Na última segunda-feira (08), a cúpula da Caixa destituiu dois gerentes que se opuseram à compra de um lote de R$ 500 milhões em letras financeiras do Banco Master, consideradas arriscadas demais para os padrões do banco estatal.
Um parecer sigiloso de 19 páginas, obtido pelo jornal O Globo, revela que a área de renda fixa da Caixa Asset, o braço de gestão de ativos do banco estatal, desaconselhou enfaticamente a operação, classificando-a como “atípica” e “arriscada” devido ao valor elevado e ao rating do banco.
O Master é um banco formado a partir do antigo Banco Máxima, com principais acionistas os empresários Daniel Vorcaro, Maurício Quadrado e Augusto Ferreira Lima, e que assumiu a atual razão social em 2021.
O documento da Caixa descreve o modelo de negócios do Master como “de difícil compreensão” e aponta para um “alto risco de solvência”. Esse parecer deveria ter sido discutido no comitê de investimento da Caixa Asset no último dia 4, mas, segundo apurou a equipe da coluna, o impasse criado pela postura dos técnicos fez com que o assunto fosse retirado da pauta.
Quatro dias depois, os gerentes Daniel Cunha Gracio, de renda fixa, e Maurício Vendruscolo, de renda variável, que também avalizou os documentos, perderam seus cargos. Fontes envolvidas no caso disseram que, durante a videoconferência em que os gerentes foram informados de sua destituição, os diretores da Caixa Asset afirmaram que a companhia passaria por uma reformulação, sem especificar detalhes e sem mencionar o parecer sobre a compra das letras financeiras do Master. A videoconferência contou também com a participação do CEO da Caixa Asset, Pablo Sarmento.
Nos bastidores da Caixa, o movimento foi interpretado como uma tentativa de retaliação e de eliminar resistências internas ao negócio, já que o comitê de investimentos deverá ser recomposto com novos gerentes dessas áreas. Desde então, uma crise se instalou no banco, repercutindo entre operadores do mercado financeiro, segundo fontes ouvidas pela equipe do jornal.
Com a retirada do assunto de pauta, a compra dos títulos não foi efetivada, mas isso não significa que a operação tenha sido descartada definitivamente.
Segundo fontes relacionadas ao caso, não há garantia de que ela não volte a ser discutida nas próximas reuniões do comitê de investimentos, já sob nova configuração.
A preocupação aumentou na área técnica, pois não há precedentes na história da Caixa Asset de uma operação desse volume com riscos tão altos.
Fontes afirmaram ao jornal que é muito incomum a área técnica barrar propostas de novos investimentos.
A Caixa Asset é uma divisão recente do banco estatal, criada em 2021 durante o Governo Bolsonaro e a gestão do então presidente da instituição, Pedro Guimarães.
As letras financeiras do Banco Master ofereciam uma rentabilidade de 130% do CDI ao ano, com prazo de 10 anos. No documento sigiloso, os gerentes observaram que a Caixa Asset nunca aplicou um volume tão alto em instituições de perfil arriscado como o Master, que tem um rating interno de BB+, considerado de médio risco. Esse tipo de aporte geralmente só é feito em instituições renomadas no mercado, como os principais bancos públicos e privados.
O parecer destaca ainda que nenhuma concorrente do braço de gestão de fundos da Caixa fez negócio com o Banco Master, reforçando a tese de uma operação atípica. Nos últimos anos, o Master comprou outros bancos menores, aumentando seu patrimônio líquido. De acordo com o documento interno da Caixa, o Master possui R$ 820 milhões em ativos no mercado financeiro, dos quais R$ 780 milhões foram aplicados por gestoras ligadas ao próprio Master, deixando apenas R$ 40 milhões comprados pelo mercado. Se comprasse as letras financeiras no valor proposto, a Caixa Asset investiria quase 13 vezes o valor que outros agentes do setor aplicaram no banco.
O parecer também inclui uma “pesquisa reputacional” sobre os principais executivos do Banco Master, identificando processos na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por manipulação de preços, irregularidades em distribuição de produtos de investimento e envolvimento em crimes financeiros. Um dos sócios do Master, Maurício Quadrado, foi acusado em delação premiada de oferecer propina de R$ 8 milhões para utilizar recursos do FI FGTS na empresa Rede Energia.
Além disso, o confuso modelo de negócios do Master engloba uma “operação complexa de investimentos em companhias” com empresas em recuperação judicial ou com alto grau de endividamento. As operações de crédito do banco são compostas em 47% por precatórios, considerados de “elevado grau de incerteza de recebimento” pela Caixa Asset, apesar de serem classificados como “AA” pelo próprio banco.
A concentração da carteira do banco nos vinte maiores clientes, que detêm mais da metade dos ativos, é outro fator agravante apontado pelos gerentes.
Fonte: gazetabrasil