Com uma carreira brilhante, Pelé conquistou, ao lado da Seleção Brasileira, as Copas do Mundo de 1958, 1962 e 1970. No Santos, onde jogou praticamente a carreira toda, também empilhou títulos, entre eles duas Libertadores e dois Mundiais de Clubes, viajando o mundo inteiro em partidas de exibição com a equipe. Em um dos episódios mais notórios dessa trajetória no clube, chegou a paralisar uma guerra civil na Nigéria.
Para discutir o legado do “atleta do século”, a Sputnik Brasil ouviu pesquisadores de diversas áreas, que apontaram as contribuições de Pelé para além dos campos de futebol, desde sua ascensão em meio a um mundo ainda marcado pela segregação racial, à sua contribuição para a profissionalização do esporte e a formação da identidade brasileira.
Pelé foi um ‘destruidor de estigmas’ racistas
“O Pelé desmonta tudo isso com a sua genialidade, especialmente a partir de 1959, quando se torna um ícone mundial. Então toda a ideia que se tinha de o negro ser incapaz de ser criativo, o Pelé destruiu; incapaz de compreender os processos políticos, econômicos, sociais, o Pelé destruiu; incapaz de expressar de forma ampla a sua humanidade, o Pelé destruiu. Então a figura dele destruiu, destroçou, todos os preconceitos e estigmas de discriminação em relação à população negra”, explica o pesquisador à Sputnik Brasil.
“Esse é o grande legado de Pelé para o Brasil, de modo geral, e para a população negra, em especial. É o fim dos estigmas. Ele questiona os estigmas com a sua genialidade, ele provoca a necessidade de uma mudança, de pensar o negro a partir de um novo prisma, diferente do que vigia até o século XIX nesse país. Ele abre possibilidade para que o negro, como cidadão, reivindique políticas públicas e ele mostra a iniquidade do racismo na sociedade brasileira, em que mais de 60% da população é negra. Então ele deu uma grande contribuição nesse sentido”, afirma.
“Nesse sentido, acho que o movimento negro tem que ter uma ação política. Não, obviamente, inventando a imagem Pelé, mas problematizando essa questão para compreender a dialética do que ele provocou em relação à presença do negro […]. Precisamos ir além da aparência e observar a essência do fenômeno Pelé […]. Pelé teve um papel importante na humanização do negro na sociedade brasileira. Isso eu não tenho dúvida alguma”, diz o professor.
‘Um inventor da brasilidade’
“O Pelé, mais do que um jogador de futebol, é um inventor da brasilidade. Isso porque, em um país com quatro séculos de escravidão ver um descendente de pessoas que foram escravizadas furar a bolha da exclusão social — que sempre caracterizou a nossa história — e chegar ao auge de ser o brasileiro mais conhecido de todos os tempos, se para o futebol, o Pelé é o ápice, para o Brasil, o Pelé é um inventor da brasilidade, é um dos inventores de um país que a gente sonha que seja mais generoso, mais imaginativo. Pelé é tudo isso”, avalia.
Pelé marcou ruptura no futebol profissional
“Essa equação de Seleção Brasileira e nação brasileira, identidade nacional, praticamente se consolida ali. Eu digo sempre que essa equação vai perdendo força nas últimas décadas por conta da globalização, da ida dos melhores jogadores para a Europa, mas acho até que hoje em dia ela não é tão importante quanto foi naquele momento. Naquele momento, era importante você ter essa noção de brasilidade e o futebol, muito por conta do Pelé, acabou sendo bastante exitoso nessa construção de identidade nacional”, afirma.
Sinônimo de excelência
“A gente conseguiu ter o Pelé a carreira quase inteira aqui no Brasil. Ele não precisou ir à Europa, não quis à Europa, quis ficar aqui e a gente conseguiu viabilizar isso. Então é uma grande vitória do futebol brasileiro. É uma história de vitória do futebol brasileiro em campo, mas a vitória brasileira que representa o Pelé é também para autoestima, para a ideia do atleta de elite, para o atleta negro brasileiro”, afirma Iamin em entrevista à Sputnik Brasil.
Fonte: sputniknewsbrasil