Governo Lula deu “um ano de lambuja” para bets e é maior culpado da crise, diz senador


O governo Lula é o maior responsável pela mazela social gerada no Brasil pelas plataformas de apostas online, as “bets”, de acordo com o senador Carlos Portinho (PL-RJ), membro da CPI da Manipulação de Jogos e Apostas Esportivas no Senado.

Ao elaborar um projeto para liberá-las, no ano passado, e demorar para regulamentar esse mercado, o governo deu “um ano de lambuja” para as empresas de apostas, permitindo que operassem sem a devida arrecadação e sem um sistema eficaz de fiscalização, diz Portinho.

Em entrevista à Gazeta do Povo, o senador – que atuou por anos como advogado especialista em Direito Esportivo – afirma que alertou o governo sobre o tema no ano passado, mas não foi ouvido. “Houve morosidade do governo em soltar as portarias, tendo ele pressionado para aprovar esse projeto… E, pior, ele não se preparou com uma estrutura de fiscalização e controle”, critica.

Portinho também tentou chamar a atenção do governo sobre a necessidade de criação de uma força-tarefa especializada em monitorar as bets, mas a recomendação foi ignorada. Agora, ele cobra também a federalização das investigações sobre manipulação de apostas, ressaltando que as células criminosas envolvidas nesse mercado se movem nacionalmente, o que torna ineficazes as investigações focadas só na esfera estadual.

Para o senador, a melhor forma de o governo estancar a sangria que ele próprio provocou é suspender temporariamente as bets até que as portarias e regulamentações sobre propaganda, arrecadação e formação de uma força-tarefa estejam prontas.

Confira a seguir as falas de Portinho sobre a polêmica das bets.

Governo Lula fez estrago dando “um ano de lambuja” para as bets

“Eles viram o estrago que fizeram na sociedade com um projeto que eles mesmos elaboraram. E vai custar tempo para acertar o estrago. Desde o início, esse projeto tem várias falhas, porque ele só visou a arrecadação. Ele não se preocupou com a rede de proteção, em cobrar das bets os impostos.

O governo deu um ano de lambuja para as bets. Como assim, fazer pressão para votar um projeto – em que votei contra – e só um ano depois fazer as portarias? Então, durante um ano, o governo que falou que [a aprovação do projeto] era para arrecadar abriu mão da arrecadação? É isso?

Uma bet de médio a grande porte tem lucro anual em torno de R$ 500 milhões de reais. O que o governo fez foi dar de lambuja isso para as bets, para que, no ano que vem, elas paguem R$ 30 milhões [segundo a lei, para operar em âmbito federal, as bets devem pagar uma outorga de R$ 30 milhões].

Ora, diziam que R$ 30 milhões em notórias era muito dinheiro. Muito dinheiro nada. Se eu soubesse que ia ficar um ano sem recolher nada, tinha que ser quatro vezes isso, no mínimo. Houve morosidade do governo em soltar as portarias, tendo ele pressionado para aprovar esse projeto… E, pior, ele não se preparou com uma estrutura de fiscalização e controle. Sobre isso eu alertei.

Inclusive, eu queria ter colocado [na lei], obrigatoriamente, a criação de um grupo tático especial da Polícia Federal no Ministério Público para cuidar só de bets, com tecnologia, com expertise… Porque esse negócio da manipulação você não tem como fiscalizar. É difícil a prova da manipulação esportiva. Eu já vivi isso como advogado esportivo.

E, ainda por cima, deixaram isso frouxo durante um ano, sem um grupo tático especializado, e acabaram abrindo para o cassino. As máquinas de cassino [online] estão em Chipre, estão na China, de tigrinho, de blackjack… Como é que vão fiscalizar que elas estão devolvendo para o apostador um mínimo razoável, e que não são manipuladas? Não tem como, no caso desses outros jogos. Com apostas esportivas, é difícil provar, mas, no caso das máquinas, é impossível. Como vão ter acesso à máquina dos caras lá em Chipre? Não tem como. E essas máquinas são máquinas de tomar dinheiro.

Não houve a maturação do projeto. Houve um atropelo, houve o interesse de aprovar o jogo no Brasil, sem ter mecanismos de controle e de fiscalização para isso”.

Investigações sobre manipulação de apostas devem ser federalizadas

“Estive no Ministério da Justiça na semana retrasada e vou voltar em breve. Tenho defendido a federalização das investigações sobre manipulação. Já vimos na CPI que as células criminosas se movem pelos estados o tempo todo. A pessoa está no Mato Grosso, depois vai para Alagoas, manipula lá, e então vai para a série A2 do Paulista, para Pernambuco…

Esses são crimes federais. Lavagem de dinheiro é crime federal. Crime financeiro também é crime federal.

Corrupção, que envolve manipulação de resultados, é crime federal. Por que até agora o governo não chamou a responsabilidade e montou uma força-tarefa? Se pegarmos o caso de manipulação de resultados de 2009, que envolveu jogos da UEFA – Bélgica, França etc. –, logo após o ocorrido, cada país montou uma força-tarefa para manter uma fiscalização constante.

