‘Foi muito marcante na minha vida’: Marcos Pontes relembra momentos com cosmonautas russos (VÍDEO)


Às 23h30 do dia 30 de março de 2006 decolava do Cosmódromo de Baikonur, a maior base de lançamento de foguetes do mundo, a espaçonave Soyuz TMA-8, com três integrantes a bordo: o cosmonauta comandante da missão, Pavel Vinogradov; o engenheiro de voo da NASA Jeffrey Williams; e o astronauta Marcos Pontes, da Agência Espacial Brasileira.
Vinogradov e Williams subiam à Estação Espacial Internacional (EEI) como membros da Expedição 13, missão de longa duração no espaço. Já Pontes tinha seus próprios objetivos na EEI, a realização de experimentos científicos para instituições brasileiras, como universidades federais e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

“Ser as mãos e os olhos dos cientistas”, classificou Pontes.

A viagem até a EEI levou cerca de um dia — o acoplamento da Soyuz ao módulo espacial se deu na madrugada do dia 1º de abril daquele ano. “E aí o que você tem que saber é que tem duas espaçonaves, a Estação e nós, se aproximando a 28 mil km/h. Então não erre ângulo, nada disso.”

“No momento em que a Soyuz se aproxima da Estação Espacial, na parte do dia, […] é muito bonito a hora que você vai chegando próximo da Estação Espacial, o tamanho da Estação Espacial…”

Para Pontes, o momento de entrada na EEI foi um dos mais emblemáticos de toda a viagem. “Foi uma das emoções muito significantes que eu tive lá, graças ao Pavel, nosso comandante.”
Abrimos o hatch, e eu peguei a bandeira do Brasil, porque eu queria entrar com a bandeira do Brasil pela primeira vez dentro da Estação Espacial, e fiquei esperando a minha vez.”
Pelo protocolo, explica Pontes, o primeiro a entrar na EEI deveria ser o comandante, e então os tripulantes, ou Williams ou Pontes. “O Pavel, quando ele me viu com a bandeira do Brasil, falou assim: ‘Marcos, vai na frente’.”
“Não posso ir na frente. O protocolo diz você, o comandante, e depois […] eu ou o Jeff”, respondeu Pontes.

“E ele falou ‘Não, não, não é você que está indo na frente, é essa bandeira, é um país, uma nação que vai entrar na Estação Espacial pela primeira vez. E nem eu nem o Jeff temos o direito de entrar na frente de uma nação‘.”

O dia a dia na Estação Espacial

A rotina na Estação Espacial é muito intensa, afirmou Pontes. Todo detalhe da agenda diária é programado com antecedência.
O “dia” começa por volta de 06h00, horário do meridiano de Greenwich.

“Como a gente dá uma volta na Terra em 90 minutos, falar em dia e noite no espaço é uma coisa meio difícil. Você passa 45 minutos do lado do Sol e 45 minutos do lado da noite, então não dá para usar a luz como referência.”

Após cada um fazer a higiene pessoal e se encontrarem para o café da manhã, há um briefing tanto com Moscou quanto com Houston, EUA. “Depois vai cada um para o seu trabalho, e nos reunimos meio-dia de novo para o almoço.”
Esse momento, apontou Pontes, é de confraternização entre os integrantes da EEI. Após comerem, a programação de trabalho é retomada, indo até a hora do jantar. “O comandante faz questão de todos jantarem juntos, para verificar se está todo mundo comendo e bebendo adequadamente, o que é um problema no espaço.”
À noite o trabalho continua, mas as tarefas são mais simples, “muitas vezes entrevistas ou preparação dos equipamentos para o dia seguinte”. “Depois você faz a higiene pessoal e dorme por volta de seis horas.”

“Esse é o período que você tem para você, mas eu, por exemplo, dormia duas horas em vez de seis. Eu ficava olhando para a Terra, era o momento que eu tinha para olhar e tirar fotos. Então basicamente essa era a nossa rotina no espaço.”

