Por que montadoras estão em crise, demitindo em massa e fechando fábricas?


Se existem marcas e regiões performando como nunca antes vistos, conforme apontei em uma das minhas colunas, temos o outro lado da moeda. Não que todas as empresas aqui citadas estejam com problemas, mas certamente passam por uma readequação em seus processos. Isso se dá por alguns fatores. Porém, aqui irei me ater a dois cruciais: a “invasão chinesa” e as políticas de Donald Trump.

É fato que a indústria chinesa revolucionou o mercado automobilístico, em especial quando falamos sobre eletrificação e tecnologia. Desse modo, provocou uma mudança no equilíbrio das forças produtivas pré-estabelecidas.

Com preços competitivos e produtos com tecnologia avançada, os veículos chineses estão ganhando mercado. Houve, claro, críticas acerca da prática de dumping, que incluíram estudos da União Europeia e terminaram por incidência de alíquotas muito menores do que as desejadas.

Neste contexto, temos de respeitar caso você não goste de veículos de origem chinesa. Só que o problema não deve ir além do seu gosto pessoal.

Chama atenção o impressionante crescimento da exportação dos veículos chineses pelo mundo nos últimos anos. No Brasil, por exemplo, tivemos em 2024 o maior volume de importação dos últimos 10 anos, impulsionado pelo ingresso de produtos do país asiático em nosso mercado.

Das mais de 466 mil unidades que aportaram por aqui, 120,3 mil vieram da China. Tal número representa alta de 187% ante 2023, quando 41,96 mil veículos foram importados daquele país.

Por isso, se alguns crescem, outros, claro, perdem em market share. E é isso que estamos observando em nível mundial. Algumas indústrias passam por um momento de readequação com redução da produção, fechamento de fábricas e eliminação de postos de trabalho.

Com um prejuízo líquido anunciado de 5 bilhões de dólares em 2024, a japonesa Nissan planeja, em nível global, fechar sete fábricas, eliminar cerca de 20 mil empregos e unificar seus produtos —possibilitando uma redução de 70% na complexidade das peças.

Para completar, a companhia tem planos de vender sua sede, em Yokohama, avaliada em US$ 700 milhões de acordo com informações locais. Além de fazer caixa, a Nissan quer controlar de forma contundente seus custos para tentar sobreviver após a fusão com a Honda não ter dado certo. Não à toa, também já anunciou oficialmente que a construção de sua fábrica de baterias foi cancelada.

Já a sueca Volvo, hoje do grupo chinês Geely, anunciou planos de cortar aproximadamente 3 mil empregos como parte de uma iniciativa de melhoria na geração de fluxo de caixa e redução estrutural de custos. As demissões ocorreriam principalmente nos escritórios suecos e representariam aproximadamente 15% da força de trabalho administrativa total. Em abril, a empresa já havia anunciado uma redução nos investimentos de longo prazo.

A celeuma causada pelo presidente norte-americano, Donald Trump, também não pode ser desconsiderada. Trump está causando uma verdadeira alteração na produção, logística e cadeia de fornecimento globais, e afeta a indústria num momento inoportuno.

De forma resumida, para quem não acompanhou, Trump tenta concentrar novamente a indústria dentro de suas fronteiras aumentando alíquotas de importação de certos produtos, incluindo ferro, aço, alumínio e veículos prontos. O efeito será a transferência de algumas fábricas, principalmente do México e Canadá, para aquele país, ocasionando o fechamento ou a diminuição da produção em outros territórios.

A General Motors, sediada em Detroit, já demitiu cerca de 2 mil funcionários no mercado norte-americano. Além dos empregos, a empresa pretende cortar US$ 2 bilhões em custos enquanto ajusta sua estratégia para veículos elétricos e administra a desaceleração das vendas nos Estados Unidos e na China.

A Ford, por sua vez, tem planos de cortar 4 mil empregos na Europa por conta de desaceleração do mercado de elétricos. Os países mais afetados serão Alemanha e Inglaterra, conforme anúncio no final de 2024. A empresa já havia, inclusive, comunicado a redução da produção na fábrica de Colônia. Já nos Estados Unidos, suspendeu a produção por tempo limitado da F-150 Lightning.

A Stellantis demitiu 400 funcionários administrativos e planeja ceifar outros 4 mil postos nos EUA. A empresa enfrenta a oposição do sindicato, que, por lá, tem atuação diferenciada do que estamos acostumados por aqui. De forma adicional, a companhia paralisou provisoriamente as atividades em suas fábricas no Canadá e México.

A Volkswagen continua a planejar cortes de empregos e fechamento de fábricas. A base para as demissões é a alta concorrência chinesa. Em 2024, a fabricante discutiu o encerramento das atividades de três unidades, cortes nos salários em torno de 10%, bem como congelamento dos mesmos por dois anos, algo permitido naquele mercado.

Até a Tesla reduziu sua força de trabalho global em mais de 10% em função de queda nas vendas no primeiro trimestre de 2025, decorrente de um mercado de veículos elétricos mais competitivo.

A montadora de luxo inglesa Aston Martin cortará 170 empregos (5% de sua força de trabalho) para economizar 25 milhões de libras.

Já a Porsche cortará 3,9 mil empregos nos próximos anos assim que os contratos de trabalho por prazo determinado forem terminando. Além desses postos, a companhia disse que efetuará 1,9 mil demissões até 2029.

Por fim, Audi e JLR (Jaguar Land Rover) suspenderam temporariamente a exportação de seus carros para o mercado norte-americano. Isso, evidentemente, resultou em perdas para os funcionários sediados na Europa.

E, se está ruim, tende a piorar. Como sou otimista nato, acredito que o Brasil sairá fortalecido dessas discussões com maior capacidade produtiva e de exportação, favorecendo ainda mais a nossa indústria local. Resta melhorar nossas vendas internas (o que depende de fatores macroeconômicos) e propiciar acordos comerciais com nossos vizinhos para conseguirmos escoar nossa produção.

É muita lição de casa a ser feita. Não tenha dúvidas.

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Fonte: direitonews

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