Por que criar um carro popular não é bom negócio para as fabricantes?


O governo federal anunciou nesta semana o novo plano para reduzir impostos dos carros mais baratos do Brasil e chegar a um valor mais “popular”. Com a nova medida, modelos com preços de até R$ 120 mil podem ficar de 1,5% a 10,96% mais baratos. Mas o chamado “carro popular” é um negócio bom para as fabricantes? Autoesporte conversou com um especialista para responder essa questão.

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Primeiro, é importante entender o que vai acontecer com essa nova medida. A expectativa é de que os carros novos mais baratos do país passem a custar menos de R$ 60 mil com as isenções. A dupla Renault Kwid e Fiat Mobi, vendidos por R$ 68.990, são os modelos mais em conta do Brasil atualmente.

Essa redução de até 10,96% será feita por meio de ajustes no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e no PIS/Cofins usando como base três critérios:

Voltar com o carro popular é uma forma de alavancar a indústria automotiva após anos de crise, principalmente por conta da pandemia. Mas carros de entrada não são exatamente os mais rentáveis para as fabricantes. Isso é um dos motivos para eles terem sido extintos de uns anos para cá. A Chevrolet, por exemplo, já disse que modelos mais baratos não são a prioridade.

“As fabricantes mudaram o perfil dos portfólios para modelos que dão mais lucro. Fazer o carro de entrada geraria interesse, mas reduziria a margem”, afirma Gustavo Lima, mentor de Manufatura da SAE, engenheiro mecânico e coordenador do Programa de Gestão de Inovação e Tecnologia da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Por conta disso, a fabricante precisa vender um volume considerável para ter uma margem de lucro significativa. Um exemplo que podemos dar é da Ford, que mesmo tendo o sexto carro mais vendido do país em 2020, o Ka, com 67.491 emplacamentos, encerrou a produção no início de 2021. Não só do hatch como de todos os modelos produzidos no país devido à baixa lucratividade.

“O impacto dessa nova medida do governo não deve representar algo muito importante diante do cenário atual. Isso porque o poder de compra atualmente inibe essa possibilidade de um avanço grande, mesmo que os carros passem a ser vendidos a partir de R$ 60 mil. O consumidor está muito afetado com a elevação dos custos que foram repassados nos preços nos últimos anos”, afirma Antônio Jorge Martins, coordenador de cursos automotivos na Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Os veículos atuais estão correndo contra o tempo para diminuir as emissões de poluentes e trazer mais segurança com airbags, controles de tração e estabilidade e freios mais eficientes, porém, isso tem seu custo.

“Reduções de emissões e segurança veicular trazem muitos benefícios para os carros e para a população como um todo. Mas essas tecnologias têm preços que muitas vezes o cliente final não percebe. De uma forma geral, se você tem um custo maior para produzir e não consegue passar tudo para o cliente, há uma perda de margem. E isso são coisas que pressionam a indústria”, afirma Cleber Willian Gomes, docente do departamento de Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia Industrial (FEI).

Muitas tecnologias são importadas e isso também cria um desafio ainda maior para reduzir custos. E as fabricantes não podem abrir mão de reduzir emissões e aumentar a segurança.

“Eu costumo dizer que os carros hoje são robôs com rodas porque eles são muito tecnológicos. De uma forma estratégica, é preciso encontrar uma forma de médio a longo prazo para conseguir unir tecnologia de segurança e emissões com um custo mais baixo, porque não tem como aumentar a tecnologia, aumentar e segurança e não elevar o custo. É matemática”, explica.

Outro ponto que dificulta a diminuição dos preços é que as fabricantes estão investindo muito em conectividade embarcada. E isso é feito por meio de parcerias com várias outras empresas.

“Equipamentos de segurança, por exemplo, as fabricantes não podem dos carros. E itens de conectividade acho difícil abrirem mão porque é o segmento no qual muitas investem, junto com outras empresas, para ter carros mais conectados, que os deixam mais caros. É um caminho sem volta”, diz Martins.

Os hábitos de compra dos brasileiros estão mudando nos últimos anos por causa da inflação. No ano passado, o índice foi de 5,8%, medido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O número ficou acima do previsto pelo Banco Central (de 3,5%), entretanto, foi melhor que os 10,1% de 2021.

Com menor poder de compra, há mais dificuldade para obter linha de crédito e os juros dos financiamentos também jogam contra o consumidor. Por isso, as vendas de carros caem e, consequentemente, o volume de um modelo de entrada não atinge o patamar desejado para ter o lucro esperado pelas fabricantes.

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Fonte: direitonews

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