A ideia de valor pode assumir diferentes significados a partir de contextos diversos. Um deles, que rapidamente é vinculado ao conceito de quantificação, é o de importância que se dá algo ou alguém. Essa perspectiva estabelece um filtro pelo qual a humanidade experimenta o mundo e, em alguma medida, dita o que e quanto alguma coisa importa. A definição de valor, neste sentido, pode agenciar a tomada de decisão sobre diversos temas, a exemplo da proteção ao meio ambiente – sobretudo em um cenário de crise climática.
Na coordenação do Programa de Pós-Graduação em Ciências Florestais e Ambientais (PPGCFA) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), a professora Jaçanan Eloisa de Freitas Milani apontou que a classificação principal dos benefícios oriundos da natureza traduz esses bens como sendo serviços ecossistêmicos. Contudo, a educadora também frisou que a importância de cada benefício ecossistêmico pode variar dependendo de cada contexto, mudando também seu valor para determinada comunidade.
“É muito nítido para as pessoas que vivem na região do Pantanal, por exemplo, que a água pode não ser o principal serviço prestado pela natureza, já que lá ela é abundante. Para essa população o que falta em termos de benefícios são as abelhas que, segundo relatos locais, sumiram da região. Se não tem abelhas, não tem polinização. Outro exemplo em uma região de Cerrado, a água é o mais urgente. O que reflete que a urgência de um grupo não necessariamente é do outro. E isso dá um contraste muito grande e revela que a importância do recurso também varia pelo local”, disse a professora.
Neste sentido, a Organização das Nações Unidas (ONU) criou uma classificação dos benefícios da natureza com uma divisão em quatro categorias de serviços ecossistêmicos: serviços de provisão (que são aqueles oriundos diretamente da natureza, a exemplo dos alimentos); de regulação (que regulem condições ambientais, como o clima); culturais (a exemplo das atividades recreativa, religiosa e paisagística) e: de suporte (que somam a outros serviços ecossistêmicos, como a formação do solo e dispersão de sementes).
Restaurar é mais caro do que preservar
Para além da flexibilidade da discussão sobre quais e quantos são os benefícios da natureza, um entendimento cada vez mais consolidado entre os estudiosos é o de que é muito mais caro restaurar a parcela de um bioma destruída do que preservá-la. Isso porque, segundo a educadora, a restauração é um processo custoso, complexo e que envolve dinâmicas próprias para cada bioma – o que fortalece a importância de proteção ao meio ambiente.
Com ampla experiência em ecologia florestal, restauração, avaliação de impactos ambientais e arborização urbana, a professora recomenda o livro “Verde Urbano”. A obra leva para o grande público conceitos diversos sobre biodiversidade, proteção ambiental e outros temas. Além disso, a educadora também aconselha o acompanhamento dos trabalhos realizados pela plataforma MapBiomas Brasil, que é uma rede colaborativa que mapeia a cobertura e uso da terra no país desde 1985.
Um dos grandes problemas da discussão sobre valor no contexto ambiental passa pela concepção de mensuração. Isso porque a importância da preservação de rios, matas, fauna e outros elementos da natureza pode variar a depender do observador. Para povos originários, por exemplo, as florestas têm valor imensurável por serem centrais dentro de sua cosmovisão de mundo. Contudo, em uma sociedade de mercados multinacionais, a ideia de valor geralmente está ligada ao conceito de preço, isto é, o quanto determinado recurso custa em uma moeda específica.
Apesar de ser a expressão monetária do valor de um recurso, a concepção de preço também guarda complicações. Por exemplo, imagine um hectare quadrado do bioma Cerrado que é cortado por um rio, tem diferentes árvores e abriga diversas espécies de animais. Quanto custa esse espaço? A precificação neste caso pode ser pensada a partir de dois conceitos, o de valor público e valor privado. No primeiro, é considerado o preço vinculado à exploração de recursos como madeira e solo. Já o segundo considera os bens coletivos oriundos da preservação do espaço.
Um levantamento divulgado em maio deste ano pelo Banco Mundial dá perspectivas para se pensar o tema a partir do valor da Floresta Amazônica. Com o nome “Equilíbrio Delicado para a Amazônia Legal Brasileira: Um Memorando Econômico”, o estudo divulgou que a Floresta Amazônica vale até sete vezes mais em pé do que valeria se fosse desmatada. Na prática, o documento detalhou que a exploração privada via agropecuária, mineração e extração madeireira renderia entre US$ 43 e 98 bilhões. Por outro lado, com a preservação ambiental, o bioma renderia até R$ US$ 317 bilhões, cerca de R$ 1,5 trilhão.
Com contribuições do economista norueguês Jon Strand, o relatório considerou estimativas de preço a partir dos conceitos de valor de exploração e valor de proteção. No primeiro, são considerados os valores privados da conversão dos recursos da floresta derrubada. Já no segundo são levados em conta os valores públicos da floresta em pé, como a polinização, a captura de dióxido de carbono, a biodiversidade, a cobertura vegetal, proteção contra incêndio, serviços de regulação hídrica e outros.
Fonte: ufmt