Senador dos EUA propõe veto nacional ao aborto mirando influência do tema na eleição


Senador dos EUA propõe veto nacional ao aborto mirando influência do tema na eleição

(FOLHAPRESS) – É uma proposta que já nasce quase enterrada: as chances são mínimas de avançar no Senado dos Estados Unidos, hoje controlado pelo Partido Democrata, um projeto para proibir em todo o país abortos após 15 semanas de gestação, proposto nesta terça (13) pelo republicano Lindsey Graham.

Mas a ideia não é exatamente aprovar a proposta -ao menos não por ora-, e sim unir o Partido Republicano e forçar a sigla a marcar posição em torno do tema. Isso já apresentou algum resultado nesta quarta (14), com apoios públicos de nomes como Marco Rubio e o ex-vice-presidente Mike Pence.

É ainda uma questão de timing, visto que o projeto foi apresentado a menos de dois meses das midterms, as eleições legislativas de meio de mandato, em um momento em que a defesa da proibição do aborto se mostrou mais espinhosa do que se imaginava.

A história começou quando a Suprema Corte reverteu um entendimento de 49 anos em junho e decidiu que a interrupção voluntária da gravidez não é um direito garantido pela Constituição -uma reivindicação antiga de setores do Partido Republicano.

Mas a defesa da proibição acabou se mostrando arriscada em ano eleitoral, ainda que alguns estados tenham conseguido endurecer as regras -caso da Virgínia Ocidental que, também nesta terça, aprovou por ampla maioria o veto à prática em quase todos os casos.

O primeiro grande teste, porém, veio no começo de agosto, quando eleitores do conservador estado do Kansas rejeitaram, com 59% dos votos, um referendo para permitir que o Legislativo local alterasse as normas sobre o procedimento.

Uma pesquisa do Pew Research Center no mês anterior mostrou que seis em cada dez americanos rejeitavam a mudança no entendimento da Suprema Corte e preferiam que o direito ao aborto permanecesse garantido pela Constituição.

A relevância do tema ganhou nova tração no começo de setembro. Pesquisa do jornal The Wall Street Journal apontou o aborto como o principal motivador de voto na eleição de novembro, mais importante até do que a inflação recorde do país, a segurança nas fronteiras, a violência armada ou a operação do FBI contra o ex-presidente Donald Trump. Na mesma pesquisa, 60% dos entrevistados afirmaram que defendem a legalidade em todos ou na maioria dos casos.

A campanha, então, mudou de tom. A ameaça de os republicanos não conseguirem maioria tão expressiva quanto se imaginava na Câmara e o risco de nem sequer reconquistar o controle do Senado levaram uma série de candidatos a atenuar ou rever posições.

Um dos casos mais emblemáticos é o de Blake Masters, candidato ao Senado no Arizona apoiado por Trump. Defensor da proibição do aborto, ele diz em seu site que é preciso “proteger os bebês e não deixá-los serem mortos”, mas recentemente impulsionou anúncios em redes sociais em que suaviza o discurso e diz apenas que apoia a proibição do “aborto tardio”.

Entre eleitores homens, Masters aparece 8 pontos à frente do nome democrata, de acordo com pesquisa da Fox News. Já entre as mulheres, o republicano despenca e fica 22 pontos atrás do adversário.

Para reduzir a diferença, o programa eleitoral de Masters agora exibe sua mulher, Catherine, elogiando as qualidades do marido. É uma estratégia à la Michelle Bolsonaro, primeira-dama brasileira, que tem tentado aliviar a resistência do eleitorado feminino contra Jair Bolsonaro (PL), um candidato conservador e visto como mais agressivo, particularmente contra mulheres e minorias sociais.

A tática tem sido adotada em diferentes partes dos EUA, sobretudo nos chamados estados-pêndulo, que não têm preferência clara entre democratas ou republicanos e podem mudar o tabuleiro político a cada ciclo eleitoral.

O que mais preocupou republicanos na pesquisa do Wall Street Journal foi o recorte entre mulheres brancas e moradoras de subúrbios, grupo que tem preferência partidária menos clara. Entre elas, 52% responderam que darão preferência a um candidato democrata, contra 40% que afirmam preferir um republicano. É justamente nessa fatia que candidatos considerados mais agressivos miram agora, em meio ao esforço para suavizar sua imagem.

Em Ohio, o escritor best-seller e candidato republicano ao Senado J.D. Vance, também apoiado por Trump, dobrou a aposta na conexão com o eleitorado feminino e colocou no ar um anúncio de 30 segundos em que sua esposa ressalta suas origens e elogia o fato de que, com pais ausentes, ele foi “criado por sua amável avó”. Discurso parecido com o da mulher de Jaime Laxalt, em Nevada, que destaca o fato de o marido ter sido criado só pela mãe.

No Colorado, o candidato republicano ao Senado Joe O’Dea, que tenta tirar do Congresso o democrata Michael Bennet, colocou esposa e filha em anúncios em que elas discutem seu apoio ao direito ao aborto em determinados casos. Ele critica o ex-presidente Trump desde que venceu as primárias para o partido e se apresenta como moderado.

Ocorre que O’Dea votou, em 2020, em uma proposta estadual -que acabou rejeitada- para impedir a interrupção da gravidez após 22 semanas de gestação, mesmo em casos de estupro ou incesto, o que tem sido explorado por seu adversário.

A tentativa de Graham de estabelecer a régua na 15ª semana de gravidez também tenta passar a impressão de moderação -uma vez que a lei seria menos restritiva do que legislações estaduais que proíbem abortos na maioria dos casos. Segundo o republicano, a ideia é “consistente com o resto do mundo” e tem limites mais flexíveis do que países europeus como Espanha (14 semanas) e França (12 semanas).

A Casa Branca reagiu rapidamente. “Esse projeto de lei está totalmente fora de sintonia com o que os americanos acreditam”, disse o governo de Joe Biden. A nota acrescenta que, enquanto a administração se esforça para tomar medidas importantes para o futuro do país, “os republicanos no Congresso estão focados em tirar direitos de milhões de mulheres.”

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