A CBF recebeu 109 alertas no ano passado e mais de 200 nos anos anteriores. O que ela faz? Encaminha ao Ministério Público e ao STJD, e diz: “Já fiz minha parte, se vira. Julga.”

O STJD nem tem poder de polícia no caso de manipulação esportiva, para ir a fundo nas investigações. E aí há um processo no Ministério Público do Mato Grosso, outro em Alagoas, outro em Pernambuco, quando sabemos que os envolvidos fazem parte das mesmas células criminosas. Um atleta que hoje está manipulando na série C amanhã estará na série A”.

Governo focou na arrecadação e criou uma mazela social

“O governo se preocupou só com arrecadação, isso ficou muito claro. Foi o maior defensor, foi quem mais empurrou o projeto, foi o próprio governo. O governo é diretamente responsável por essa mazela que está destruindo famílias.

E por que o governo entrou nisso agora? Porque perceberam que as pessoas estão gastando muito dinheiro do Bolsa Família com jogos, o que é uma vergonha. É o nosso dinheiro sustentando bets, e fora do Brasil ainda por cima.

O problema das bets é mundial. A manipulação acontece no mundo inteiro, e os sites de apostas estão em outros países – e continuam, ainda, pelo menos até que entre a regulamentação.

Acabar com a aposta hoje, depois de ter aberto essa porteira, é um movimento difícil. E, na verdade, o maior culpado é o próprio governo e todos aqueles senadores e deputados que votaram a favor.

O que seria o certo? Quando a empresa está fora do Brasil, tem que pagar IOF, tem que pagar câmbio, para ficar só nisso… Não vou nem falar do imposto de renda no final do ano. A gente chamou o secretário da Receita Federal e eu perguntei a ele: “Depois, a partir do ano que vem, vocês vão olhar para trás?” Eles têm cinco anos para poder cobrar. Tem muita coisa para cobrar. A gente sabe que as empresas fora do Brasil estão usando as empresas de meio de pagamento no Brasil para circular o dinheiro aqui e mandar só o lucro no final.

Mas isso está errado. Ela tinha que mandar cada aposta para fora do Brasil pagando IOF, pagando no mínimo a variação cambial.

O governo foi o maior incentivador de um projeto que hoje é uma mazela social do país, com diversas implicações”.

Propagandas de bets precisam ser reguladas

“Eu tinha um projeto com o [senador Eduardo] Girão para tirar propagandas de estádios, para evitar que atletas e influenciadores fossem garotos-propaganda. Isso tem que acontecer.

Chega, não dá mais. São muitas bets, é uma massificação, inclusive atingindo crianças fora do horário da faixa etária que deveria ser respeitado, como é na bebida, como é no cigarro. A gente vai ter que mexer nisso.

O outro problema é a negação de muitos setores. A própria imprensa nega que isso possa estar acontecendo, quando a gente sabe que isso acontece no mundo.

Aqueles que detêm os direitos de televisão não querem prejudicar o produto pelo qual pagam fortunas, mas eles estão prejudicando mais, porque enquanto a gente negar, a gente não vai reagir.”

Caixa quer agora entrar no mercado das bets, mas isso só criaria mais viciados

“O comércio está perdendo dinheiro, receita, porque as pessoas estão jogando mais do que comendo, do que comprando. A Caixa Econômica Federal está tendo um problema, porque ela vai arrecadar muito menos nas loterias dela, porque a concorrência é absolutamente desleal.

A Caixa não tem uma propaganda massiva, como têm essas empresas de bets, e ela vai perder apostador, vai perder recurso. E ninguém enxergou isso. O governo foi advertido disso, tanto com relação ao comércio, quanto com relação à Caixa Econômica.

Agora a Caixa está tentando reagir, equiparando as forças para jogar com as mesmas armas, mas quem paga o preço no final é a população, que vai ficar mais viciada e vai perder mais dinheiro.”

É preciso suspender o mercado das bets temporariamente

“Eu acho que é a hora de a gente pensar, sim, em suspender tudo, tudo, inclusive publicidade, até que saiam todas as portarias e as regulamentações sobre propaganda, sobre a atuação da Receita Federal, e eventualmente a formação de uma força-tarefa, como eu sugeri.

Eu acho que o governo deveria fazer isso. E isso vai ser um atestado de que ele próprio criou o problema, errou e está voltando atrás. Ninguém esperava que o governo fosse demorar tanto tempo para regulamentar o que ele, a toque de caixa, quis aprovar, ele próprio, no Senado Federal e no Congresso.

Essas empresas deveriam estar pagando imposto. O fluxo de pagamento deveria estar sistematizado numa regulamentação infraconstitucional. O governo dormiu e o problema está aí. Ele criou o problema, que virou uma mazela social.”

Fonte: gazetadopovo

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