Norma impede recebimento de acusação formulada apenas com base em falas e elementos produzidos e fornecidos por colaborador
Foto: João Américo/Secom/MPF
A mera palavra do colaborador e os elementos de informação apresentados por ele não seriam suficientes para o recebimento de denúncia. Com base nessa jurisprudência assentada de forma unânime pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestou-se pela rejeição de denúncia apresentada em maio de 2020 contra o deputado federal Aécio Neves (PSDB/MG) e outras quatro pessoas. A manifestação foi enviada ao relator do caso no STF, ministro Edson Fachin, nesta segunda-feira (8). Decorrente do Inquérito 4.436, a denúncia atribuiu ao parlamentar e aos demais investigados a prática dos crimes de corrupção ativa e passiva e de lavagem de dinheiro.
Na manifestação, o procurador-geral destaca que a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) “teve como elemento probatório central” os depoimentos de sete colaboradores, entre eles, o empresário Marcelo Odebrecht. De acordo com as investigações instauradas após os acordos, o parlamentar teria recebido vantagens indevidas no valor de R$ 65 milhões de duas construtoras: Odebrecht e Andrade Gutierrez. No entanto, o chamado Pacote Anticrime aprovado pelo Congresso Nacional alterou o regramento vigente acerca do tema (Lei 12.850/2013), impossibilitando o recebimento de denúncia ou queixa-crime com base exclusivamente nas declarações do colaborador.
Conforme pontua o PGR, após um período de divergências internas quanto ao tema, a Suprema Corte pacificou o assunto nesse mesmo sentido, o que impede a continuidade do caso. “Considerando o novo entendimento jurisprudencial, tem-se óbice ao Ministério Público Federal para o reconhecimento da justa causa, hipótese legal de rejeição da denúncia (art. 395, III, do CPP)”, afirma em um dos trechos do documento.
Na petição, Augusto Aras se manifesta sobre alegações apresentadas pelas defesas dos denunciados ao longo do processo, tanto no sentido de que as provas se basearam apenas em falas e elementos produzidos de forma unilateral pelos colaboradores, quanto em outros fundamentos. Um dos pedidos foi apresentado por Ênio Augusto Pereira e Silva para que o caso fosse desmembrado e encaminhado à primeira instância. A defesa alegou a falta de prerrogativa de foro do investigado e o fato de ele ter firmado acordo de leniência na primeira instância. Nesse aspecto, destaca o PGR, “a atração por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados” não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal.
Outra alegação mencionada e respondida na manifestação do PGR foi a apresentada por Dimas Fabiano Toledo, que questionou a afirmação de que teria praticado um crime permanente ao ocultar valores em contas no exterior, posteriormente descobertas. Para Aras, no entanto, conforme entendimento consolidado pelo STF no julgamento da Ação Penal 863, trata-se de crime de natureza instantânea do delito praticado, embora de efeitos permanentes, “uma vez que os elementos reunidos no inquérito apontam que os atos praticados pelo denunciado esgotaram-se na entrega dos valores operacionalizados pela construtora”.
Em relação às demais alegações apresentadas pelas defesas dos denunciados, o PGR afirma que estão prejudicadas em função da “ausência de justa causa”, decorrente da aplicação tanto da nova legislação (Lei 13. 964/2019) quanto do atual entendimento do STF. Neste momento, a conclusão do PGR é pela rejeição da denúncia, ressalvando o surgimento de novas provas nos termos do art. 18 do CPP do art. 18 do Código de Processo Penal.