Novo pré-sal? Margem Equatorial pode deter as maiores reservas de petróleo já encontradas no Brasil


Uma região que se estende por mais de 2,2 mil quilômetros da costa brasileira, entre o Amapá e o Rio Grande do Norte, pode esconder as maiores bacias de petróleo e gás já descobertas no Brasil: a Margem Equatorial que, segundo a Petrobras, possui características semelhantes às grandes reservas existentes no Suriname e Guiana, país que só no ano passado viu a economia crescer quase 40%.
Apesar das potencialidades, há críticas de ambientalistas por conta da fragilidade do ecossistema da área e a proximidade com a foz do rio Amazonas, que fica a mais de 500 quilômetros da primeira bacia.
Já a Petrobras, que chegou a ter uma licença ambiental rejeitada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em 2023 para perfuração de poços no Amapá, garante que os riscos são mínimos por conta da distância com a costa litorânea e expertise adquirida nas últimas décadas — a companhia brasileira é a petrolífera líder mundial na exploração em águas profundas e ultraprofundas. Já na região do Rio Grande do Norte, que tem estudos mais avançados, a empresa conseguiu sinal verde.
No fim de dezembro, foi iniciada a perfuração do poço de Pitu Oeste, a 53 quilômetros da costa, na bacia Potiguar. A expectativa é que os trabalhos que vão comprovar ou não a existência de petróleo sejam finalizados entre três e cinco meses. “Essa região [toda a Margem Equatorial] é uma extensão de bacias na costa da Guiana e do Suriname, na qual já atuam 24 empresas e onde ocorreram 60 descobertas com volume estimado de 11 bilhões de barris”, garante a Petrobras, que prevê investimentos de US$ 3,1 bilhões (R$ 15,2 bilhões) até 2028.
O professor do Departamento de Engenharia de Produção da Universidade do Estado do Pará (UEPA) e especialista em cadeia de suprimentos para o setor de petróleo e gás, Antonio Batista, explicou à Sputnik Brasil que os estudos geológicos iniciais já mostraram que a Margem Equatorial ainda possui semelhanças com outras regiões que são grandes produtoras de petróleo.

“São áreas que têm se encontrado muito petróleo, em particular, na África e aqui próximo em países como as Guianas e o Suriname, sem falar na Venezuela, que tem a maior reserva de petróleo do mundo, com mais de 200 bilhões de barris. Esses sinais apontam que a região concentra uma grande reserva de petróleo e, uma vez comprovado, isso pode gerar uma série de potenciais econômicos e sociais”, resume o especialista.

O que é o novo pré-sal?

Localizado em águas que ultrapassam 2,8 mil metros de profundidade, a Margem Equatorial atravessa os estados do Amapá, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio de Grande do Norte. Segundo o professor Antonio Batista, as cinco bacias podem abrigar mais de 30 bilhões de barris de petróleo, com uma possibilidade de exploração para além de 2050. Por isso, a região recebe o nome de novo pré-sal, em alusão à região que alcançou a marca de 1,2 bilhão de barris produzidos só em 2022 e é a grande responsável por levar o país a nono no mundo e maior representante do setor na América Latina.

“É importante destacar que o pré-sal é uma bacia única até o momento, principalmente, pela grande produtividade. Determinados poços produzem de forma extraordinária, algo em torno de 50 mil barris de petróleo por dia, número registrado em poucas localidades do mundo […] Na Margem Equatorial, a Petrobras começou agora pela Bacia Potiguar, no Rio Grande do Norte, mas há uma campanha exploratória feita até anteriormente, que apontou só nessa área algo em torno de quatro a seis bilhões de barris”, diz o engenheiro.

Mesmo sendo uma nova reserva de combustível fóssil, um dos principais responsáveis por acelerar a mudança climática, o especialista pontua que a Margem Equatorial será importante para garantir a segurança energética no país. “Só as energias sustentáveis ainda não conseguem atender toda a demanda e, por isso, a segurança energética traz o conceito de integração entre as diferentes fontes. Não dá para depender apenas do petróleo, que gera aumento das emissões, mas ainda não é possível abandonar totalmente pelos próximos 50 anos”, estima.
© Petrobras / DivulgaçãoMapa da Margem Equatorial brasileira divulgada pela Petrobras

Mapa da Margem Equatorial brasileira divulgada pela Petrobras - Sputnik Brasil, 1920, 04.01.2024

Mapa da Margem Equatorial brasileira divulgada pela Petrobras
Como exemplo, o especialista cita a Alemanha, que chegou perto de um apagão de energia após abandonar as usinas nucleares e o gás russo, que é menos poluente, por conta das sanções impostas pelos Estados Unidos. Com isso, precisou recorrer ao carvão mineral, o mais poluente de todas as fontes, por não ter segurança energética em seu parque de produção.
Para presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), Roberto Ardenghy, apesar dos grandes desafios trazidos pela Margem Equatorial, o Brasil possui “liderança mundial em exploração e produção” em regiões parecidas e desenvolveu toda uma cadeia produtiva de tecnologia nas últimas décadas. “O setor de petróleo brasileiro é capaz de realizar todas as atividades de perfuração, exploração e produção com as melhores tecnologias disponíveis, aliado à segurança e responsabilidade ambiental”, defende à Sputnik Brasil.

Brasil tem autossuficiência em petróleo?

