Composta por Argentina, Chile, Uruguai, Brasil, Peru e Equador, nações que mantêm missões científicas no local, a RAPAL também agregou a Colômbia e a Venezuela como observadores.
O grupo se reúne anualmente desde 1990 nas capitais dos países-membros, onde discute e aprova medidas para fortalecer a cooperação logística e científica, incrementar a defesa do meio ambiente e consolidar a presença dos países latino-americanos no Sistema do Tratado da Antártica.
À reportagem, Jefferson Cardia Simões, professor titular de geografia polar e glaciologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e delegado nacional do Comitê Científico de Pesquisa Antártica (SCAR, na sigla em inglês), explica que as questões relacionadas à Antártica são bem divididas em diferentes esferas.
Dessa forma, cabe a entidades como a RAPAL gerir questões logísticas quanto ao uso de estações, de portos e ao transporte aéreo e naval dos seus países-membros. Já as questões científicas ficam a cargo da SCAR, onde ocorrem as colaborações dos programas.
Por fim, as questões políticas quanto ao território se dão no âmbito do Sistema Tratado Antártico, conjunto de regulamentos e fóruns que define tanto regras de uso do continente quanto o estado das relações internacionais do continente.
Diplomacia pela ciência
A confusão entre esses diferentes âmbitos de atuação ocorre pois, especialmente no caso da Antártica, a diplomacia se dá por meio da ciência.
Ao todo, sete Estados reivindicam parte do território antártico, lembra à Sputnik Brasil a doutoranda do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF) e do Centro para Estudos da América Latina e Caribe (LACS) da Southwest University of Science and Technology Gabriele Hernandez.
“Aqui na América do Sul a gente tem dois Estados que reivindicam o continente: a Argentina e o Chile“, diz Hernandez, que também é pesquisadora na Escola de Guerra Naval (EGN). Os demais são Austrália, França, Noruega, Nova Zelândia e Reino Unido.
Todas essas sete reivindicações foram feitas antes do Tratado Antártico e, ainda que tenham assinado o documento, esses países ainda mantêm suas contestações.
Oficialmente, explica Hernandez, “a Antártica não tem dono, não pertence a nenhum país, mas os países que mantêm estações de pesquisa dispõem de maior autonomia e um certo nível de governabilidade nos territórios onde estão essas estações científicas”.
Ou seja, manter uma estação de pesquisa no continente gelado, além de ser uma iniciativa científica, “é uma questão política”. Países que mantêm bases por lá têm direito a voto e a veto nas reuniões do Tratado Antártico.
“Então você tem voz ativa na tomada de decisão em relação a tudo o que é feito no continente.”
Hoje, 29 países têm direito a voto, e o Brasil é um deles. Para Cardia, isso se deve ao Programa Antártico Brasileiro (Proantar), que há 42 anos defende o direito do Estado brasileiro de participar nas decisões sobre o futuro dessa região do planeta, que inclui o continente de 13,8 milhões de km² e o oceano Austral.
A Antártica tem uma profunda importância para o Brasil. Poucos percebem, mas “para o clima brasileiro, a Antártica é tão importante quanto a Amazônia”, diz o cientista. “É do embate dessas massas de ar que saem dos trópicos e com as massas de ar que saem da Antártica que nós vamos regular o sistema climático aqui no Hemisfério Sul.”
Sendo assim, é de extrema importância que o Brasil e o resto da América do Sul tenham não só um programa substancial de investigação científica, mas consolidem sua presença no local. “A América do Sul é o continente mais próximo da Antártica e, certamente, o mais afetado pelas condições ambientais da Antártica.”
Além disso, defende Cardia, a Antártica faz parte do entorno estratégico brasileiro, sendo uma região de atenção da Política Nacional de Defesa (PND) e da Estratégia Nacional de Defesa (END).
“Isso é o motivo político de estar presente na Antártica.”
Nesse sentido, os países sul-americanos parecem estar trabalhando bem. A Argentina e o Chile possuem, respectivamente, 14 e 13 estações científicas no continente. Afinal, eles são os dois Estados com a maior proximidade geográfica com a Antártica.
Dessa forma, as reuniões da RAPAL, embora muito focadas em questões administrativas e logísticas, se configuram também como forma de a América do Sul conceber e estreitar um ponto de vista próprio para o continente.
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Fonte: sputniknewsbrasil