Em recente viagem à Malásia, a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, anunciou que o Brasil está construindo uma joint venture entre a empresa brasileira Tellescom e a malaia Inari para a produção de semicondutores.
O objetivo da parceria é fortalecer a retomada da indústria nacional de chips e pavimentar o caminho para uma participação mais ativa do Brasil nessa cadeia global, uma das mais estratégicas da atualidade. A iniciativa também está ligada à retomada do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec).
O Brasil é um país rico em terras raras e a construção de chips é uma questão de soberania, conforme aponta à Sputnik Brasil Claudio Miceli de Farias, professor do Núcleo de Computação Eletrônica (NCE) e do Programa de Engenharia de Sistemas e Computação (PESC), ambos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Farias explica que o país precisa construir seus próprios ativos tecnológicos, o que inclui a produção de chips e semicondutores, para não ficar refém de atores externos, que podem interromper a oferta a qualquer momento.
“O Brasil tem que ter uma independência na produção de chips porque isso significa produção dos próprios ativos tecnológicos e, ao mesmo tempo, um reforço da indústria de chips nacional — que não é só a computação, mas todo produto eletroeletrônico que o Brasil consome, que vai de carro e avião à indústria civil. Então, na verdade, essa soberania não é uma soberania do ponto de vista de computação.”
Ele destaca que o Brasil tem um imenso conjunto de possíveis parceiros para impulsionar a transferência de expertise na produção de semicondutores, que inclui EUA, China, Malásia, Índia, África do Sul e vizinhos sul-americanos, como Argentina e Chile. Porém ele aponta que essa parceria seria benéfica “desde que eles sejam parceiros e a gente não seja subserviente”.
“O que o Brasil não pode ser é subserviente. A gente pode ser parceiro, onde a parceria é bem-delimitada e bem-mapeada; o que a gente não pode é ser provedor de terra rara, em vez de ser dono da tecnologia. Então qualquer que seja o caminho que o Brasil siga, ele precisa ser dono da tecnologia independente na produção.”
Ele acrescenta que a Rússia seria um bom parceiro, por ser um país “com extensos recursos minerais e universidades excepcionais”.
“A gente pode estabelecer uma parceria que é frutífera para ambos os lados, sim. E ambos os países, neste momento, têm necessidade desse tipo de colaboração.”
O especialista enfatiza a necessidade de criar políticas direcionadas ao incentivo à indústria nacional: trazer centros de pesquisa; conceder incentivos e fornecer insumos a indústrias nacionais para a produção de material interno; e nacionalizar a produção de itens que hoje são montados no exterior.
Ele afirma que essa seria uma estratégia similar à que a China adotou com sua indústria automobilística, que viabilizou a criação da montadora BYD e de toda uma indústria de carros elétricos no país. Segundo Farias, a retomada da Ceitec é parte desse processo, que pode contar também com a colaboração com as universidades públicas do país, “onde a formação de mão de obra e a troca entre academia e indústria são mais fortes”.
“Ou seja, também flexibilizar a relação de trabalho do professor universitário para a formação de pesquisa na indústria é uma das coisas principais que a gente pode fazer, e que acho que vai dar maiores ganhos”, explica.
Farias afirma que o fato de o Brasil ter a segunda maior reserva de terras raras do mundo faz do país mais do que um parceiro para a produção de semicondutores, sendo um potencial protagonista, e que o país tem universidades e profissionais capacitados, infraestrutura e mercado consumidor para alcançar essa posição.
“Não existe motivo nenhum para o Brasil não ser um polo de produção de semicondutores na América Latina e, quiçá, no Sul Global. A gente tem esse potencial, mas tem que ter uma política, tem que existir uma política de governo que pressuponha, que entenda que hoje a soberania passa por tecnologia.”
Fonte: sputniknewsbrasil







