NATHALIA GARCIA E IDIANA TOMAZELLI
BRASÍLIA, DF – O governo Jair Bolsonaro (PL) está concluindo uma proposta de regulamentação que autoriza os trabalhadores a usarem recursos futuros do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) como garantia em financiamentos do programa habitacional Casa Verde e Amarela.
O texto deve ser apresentado pelo Ministério do Desenvolvimento Regional ao Conselho Curador do FGTS ainda em setembro. Se aprovado, serão necessários cerca de 120 dias até que os bancos consigam operacionalizar a medida -ou seja, os primeiros financiamentos só ocorreriam a partir de 2023.
O secretário nacional de Habitação da pasta, Alfredo Santos, afirma que a iniciativa pode ampliar em até 80 mil o número de unidades financiadas por meio do programa nos primeiros 12 meses a partir da vigência da autorização. Ele ressalta, porém, que os detalhes dependerão do desenho final aprovado pelo Conselho Curador.
O FGTS é um valor depositado pelo empregador em uma conta individual do trabalhador, equivalente a 8% do salário. Segundo as regras atuais, o valor acumulado pelo empregado pode ser usado na compra da casa própria em três hipóteses: como entrada, no pagamento de 12 parcelas (uma vez por ano, limitado a 80% do valor das prestações) ou na amortização do saldo devedor do contrato (uma vez a cada dois anos).
“Nenhuma dessas hipóteses, porém, eleva o poder de compra das famílias”, diz Santos. De acordo com o secretário, a mudança em discussão dentro do governo vai permitir maior acesso das famílias, sobretudo de baixa renda, à compra da casa própria.
Com o uso do FGTS futuro, a previsão de recursos a receber pelo trabalhador com carteira assinada poderá entrar no cálculo de capacidade de pagamento de quem quer financiar um imóvel pelo programa. A discussão foi noticiada pelo jornal O Globo e confirmada pela Folha de S.Paulo.
Um trabalhador com renda de R$ 2.000 mensais, por exemplo, hoje consegue financiar um imóvel pagando prestação de cerca de R$ 450. Com a inclusão dos depósitos mensais de R$ 160 em sua conta no FGTS, a capacidade de pagamento subiria a cerca de R$ 600.
Do ponto de vista operacional, em vez de optar anualmente pelo uso do fundo para o pagamento das parcelas, o trabalhador autorizaria desde já o bloqueio desses valores para a quitação da prestação no futuro.
Segundo Santos, ao permitir que as famílias ofereçam esse tipo de garantia, há duas possibilidades: ou reduzir o valor de entrada para famílias que hoje esbarram nesse obstáculo por ter uma renda baixa, ou permitir que os trabalhadores busquem imóveis maiores ou em melhor localização –que podem ser mais caros.
O secretário afirma que não há decisão ainda sobre um limite temporal para a oferta desses recebimentos futuros como garantia, mas ressalta que a negociação das condições se dará diretamente entre os agentes financeiros (como a Caixa e o Banco do Brasil) e os mutuários.
“A mudança não incrementa o risco [para o banco], a princípio. Então, isso não impacta a taxa de juros, que continua sendo fixa”, afirma Santos.
Em termos de público, a ideia é que a mudança valha inicialmente para as famílias dos grupos 1 (renda até R$ 2.400 mensais) e 2 (renda até R$ 4.400 mensais) do programa Casa Verde e Amarela, podendo ser ampliada pelo Conselho Curador.
As famílias do grupo 1 e 2 são aquelas que contam com algum tipo de subsídio ao financiamento, uma espécie de desconto no valor a ser pago no contrato e que é bancado pelo próprio fundo de garantia. O teto para esse subsídio hoje é de R$ 47,5 mil.
A modalidade que libera os trabalhadores a usarem o FGTS futuro é bem-vinda pelo setor da construção, mas gera desconfiança entre os bancos, uma vez que existe a possibilidade de demissão após a contratação do financiamento -comprometendo os recebimentos futuros do fundo.
Os mecanismos para minimizar o risco de inadimplência, que deve ser assumido pelo agente financeiro, ainda estão sendo discutidos dentro do governo.
Hoje, porém, o programa já oferece a opção de suspensão do pagamento das prestações por até seis meses em caso de desemprego involuntário, justamente para dar possibilidade de retorno ao mercado de trabalho e manutenção dos pagamentos.
A proposta de permitir o uso dos recebimentos futuros do FGTS foi aprovada pelo Congresso Nacional em julho, dentro do texto da MP (Medida Provisória) que criou novas linhas de microcrédito para pessoas físicas e MEIs (microempreendedores individuais).
A MP, que foi sancionada por Bolsonaro no fim de agosto, também ampliou o prazo máximo para financiamento de imóveis do Casa Verde e Amarela de 30 anos para 35 anos. A mudança passou a valer para a aquisição de novos contratos a partir da última quinta-feira (1º).
Outras mudanças envolvendo o programa habitacional do governo federal voltado a famílias de baixa renda foram divulgadas recentemente.
Em julho, o Conselho Curador do FGTS já havia aprovado a elevação dos limites de renda familiar mensal bruta para conseguir financiar um imóvel pelo Casa Verde e Amarela. A faixa mais baixa -de até R$ 2.400- foi mantida. No grupo 2, o limite passou de R$ 4 mil para R$ 4,4 mil. No grupo 3, foi de R$ 7 mil para R$ 8 mil.