Algumas décadas atrás era considerado impossível a autossuficiência brasileira de trigo
Por Arno Schneider – Engº Agrº, pecuarista e diretor da ACRIMAT
Trigo no Mato Grosso
O trigo é nativo da Mesopotâmia, região semiárida. Os invernos úmidos e chuvosos do Sul brasileiro, sempre foram um entrave para altas produtividades, apesar dos esforços da EMBRAPA para criar novos cultivares resistentes as doenças fúngicas e da indústria química para produzir fungicidas mais eficientes.
Mesmo assim, a produtividade sulista evoluiu. A média atual é de 3.000 kg/ha e representa 90% da produção nacional.
A partir de 1980 a EMBRAPA direcionou parte de suas pesquisas para produção de trigo no Cerrado, no período seco, com irrigação.
Através de cruzamentos, foram selecionados indivíduos mais tropicalizados, mais produtivos e com ótima qualidade panificadora. O clima seco propiciou lavouras quase livres de fungos.
Em plantios comerciais, já foram obtidas produtividades superiores a 9.000 kg/ha. Segundo a EMBRAPA o potencial desses novos cultivares ultrapassa aos 12.000 kg.
Um colega meu, agricultor em Unaí-MG, já planta trigo irrigado como terceira safra há 20 anos. As produtividades foram evoluindo partindo de 5 mil kg/ha para atuais 7 mil kg. É um fato que serve para comprovar o avanço gradual da pesquisa.
Essa tecnologia com irrigação, não beneficiará somente o trigo. Eliminará também os riscos de veranicos nas culturas de soja e milho. Juntando as três culturas, podemos produzir em um hectare mais de 20.000 kg de grãos, utilizando o mesmo maquinário e a mesma mão de obra. Nossos concorrentes do Hemisfério Norte devem ficar assustados.
Porém, estava faltando um detalhe importante para agilizar nossa autossuficiência: criar uma variedade de trigo adaptada a safrinha. Aproximadamente a metade da área plantada com soja não é plantada com milho safrinha devido a janela climática desfavorável.
Utilizando a transgenia, a EMBRAPA criou novos cultivares de trigo mais tropicalizados, resistentes a secas e tolerantes ao herbicida glifosato. A resistência ao calor e a seca foram obtidos pela transferência de genes do girassol para o genoma do trigo. A tolerância ao glifosato seguiu o mesmo caminho da soja.
Esses novos cultivares transgênicos possibilitarão a continuidade da safrinha após o término da janela climática do milho sem necessidade de irrigação e com perspectivas de produtividade de 5 mil kg/ha.
Nesse contexto é que o Mato Grosso entra como grande beneficiário dessa nova tecnologia, com centenas de milhares de hectares disponíveis. Não se trata de um modismo. São realidades sólidas que certamente motivarão nossos agricultores.
Um grande batalhador, desde a década de 1980, pela introdução do trigo no MT é o engenheiro agrônomo Hortêncio Paro, a quem rendemos uma merecida homenagem. Custos e dificuldades da irrigação e os índices de produtividade menores da época, impediram maiores adesões ao projeto.
A EMBRAPA acredita que haverá uma adesão rápida e numerosa em função dessa nova tecnologia, em todo o bioma Cerrado.
A produção de trigo no MT promoverá inexoravelmente a vinda de moinhos para industrializar a produção. Assim aconteceu com a soja, milho e algodão. A vinda de indústrias é consequência direta e imediata da produção.
Em 2022 o Brasil produziu 9,5 milhões de toneladas para um consumo de 12 milhões, algo próximo de 80% do consumo nacional.
Seguramente no máximo em 2 anos chegaremos a autossuficiência. Na sequência virá a exportação.
Essa foi uma grande vitória da pesquisa brasileira.
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Fonte: agronews