Não é preciso ter muita experiência ao volante para saber que não se deve abastecer em qualquer posto de combustível. Todavia, com a engenhosidade de golpistas e até do crime organizado, as fraudes agora vão além da gasolina adulterada — o que deixa o motorista ainda mais exposto e vulnerável.
Autoesporte conversou com Carlo Faccio, diretor executivo do Instituto Combustível Legal (ICL), para desvendar os principais golpes aplicados nos postos. Criado em 2016, o órgão atua no combate ao mercado irregular e também na fiscalização da qualidade dos combustíveis no Brasil. Confira abaixo:
O ICL tem um método de fiscalização chamado “cliente misterioso”. É um carro que vai anonimamente aos postos e faz aferições sobre a qualidade daquele combustível: somente em 2025, o Instituto fez mais de 2 mil visitas, gerando 700 denúncias de fraude. “Já constatamos até 80% de etanol misturado na gasolina, muito acima do novo limite de 30%”, alerta Faccio.
Gasolina adulterada pode causar danos, além de lesar o bolso de quem abasteceu. “Se for um carro flex, ele vai andar normalmente com este combustível adulterado, mas com eficiência consideravelmente prejudicada. Caso seja um veículo a gasolina, o carro pode ter problemas sérios no motor”.
Outra modalidade criminosa que voltou a ser registrada no Brasil é a adulteração com metanol. “Notamos a presença deste elemento nas regiões de Campinas e Sorocaba (SP). É um produto nocivo, corrosivo e tóxico para o próprio frentista. Se um mecânico tiver contato com metanol e coçar os olhos, pode ficar cego”, ressalta.
Indo além, o especialista revela que existem postos que trocam os combustíveis de bombas para cobrar mais caro. “Vendem gasolina aditivada como se fosse premium, e o combustível comum como se fosse aditivado”, denuncia Faccio.
Por isso, evite abastecer em postos sem bandeira ou com procedência desconhecida.
A forma mais comum para adulterar etanol é adicionar água à mistura. Segundo Faccio, a cilada tomou proporções tão avançadas que os postos conseguem injetar água diretamente no tanque do carro, sem que esteja necessariamente misturada com o combustível soterrado.
“Nestes casos, haverá grande perda de eficiência em um carro flex, além de inúmeros problemas que podem surgir em componentes do motor, como nos bicos injetores”, alerta. Neste caso, o mais recomendado também é abastecer somente em postos já conhecidos ou indicados por amigos e familiares, de preferência com a bandeira oficial de uma distribuidora.
Faccio diz que os motoristas também devem se atentar à chamada fraude volumétrica. Ela é aplicada direto na bomba, onde os números nos mostradores não condizem com a verdadeira quantidade de combustível que entrou no carro. “Pelo programa cliente misterioso, identificamos penalidades que chegam a 31%”, alerta o diretor executivo.
Este golpe é possível por conta das chamadas “bombas chipadas” ou “bombas burras” — inclusive, postos que suspeitam de fiscalização podem desativá-las para que os mostradores voltem a marcar o volume real do combustível. “É possível controlar o acionamento por controle remoto e até aplicativo”, revela Faccio.
O diretor executivo diz que a melhor forma de evitar este golpe é fazendo o pedido por litros, e não com base no dinheiro. “Em vez de pedir R$ 150 de gasolina, peça 20 litros. É assim que os agentes de fiscalização fazem. Saber o volume do tanque de combustível do seu carro também é um método para contestar o frentista [caso o número não bata]”, sugere.
O ICL observa que a maior cilada é induzida pelo próprio consumidor ao buscar preços mais baixos que os praticados em sua região. “Neste mercado não existe mágica. Se todos os postos cobram R$ 10, mas um estabelecimento precifica a R$ 7, há um risco enorme de fraude”, denuncia Carlo Faccio. Isso vale tanto para o combustível quanto para o óleo lubrificante.
“Quanto à gasolina ou etanol, o modal que identificamos nas fraudes é de R$ 0,40. Este costuma ser o diferencial de preço quando há algo de errado, por ser o método para ganhar destaque e gerar desejo”, afirma.
Um golpe que pode surgir aliado a este é do posto com bandeira “fake”. São estabelecimentos que imitam Petrobras, Shell, Ipiranga e outras redes conhecidas, emulando suas cores, características e até os uniformes dos funcionários.
O ICL calculou que o tempo médio de decisão para um motorista entrar ou não em um posto de gasolina é de 7 segundos. Assim, com fachadas que imitam outros estabelecimentos e até uniformes praticamente idênticos, estes postos enganam centenas de milhares de clientes por semana.
“Tivemos o famoso caso do posto 13R, cujo logotipo e cores imitavam o BR. É um entre vários exemplos que ferem o Código de Defesa do Consumidor”. O leitor que identificar um posto “sem bandeira” que finge pertencer a uma franquia famosa pode denunciar o mesmo no portal online do ICL.
Neste caso, vale ficar atento à bandeira do posto para detectar se é verdadeira ou uma imitação.
Outra atividade suspeita denunciada pelo ICL diz respeito ao método de pagamento. “Não abasteça em postos que só aceitam dinheiro ou transferência a partir das 20h de sexta-feira. Você estará entregando dinheiro para o bandido”, diz Faccio.
De acordo com o especialista, é quando a fiscalização fica mais branda, e o crime organizado “nada de braçada” para lavar dinheiro. Quase sempre o combustível é de baixa qualidade, causando problemas de eficiência e até mecânicos no veículo.
“O nível do óleo está baixo, chefe. Posso completar?”. Essa pergunta inocente e prestativa pode colocar o motorista em enrascadas graves. Isso porque a pirataria dos óleos lubrificantes, observada como algo recente pelo ICL, já domina a praça e exige atenção do motorista.
“Pode acontecer tanto com o uso de um produto fora da especificação do rótulo, vendido por um fornecedor não autorizado, quanto com óleo reutilizado — ou seja, que foi retirado do carro de outro cliente e colocado de volta à garrafa”, explica Faccio.
Segundo o especialista, este golpe é aplicado quando postos irregulares se aproveitam da falta de conhecimento do dono do carro. “Nem todos sabem a especificação correta do óleo lubrificante ou qual é o procedimento para a troca. Há quem só observe o preço mais em conta. O ideal é que o motorista saiba exatamente o que deve colocar no carro, conforme a orientação no manual, para evitar cair nesta cilada”, afirma o especialista, que recomenda impreterivelmente óleos que tenham o selo de aprovação da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
“Outro ponto importante é que, ao trocar o óleo no posto de sua confiança, o motorista exija a nota fiscal. É o indicativo de que aquela empresa realmente existe e que há um local que você possa recorrer [caso algo aconteça com o veículo]”, explica.
Nem todos os golpes são facilmente detectados. Um posto confiável pode se tornar um estabelecimento suspeito em poucos dias. Por isso, o Instituto Combustível Legal recomenda analisar a reputação do estabelecimento antes de frequentá-lo, pedindo indicações a amigos, familiares e vizinhos.
Os canais de denúncia da ANP também são fundamentais para que cada vez menos redes golpistas enganem motoristas todos os dias.
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Fonte: direitonews