Além do medo do diagnóstico e dos efeitos colaterais do tratamento, o paciente com câncer começa um processo muito difícil quando o tumor é identificado. Porém, apesar de ser conhecida como uma doença quase invisível, já que só apresenta sintomas quando o quadro é grave, pouco se fala de um dos sinais mais presentes da condição: a dor crônica.
Estima-se que, entre os indivíduos em tratamento de câncer, de 33% a 60% sofra com dor. Nos estágios mais avançados da doença, o problema é mais mais comum, atingindo 90% dos pacientes.
As dores são associadas ao próprio tumor, mas também à quimioterapia, radioterapia, cirurgia, ou à combinação de todos os fatores, segundo a coordenadora da Comissão de Cuidados Paliativos da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), Cláudia Naylor.
Ela lembra que todas as dores podem e devem ser tratadas. Por isso, em qualquer sinal de desconforto, o paciente deve informar o médico e não sofrer calado.
“Eles não devem ter medo de falar, de incomodar o médico ou achar que algum medicamento vai prejudicar no tratamento. A dor pode fazer parte do processo e deve ser tratada o quanto antes”, completa Cláudia.
Sem cuidado, o incômodo pode aumentar e causar diversos danos ao paciente. Muitos deixam de dormir, comer, se relacionar com a família, de ir às consultas e às sessões, prejudicando o tratamento. “Sem contar aqueles que faltam ao trabalho, o que também pode levar a um dano financeiro”, destaca a oncologista da Oncoclínicas Brasília, Gabrielle Scattolin.
Os tipos de dor
Ao todo, são três os tipos de dores mais frequentes em pacientes que fazem tratamento de câncer:
- Dor somática: se apresenta nos ossos, músculos e articulações em 40% dos pacientes;
- Dor visceral: relacionada a cólicas intestinais e incômodos nas regiões do pâncreas e fígado;
- Dor neuropática: ligada a queimações e formigamentos.
Associado à dor – que pode ocorrer em formas leves, moderadas e intensas, em vários momentos do tratamento -, existe, ainda, o sofrimento de dimensão física, psicológica e social.
“É um sintoma extremamente complexo. Por isso, reforçamos a importância de a equipe médica (oncologistas, farmacêuticos, assistentes sociais e enfermeiros) sempre perguntar, investigar e, principalmente, entender o paciente”, ressalta Cláudia.
Um tratamento para cada dor
A escada analgésica, um guia desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1986, estabelece degraus para implementar o tratamento mais correto para cada tipo e intensidade de dor. O primeiro degrau aborda o esquema para cuidado de pacientes com dor leve, indicando drogas analgésicas comuns, não opioides.
No segundo degrau, na chamada dor moderada, já são adicionados os opioides fracos, mas também medicamentos da mesma classe considerados fortes, mas com dosagem menor. Já para a dor intensa, no terceiro degrau, a indicação são opioides fortes em altas doses.
Os analgésicos adjuvantes, drogas desenvolvidas para outras indicações mas que aliviam as dores associadas ao câncer, podem ser usados em todos os degraus da escada analgésica e em combinação com outros remédios.
Todo medicamento deve ser prescrito pela equipe médica. A automedicação, que já é perigosa para qualquer pessoa, é ainda mais complicada para pacientes oncológicos. “Na dosagem incorreta, essas drogas podem provocar intoxicação, necessidade de internação, comprometimento do tratamento e risco de vida”, alerta Cláudia.
Os remédios para tratar a dor associada ao câncer estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), por meio das políticas de medicamentos de alto custo.
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Tratamento multidisciplinar é ainda mais eficaz
O estudo Estilo de vida e dor após o câncer: estado da arte e direções futuras, publicado este ano no Journal of Clinical Medicine, aponta a necessidade de controle de fatores como estresse, ansiedade e depressão e, ainda, a necessidade de atividades físicas aliadas ao tratamento.
De acordo com o estudo, “ser fisicamente ativo após um diagnóstico de câncer melhora a taxa de sobrevivência dos pacientes em 30%”. Sobre o estresse, pesquisadores mostraram que indivíduos com quadros de angústia, por exemplo, apresentam efeitos adversos, como aumento da produção de citocinas (proteínas inflamatórias), piora na fadiga e nos sintomas do câncer.
Entre as medidas não farmacológicas indicadas para o tratamento de dores associadas ao câncer estão terapia comportamental, acupuntura, meditação e exercícios físicos. “Cada um deve discutido com oncologistas, fisioterapeutas e médicos, montando um programa adequado para cada tipo de câncer e paciente”, finaliza a oncologista Gabrielle.
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