Diante de uma necessidade de pelo menos um bilhão de barris de petróleo por ano, sem a descoberta do pré-sal, o Brasil estaria “quebrado” atualmente. É o que aponta o professor da UEPA, que lembrou que a Bacia de Campos, que é a outra fonte do combustível no país, produz menos de 30% da demanda do país. Isso tornaria insustentável as finanças do país, que perderia capacidade de investir em saúde e educação para comprar energia. O pré-sal complementa a demanda restante é o maior responsável pela autossuficiência em petróleo do país, apesar de ainda importar gasolina e diesel por falta de refinarias.

“Sabemos que as contas públicas não são boas, o governo tenta zerar o déficit, que é algo super difícil, mas pelo menos há expectativas para o futuro”, diz. E com a proximidade das reservas do pré-sal se exaurirem, o possível papel da Margem Equatorial fica ainda mais importante para o país, acrescenta.

Internamente, os estudos e a exploração das cinco bacias (Amapá Águas Profundas, Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar) já tem sido motivo de divergências dentro do governo federal: enquanto o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendem o empreendimento, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é mais resistente e vê possíveis impactos na transição energética do país para uma matriz limpa.

Por que a Petrobras aposta tanto no novo pré-sal?

Para além da questão energética, o professor Antonio Batista classifica a Margem Equatorial como uma oportunidade inédita para a melhoria econômica e social no Norte e Nordeste, onde estão as maiores desigualdades do país.
Segundo ele, que atua há mais de 20 anos no setor, a indústria do petróleo e gás é responsável por criar toda uma cadeia de comércio e serviços nas localidades em que atua, além de alavancar os cofres públicos de estados e municípios com pagamentos de royalties.

“Para manter um navio plataforma em alto mar, é necessária toda uma cadeia ampla e diversificada de suprimentos, materiais e serviços onde a atividade acontece. Vai desde empresas especializadas em recuperação de máquinas até hotelaria, alimentação e mercado imobiliário […] Isso por si só mostra as oportunidades que a indústria de petróleo gera enquanto investimentos, geração de empregos e movimentação de negócios na cadeia de fornecedores, além da instalação de empresas multinacionais”, resume.

Como a dependência do petróleo contribui para as mudanças climáticas

Na contramão do que defende a Petrobras, ambientalistas reagem à possível exploração de petróleo na Margem Equatorial, cuja reserva seria responsável por emitir entre quatro bilhões e 13 bilhões de toneladas de gás carbônico na atmosfera. Os dados foram elaborados pelo Observatório do Clima e podem ser comparados a tudo o que Estados Unidos (5,3 bilhões) e China (12,3 bilhões) lançaram em 2020, os dois países mais poluidores do mundo.
Diante disso, os dados da entidade apontam que as emissões do combustível retirado da região seria equivalente a postergar o desmatamento da Amazônia em 30 anos. Outro ponto sensível ressaltado é com relação à falta de estudos ambientais sobre a bacia sedimentar na Margem Equatorial, principalmente na região mais próxima à Foz do Amazonas. A região é classificada como de “extremamente alta relevância biológica”.
poucos registros científicos sobre a área, cujos estudos maiores foram publicados apenas após 2016. E a exploração, apontam ambientalistas, poderia ainda colocar em risco todo um corredor ecológico de cerca de 56 mil quilômetros quadrados, área maior que o estado de Sergipe, com diversos corais, esponjas e algas.
O diretor técnico do Instituto Internacional Arayara e do Observatório do Petróleo e Gás, Juliano Bueno de Araújo, acrescenta à Sputnik Brasil que ainda há muitas áreas prioritárias ao longo dos cinco estados que compõem o território para conservação da biodiversidade. “Contam com a presença de habitats endêmicos à reprodução e rota migratória de diversas espécies sob risco ou severo risco de extinção, como tartarugas e peixes-boi marinhos. Além disso, os impactos das atividades poderão afetar a economia local e tradicional da pesca”, resume.
De acordo com o especialista, a bacia próxima ao Amapá também traz grandes desafios exploratórios por conta da forte correnteza da região, oriunda do rio Amazonas. No caso de um derramamento de óleo, que a Petrobras garante ter baixas possibilidade de acontecer, o fluxo marítimo levaria o material para águas internacionais em direção ao Caribe.

“Surgiriam conflitos internacionais para o controle e a retirada do óleo, além de medidas compensatórias. Até o momento o país já demonstrou estar despreparado para responder a esses acidentes, como ficou evidente no final do ano de 2011, com o derramamento pela plataforma da Chevron na Bacia de Campos, e durante o vazamento de 2020 que assolou todo litoral norte do país”, pontua.

Novo pré-sal: há risco aos corais amazônicos?

Já o professor titular de geologia marinha da Universidade Federal Fluminense (UFF), Alberto Figueiredo, alegou à Sputnik Brasil que entidades internacionais tem associado a região da Margem Equatorial com imagens de recifes de corais existentes no Caribe entre 150 e 200 metros de profundidade, o que “desperta o interesse na preservação do meio ambiente, que é louvável”. Porém, como essa não é a realidade da área e a comparação, segundo o especialista, atrapalha o desenvolvimento da região, que na realidade conta com algas calcárias que não são formadoras de corais.
As bacias que são alvo dos estudos da Petrobras ficam em áreas sem a luminosidade e transparência da água necessárias para uma intensa vida marinha. Por fim, o professor de marinha lembra que os sedimentos lamosos vindos do rio Amazonas são “esporadicamente” depositados no fundo dessa região, o que impede o “desenvolvimento dos corais”.

Fonte: sputniknewsbrasil

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