começo, ainda frio, engasgou um pouco, o que é normal em modelos a etanol daquela época, mas logo deslanchou.

O barulho do motor AP é muito característico e invade a cabine com facilidade, o que me fez ter saudade do meu Gol CL 1993 que estava encostado em casa há seis meses — agora está lavado e rodando.

Os pedais são macios, o câmbio é preciso, e ele ainda tem painel de instrumentos com relógio digital e conta-giros, retrovisores com ajustes manuais internos e até mesmo encostos de cabeça no banco traseiro. Dá para entender o motivo pelo qual ele era tão desejado.

Estar em um Volkswagen Gol GTI é saber que está dentro de um dos clássicos nacionais mais raros, caros e colecionáveis da história. Como é difícil ver um nas ruas atualmente, não é mesmo?

A década de 1980, para o Gol, foi insana — ele foi salvo pela resiliência da fabricante alemã. O hatch estreou no Brasil no início dos anos 1980, mas com motores ainda refrigerados a ar, o que foi um erro da montadora. Afinal, essa motorização já estava mais que datada e o modelo, por ser novo, devia trazer algo mais condizente com o projeto.

Entretanto, com o passar dos anos isso foi se ajustando — tanto que, em 1984, a Volkswagen já havia lançado versões do Gol com motores 1.6 e 1.8 refrigerados a água. Este último propulsor servia a linha GT, que deu o primeiro passo para a chegada da clássica GTS e, depois, da GTI.

Esta última deixou o Gol marcado na história da nossa indústria. O primeiro veículo fabricado no Brasil com injeção eletrônica foi o GTI. A unidade que conhecemos na garagem da VW é uma ano/modelo 1992, já com facelift e lanternas dianteiras retangulares. Rodou pouco mais de 20 mil km.

Primeira coisa que pensei ao ver o carro: como surgiu a ideia de colocar um motor 2.0 em um carro desse tamanho e que pesa cerca de uma tonelada? Talvez eu nunca tenha essa resposta, mas é fato que a proposta deu certo.

E deu certo não só pela procura que esse carro tem até hoje, mas pelo conjunto da obra. A GTI é a única versão do Gol com acabamentos laterais e para-choques com cores claras. Ainda tem spoiler traseiro na cor da carroceria, coluna B estrutural com assinatura “GTI”, rodas BBS, lanternas escurecidas e um interior de fazer inveja ao próprio Santana EX. Começando pelo carpete, que mais parece um tapete de sala de estar.

Os bancos Recaro têm encosto de cabeça vazado, o painel de instrumentos é do tipo satélite, volante e manopla de câmbio são revestidos de couro, os vidros são elétricos e os retrovisores externos também. Detalhe: o ar-condicionado estava gelando.

Foi só bater na chave e o carro pegou. Dirigir o Gol GTI foi, com certeza, experimentar uma revolução da nossa indústria. Fiquei impressionado com a desenvoltura do hatch. Como disse, é leve. E o motor 2.0 aspirado de 120 cv e 19,8 kgfm responde muito bem ao pedal direito, assim como ocorre com o Santana EX.

Câmbio com trocas precisas fazem a condução ficar ainda mais prazerosa, e o velocímetro vai subindo com facilidade. Realmente ele é rápido para os padrões da época e ainda faz curvas muito bem. Dá para entender por que nossos antecessores aqui na redação de Autoesporte escolheram esse veículo como Carro do Ano de 1989.

Gol GTI, Santana EX e Passat GTS Pointer foram experimentos bem-sucedidos que a VW fez na virada da década de 1990. Com isso, o nome da fabricante se fortaleceu no Brasil e estabeleceu novos fundamentos. Quem sabe não teremos mais paradigmas quebrados em um futuro próximo?

Fonte: direitonews

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