‘O Brasil é o esteio da biomassa’: país pode impulsionar transição energética em indústrias pesadas?


Para especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil, o marco regulatório é estratégico para a criação de um arcabouço jurídico que permita investimentos no segmento com mais segurança, além de viabilizar maiores esforços para a transição energética.
De autoria do deputado Gilson Marques (Novo-SC), o projeto de lei (PL) nº 2308/2023 foi aprovado na Câmara dos Deputados na quinta-feira (11). O texto inclui o hidrogênio dentro da Política Energética Nacional, permitindo que se crie uma regulamentação específica para o setor.
Durante sua apresentação inicial na Câmara, o documento constava apenas com definições que definiam o hidrogênio de baixo carbono. Na sua passagem pelo Senado foi instituído o Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (Rehidro), iniciativa de estímulos fiscais que chegam a R$ 18 bilhões.
Agora, a Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono aguarda a sanção presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva, que pode vetar a integridade ou partes do projeto.
O PL cria também o Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (PHBC), que tem como objetivo fomentar o desenvolvimento do mercado interno para hidrogênio em setores de difícil descarbonização, como o siderúrgico, cimenteiro, químico, fertilizantes, petroquímico e transportes pesados.
Além disso, o texto prevê que a autorização para a produção do hidrogênio de baixo carbono caberá à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Na avaliação de André Casimiro de Macedo, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), a inserção da ANP como agência reguladora “é a mais apropriada para as atividades de produção, armazenamento, transporte de hidrogênio, haja vista a similaridade do setor com a questão do setor energético”.
Uma alteração de última hora do senador Fernando Farias (MDB-AL) também aumentou de quatro para sete quilos a quantidade de CO2, que poder ser liberada durante a produção de um quilo de hidrogênio. O valor é o máximo permitido para que o produto possa ser considerado de baixo carbono, mas mais do que o dobro permitido pela União Europeia, dificultando exportações para o maior cliente brasileiro.

Hidrogênio verde: energia do futuro?

O hidrogênio de baixo carbono é considerado uma das maiores promessas na descarbonização do planeta. O químico pode ser usado tanto como combustível de veículos, de carros a aviões, quanto como fonte de energia elétrica para atividades humanas, como indústrias pesadas.
O hidrogênio verde, talvez o mais falado pelo potencial energético, é gerado através de rotas industriais que utilizam eletrólise de água. O Senado Federal também permitiu que o hidrogênio brasileiro pudesse ser produzido através de fontes de biomassa, biogás, biometano e hidrelétrica.
Dessa forma, o Brasil está muito bem posicionado para ser um grande exportador do combustível, uma vez que sua matriz energética é, aproximadamente, 80% composta de fontes renováveis. Além disso, durante o dia, o país possui um superávit na produção solar, que pode ser utilizada na fabricação do hidrogênio.
Sobre o hidrogênio, Diogo Simões, professor do Instituto de Pesquisa em Petróleo e Energia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), explicou que trata-se de um vetor energético, ou seja, para obtê-lo, é necessário que ele seja fabricado de alguma maneira para, em seguida, poder ser utilizado.
“Primeiro, tem que ter eletricidade limpa para poder, então, fazer o que se chama de eletrólise da água, e aí você obtém hidrogênio, certo? Então, só tem hidrogênio verde quem tem, primeiro, eletricidade limpa”, explica, citando como exemplo a eletricidade eólica e a solar fotovoltaica.
E, para a transição energética, que consiste na substituição dos usos de energia fóssil por energia limpa, o hidrogênio verde tem papel importante. Apesar de não ser o único insumo capaz de promover a transição, a nova rota energética passar por ele, evidentemente.
O hidrogênio pode ser usado para fazer combustíveis limpos, combustíveis que a gente chama de eletrocombustíveis. Então, você pode, a partir de energia elétrica limpa, obter hidrogênio e, com esse hidrogênio, reagir junto com o dióxido de carbono e produzir um combustível que é muito parecido quimicamente com o combustível fóssil”, exemplifica.

Brasil tem grande potencial para produzir energia limpa, mas não pode se atrasar

“O Brasil é o esteio da biomassa”, ou seja, “todos os biomas que a gente tem no país têm uma característica específica de uma biomassa”, afirma Macedo.
O país, por exemplo, tem participação importante de energia renovável, principalmente quando são tratadas as energias solar e eólica. “No Brasil, a gente tem um número de empresas que surgiram nos últimos anos, o setor [de energia solar] ganhou muita força. Acredito que nós estamos vivendo uma época que é totalmente favorável à adoção de matrizes renováveis”, reforçou.
Outros mercados também podem ganhar força no país, como a energia eólica e biomassa, “a gente tem um monte de outras oportunidades que podem ser trabalhadas em paralelo”, afirma o professor da UFC.
Macedo ressalta, ainda, que o Brasil já ocupa um lugar de destaque no ranking mundial de produção de energia renovável.
“Os recursos naturais que nós temos e climáticos nos favorecem muito. Então, tudo isso indica que o Brasil vai ter um lugar garantido quando se fala em adoção de matriz renovável, inclusive de panorama futuro”.
Para assumir de vez essa liderança e aproveitar esse lastro a frente de outras nações, Simões avalia que o Brasil deve apostar em “novos investimentos em expansão da capacidade de geração de energia limpa” para exportar energia de modo mais eficiente, “essa maneira certamente não é exportar hidrogênio puro tal qual”, ressalta.
Essa exportação passa, de certa forma em relação ao hidrogênio, pela transformação do elemento para um modo mais fácil de ser transportado, como combustível líquido.
“Você pode usar esse hidrogênio para fazer uma molécula que se chama metanol, que pode ser utilizada como combustível de navios, ou então combustíveis líquidos para aviação, o que vou chamar de eletrodiesel, essa é uma maneira importante de você exportar energia sem ter que exportar o próprio hidrogênio, que é problemático”.
Com o intuito de avançar, Macedo sublinha ainda que o Brasil precisa resolver algumas lacunas, como questões de segurança e transporte no caso do hidrogênio, além de ser necessário que haja cooperação entre instituições de ensino, entre os governos, instituições financeiras, indústrias, organizações não governamentais, empresas privadas, “para facilitar a transferência de tecnologias, que haja um certo compartilhamento de conhecimento”.
Segundo ele, para reduzir esse gargalo, “os centros de pesquisa precisam ser mais inseridos e participar mais ativamente desse período com relação à transição energética”.
“De nada adiantaria todo esse incentivo fiscal, todo esse plano criado pelo governo se daqui a um tempo a gente não vai ter como manter toda essa estrutura com recursos humanos bem formados, com tecnologia própria para não criar dependência”, completa.
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Fonte: sputniknewsbrasil

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