Com apenas seis anos de vida, a Zona de Comércio Livre Continental Africana (ZCLCA, ou AfCFTA, na sigla em inglês) está dando seus primeiros passos, tendo entrado em vigor em 2021, quando a quantidade mínima de 22 signatários ratificados foi alcançada.
À Sputnik, Amos Lugoloobi, ministro das Finanças de Uganda, nova parceira do BRICS, afirmou que vê no grupo anti-hegemônico um catalisador para a integração do bloco de livre comércio. Atualmente estão afiliados ao BRICS, seja como país parceiro ou membro de pleno direito estes cinco países africanos: África do Sul, Egito, Etiópia, Nigéria e Uganda.
A impulsão que uma integração BRICS-AfCFTA traria à África foi tema do episódio desta segunda-feira (31) do Mundioka, podcast da Sputnik Brasil apresentado pelos jornalistas Melina Saad e Marcelo Castilho.
Da ordem de US$ 6,5 trilhões
Entrevistado pelo podcast, o professor de relações internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Alexandre dos Santos explicou que uma África integrada sob o AfCFTA tem enorme potencial. Seu momento de criação contou com mais países, inclusive, do que a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC), grupo que visa abarcar todo o planeta.
Estudos da Comissão Econômica das Nações Unidas para a África (UNECA, na sigla em inglês) estimam que, em 2030, a região terá 1,7 bilhão de pessoas — em sua maioria, jovens, prontas para trabalhar e consumir. “E esse mercado vai ser da ordem de mais de US$ 6,5 trilhões“, afirmou Santos.
Atualmente, as nações africanas já participam de alguns blocos econômicos com outras geograficamente próximas. A União Africana reconhece um total de oito blocos regionais, mas nenhum é tão “ousado” como a AfCFTA, tão sonhada pelos pan-africanistas, que traria uma livre circulação de investimentos, pessoas e empresas por todo o continente.
“Então o que eles estão querendo fazer é integrar isto que já vem acontecendo historicamente, mas que não tinha o guarda-chuva do continente africano inteiro: integrar absolutamente tudo. E os desafios são enormes.”
Hoje, de todo o continente, apenas seis países não aderiram ao acordo em alguma forma, seja por assinatura ou ratificação: Benin, Líbia, Somália, Sudão, Sudão do Sul e Eritreia — a maior parte, países em guerra civil.
A ausência desses países, contudo, não é o maior desafio para o bloco, mas sim como integrar nações com economias tão díspares. São mais de 50 países, alguns gigantes econômica e geograficamente, como Argélia, Egito, Nigéria e África do Sul, e outros pequenos e insulares, como São Tome e Príncipe, Guiné-Bissau e Lesoto.
“Olhem as discrepâncias para você fazer essa integração entre economias e em um processo em que todo mundo saia ganhando de alguma maneira.”
Por conta disso, não se deve julgar com descrença as poucas realizações do bloco até agora. Como exemplo das dificuldades de se montar um empreendimento desse, o professor da PUC-Rio lembrou da história da União Europeia.
Criada oficialmente em 1992, com o Tratado de Maastricht, formulações da comunidade europeias já eram realizadas desde 1951, quando se estabeleceu a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA).
Nesse sentido, quanto à fala do ministro ugandense, Santos afirma que, como o BRICS ampliou e trouxe para dentro de si países do continente africano, nada mais natural do que “haver conversas” sobre o grupo ajudar na formação do bloco continental.
Para Rafael Abrão, professor de relações internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), um dos motivos pelos quais o BRICS aparece como uma boa plataforma para auxiliar na integração pan-africana é a boa relação que os países do continente têm com a China.
“As expectativas estão altas, e esse otimismo se justifica justamente por causa desse histórico de aproximação entre o continente e a China nos últimos anos.”
Como afirmou o ministro Lugoloobi, a aproximação entre os dois grupos deve diversificar o investimento estrangeiro, trazendo desenvolvimento para a região e criando um “ciclo virtuoso nas economias africanas”.
“A parceria com o BRICS tem o objetivo de buscar mais autonomia, de ter uma alternativa em relação à Europa e aos Estados Unidos”, detalha Abrão.
Fonte: sputniknewsbrasil