Nestlé quer brigar com a sua cafeteria preferida — e vai investir R$ 300 milhões no Brasil para isso


A pandemia chacoalhou o modus operandi da indústria mundo afora, e isso não é novidade alguma. Os resquícios deste período, porém, continuam impondo às empresas desafios que extrapolam a agenda financeira ou de comunicação. Agora, a necessidade é por também lançar mão de maneiras de atrair um consumidor sedento por experiências, demanda reprimida em consequência dos anos em isolamento social e com imposições de circulação.

A aposta da multinacional suíça Nestlé, nesse cenário, é por recriar esse tipo de experiência social, ainda que do conforto de casa. Para isso, a empresa lançou nesta semana a Nescafé Dolce Gusto Neo, sua mais nova máquina da linha de cafeteiras da marca dedicada ao café em cápsulas que hoje é líder de mercado tanto no Brasil, quanto na Europa — segundo a Nestlé, um em cada três cafés em cápsulas no mundo são da marca.

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O que há de novo na máquina?

A cafeteira faz uso de atributos high tech para unir dois pontos principais: preparação rápida e personalizada. Um sistema de leitura algorítmica identifica pequenos pontinhos (uma espécie de marca d’água) que dizem qual é o tipo de cápsula de café e, consequentemente, determina a quantidade necessária de água e temperatura para o preparo. São, ao todo, quatro tipos diferentes de extração para o café nas cápsulas, preparando cinco tipos de bebidas, do tradicional expresso ao “café americano” – este em parceria licenciada com a marca Starbucks.

Mas o consumidor também pode personalizar sua bebida com a ajuda de um aplicativo no qual dita suas preferências no preparo de cada receita. O app e a maquininha se “conversam” por meio da tecnologia Bluetooth e Wi-Fi.

Em meio ao apelo crescente pelo ESG, sigla que sintetiza a doação de critérios sociais, ambientais e de governança, a tentativa da Nestlé é também por confiar na relevância da sustentabilidade entre os critérios de escolha dos amantes de café.

A Neo leva isso à risca. Metade dos componentes da máquina são recicláveis, com matérias-primas como alumínio e plástico de segunda vida. Ainda assim, a promessa da companhia é de uma durabilidade fora da curva para aparelhos neste nicho, com garantia mínima de 10 anos.

O grande destaque, no entanto, está nas cápsulas. Também sustentáveis, elas são feitas de papel certificado e biodegradável, ou seja, que se desintegra naturalmente em composteiras caseiras ou por meio de reações químicas dentro de um período de até seis meses. A matéria-prima é certificada pela Forest Stewardship Council (FSC), uma ONG dedicada ao tema.

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O desafio das cápsulas

O passo é grande. Atualmente, as cápsulas plásticas são consideradas as principais vilãs no enredo em favor da sustentabilidade na cadeia do café, especialmente no que se refere ao mercado de cafeteiras elétricas e caseiras.

O desafio está em contrariar essa lógica ao trazer ao mercado uma solução mais amigável à natureza e que preconize o fim do desperdício da bebida. “Costumamos falar que hoje o ralo é o principal consumidor de café do mundo. É um produto desperdiçado ao máximo por nós. Por isso, tentamos há tempos mostrar que as cápsulas, feitas na exata medida do consumo, podem ser sim a solução mais sustentável para o futuro”, disse Thaissara Martins, líder de ESG para cafés e bebidas da Nestlé Brasil.

A novidade foi apresentada à EXAME durante visita ao centro de inovação e tecnologia da Nestlé na cidade de Orbe, na Suíça. A cidade foi lar de testes para o produto nos últimos cinco anos, um trabalho que envolveu ao menos 40 funcionários diretos e incontáveis colaboradores vindos da academia e de startups da região – todos alocados em uma aceleradora interna.

Por que o Brasil?

O mercado brasileiro será o primeiro a testar — e comercializar — o novo produto, que será lançado oficialmente na primeira semana de dezembro. O país foi escolhido pela companhia a partir de uma avaliação criteriosa que começou com uma pesquisa interna.

A empresa conduziu um estudo com sua base de consumidores de café do Brasil. O objetivo era entender a fundo os principais desejos desse público e, em troca, vislumbrar alguns caminhos para o futuro. O resultado foi uma série de indicadores que comprovaram a relevância de temas ligados à customização e sustentabilidade entre os consumidores brasileiros de café, especialmente os mais jovens.

De acordo com a pesquisa, 47% dos compradores de Nescafé Dolge Gusto ainda consideram o plástico das cápuslas um problemão. O casamento perfeito com a proposta de menor impacto ambiental trazida pela nova Neo.

De outro, a relação direta do Brasil com a produção de café para a companhia suíça também pesou na decisão. Grande parte do café que dá origem às pequenas cápsulas vem dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, de fazendas que já têm 100% de sua produção considerada sustentável.

Além disso, todas as cápsulas de papel serão produzidas na fábrica da companhia em Montes Claros, também em Minas Gerais, uma planta que já recebeu a chancela Triplo Zero, gabarito mais alto na adoção de padrões sustentáveis como neutralização de carbono e gestão de resíduos — a primeira da companhia no mundo a alcançar o feito. Tornar as linhas de produção industriais amigáveis à nova tecnologia exigirá da empresa investimentos na casa dos 300 milhões de reais no país.

Para completar, o Brasil mantém o e-commerce mais importante da marca globalmente.

“Toda a jornada que seguimos até aqui fez com que o Brasil fosse uma escolha acertada e óbvia. É uma conversa que temos há anos, e que só foi possível graças ao apelo pela sustentabilidade, da fábrica aos consumidores que buscam por inovação”, disse Tiago Buischi, responsável pela área de marketing da Nescafé Dolce Gusto no Brasil.

Sem previsão de lançamento em outros mercados, a máquina e as cápsulas sustentáveis serão vendidas exclusivamente no Brasil neste primeiro momento.

Briga com Starbucks?

O lançamento vem na esteira do sucesso das cafeterias dentro do mercado de alimentação fora de casa como um todo. Os estabelecimentos são responsáveis por 66 dos 279 milhões de francos suíços (algo como 296 milhões de dólares) movimentados pelo setor em 2021, uma evolução de 7,8% ante resultado de 2015. A nível de comparação, todo o mercado cresceu apenas 2,7% nos últimos seis anos.

“Continuar relevante neste mercado é algo que requer inovação. Se não pensarmos no futuro e na tecnologia, ficamos para trás”, diz Arnaud Deschamps, vice-presidente global da Nescafé Dolge Gusto.

Nesse cenário, alianças estratégicas devem ajudar. A empresa mantém, desde 2017, uma parceria com a rede de cafeterias Starbucks em um acordo de licenciamento que permite à Nestlé estampar a logo da parceira em alguns produtos. Agora, o lançamento da Neo também vem acompanhado de uma cápsula que exibe a marca da rede americana.

De modo geral, de acordo com Deschamps, essa é a maior aposta da Nestlé no mercado de cafés desde a criação de Nescafé Dolce Gusto, em 2006. A marca chegou ao Brasil três anos depois.

“Esse é o futuro. Um futuro que não será possível sem a união perfeita de sustentabilidade e tecnologia”, diz. “Estamos ansiosos pelo lançamento no Brasil e para entender como usaremos esses meses de aprendizado para determinar a estratégia daqui em diante”.

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