Cooperação espacial Brasil-Rússia

Para participar da missão, Pontes passou por um treinamento na Cidade das Estrelas, centro de treinamento de cosmonautas próximo de Moscou. É lá que fica localizado o Centro de Treinamento de Cosmonautas Yuri Gagarin, batizado em homenagem ao primeiro ser humano a ir para o espaço, o soviético de mesmo nome.
“Foi um momento muito marcante da minha vida”, descreveu Pontes. “Eu fiquei lá [entre o treinamento em Moscou e a estadia na EEI] de outubro de 2005 até maio de 2006. E […] obviamente, por causa da temperatura e neve, [coisa] completamente diferente para um brasileiro, o cenário de ir lá era muito marcante, assim como a língua russa.”

“Aprender o básico, pelo menos para poder voar, também foi algo extremamente marcante. E as amizades que eu criei por lá, ou seja, foi um momento da minha vida muito especial e eu tenho muita saudade do pessoal, inclusive.”

Desde a época de sua visita, a Estação Espacial Internacional está se aproximando do final de sua vida útil. A Roscosmos, por exemplo, já anunciou que deixará a EEI em 2025 e já trabalha na criação de uma estação espacial própria, apelidada de ROSS (sigla em inglês para Estação de Serviço Orbital Russa).
Espera-se que o primeiro módulo da ROSS seja lançado em 2027, com a construção sendo finalizada até 2032.
Em vez de se isolar no espaço, a Rússia ofereceu parcerias para que nações amigas instalem seus módulos próprios em sua estação espacial — como a China, a Índia e o Brasil. Para Pontes, essa é uma grande oportunidade para o Brasil avançar em seu programa espacial.

“Acho que vai ser muito interessante o Brasil se aproximar [do desenvolvimento da ROSS], não só para desenvolvimento tecnológico e ajudar em alguns desenvolvimentos de sistemas e subsistemas da estação, mas também [para participar] na operação dessa estação.”

O envolvimento brasileiro também serviria como um incentivo à indústria nacional, desde o setor de pesquisa até o industrial. “As nossas empresas têm capacidade de participar.”
“Com isso, você precisa incentivar startups, colocar editais que possam trazer criatividade em empresas ágeis, […] para desenvolver sistemas e subsistemas que vão ser utilizados, por exemplo, na superfície da Lua, com rovers.”
O Brasil eventualmente vai conseguir ter mais astronautas. Vamos ampliar, vamos levantar essa barreira”, expressou Pontes.

O Brasil vai conseguir lançar astronautas brasileiros a partir do território nacional, com foguetes nacionais, com centro de lançamento nacional, com controle nacional, em algum tipo de sistema que a gente tenha uma parceria relevante.”

Busto de Gagarin é inaugurado em Brasília

Pontes participará, nesta sexta-feira (12), da inauguração de um busto em homenagem ao cosmonauta soviético Yuri Gagarin no Planetário de Brasília. “Sem dúvida nenhuma um herói, um herói da Rússia, um herói da humanidade.”
Eu acho importante a divulgação do programa [espacial russo]. O Gagarin, depois do voo dele, ele veio ao Brasil também, tem fotos dele no Brasil.”
Durante seu treinamento na Cidade das Estrelas, Pontes teve a oportunidade de conversar com instrutores que conheceram Gagarin.

“Eu pude ver que era um sujeito muito simpático, muito carismático, que tinha um conhecimento técnico muito grande e se dedicava realmente a conhecer os sistemas, como tem que ser para um piloto de teste, como tem que ser para um cosmonauta.”

“Uma coisa que também me chamou muito a atenção era a amizade forte desenvolvida entre ele e outros cosmonautas, como [Vladimir] Komarov“, disse. “É importante que as pessoas percebam que quando a gente participa de coisas como um voo de caça, essa é a maior junção, o maior exemplo de trabalho de equipe, porque a sua vida depende do outro.”
Para Pontes, um busto de Gagarin também deveria ser colocado em outras cidades do Brasil, como São Paulo. Um dos seus projetos é a criação de um museu espacial na capital paulista, e para isso ele gostaria de trazer peças do programa espacial da Rússia.

“Eu gostaria de ter um busto de Gagarin, um macacão, […] uma cápsula parecida com a minha, uma cápsula da Soyuz também. Tudo isso é importante. Eu estou contando com a Rússia para que nos cedam esses materiais, para a gente colocar em exposição também aqui no Brasil.”

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Fonte: sputniknewsbrasil

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