Eleições: 2º turno inesperado sinaliza força da polarização no Equador, notam analistas


O Equador foi às urnas no domingo (9) para eleger o novo presidente do país em um pleito polarizado entre os dois principais candidatos, o atual presidente, o direitista Daniel Noboa, e a candidata de oposição da esquerda Luisa González.
É a segunda vez em 16 meses que o país vai às urnas. Em 2023, o ex-presidente Guillerme Lasso, em meio a um processo de impeachment, dissolveu a Assembleia Nacional e convocou eleições antecipadas. Na ocasião, Noboa foi eleito para um mandato-tampão de 15 meses, vencendo González ao obter 52% dos votos. Ao longo desse pleito, cinco políticos foram assassinados, incluindo Fernando Villavicencio, um dos presidenciáveis.
Com cerca de 18 milhões de habitantes, o Equador atualmente é um país sufocado pela violência e registra uma taxa de homicídio de 38 mortes a cada 100 mil habitantes.
O pleito de domingo foi encerrado com um segundo turno confirmado entre Noboa e González, marcado para 13 de abril. Segundo o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) do país, Noboa obteve 44,31% dos votos, contra 43,83% de González. O resultado surpreendeu, uma vez que as pesquisas apontavam vantagem de Noboa, com chance de vitória em primeiro turno.
O presidente do Equador, Daniel Noboa, durante cerimônia de entrega de equipamentos à polícia, na escola de polícia General Alberto Enríquez Gallo, em Quito. Equador, 22 de janeiro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 08.02.2025

O resultado mostra que a polarização no país, que ensaiou um arrefecimento na gestão Lasso, reacendeu com força. É o que aponta, em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, Ghaio Nicodemos, coordenador do Núcleo de Estudos de Atores e Agendas de Política Externa (NEAAPE), do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ).

“O Equador, desde o ciclo político que se iniciou com a saída do Rafael Correa, lá em 2017, começou a se assentar em um eixo político entre correístas e anticorreístas. Mas os últimos dois anos foram bastante atípicos, por conta do fim do governo Lasso […]. Então foi necessário estabelecer um mandato-tampão. E, de alguma forma, parecia, nesse contexto eleitoral que se produziu em 2023, que essa polarização seria amenizada”, explica.

Ele afirma que a expectativa de arrefecimento da polarização tinha como base a nova configuração do Congresso estabelecida por Noboa, quando, pela primeira vez, a direita convidou os correístas para integrar a coalizão de governo. Segundo ele, isso se manteve até abril de 2024, quando ocorreu o incidente da invasão da embaixada do México para prender o ex-vice-presidente equatoriano Jorge Glas, que estava refugiado na missão diplomática.
“Esse momento é o momento em que o correísmo rompe com o governo Noboa, afinal de contas foi decisão da polícia e, consequentemente, ordem do Ministério do Interior, e isso faz com que essa polarização se restaure.”
No entanto ele acrescenta que há uma diferença no cenário, uma vez que González conseguiu captar parte da oposição que não é correísta, criando um cenário de polarização mais amplo, que não se limita a correístas e anticorreístas, mas sim a governo e oposição.
Bandeiras do México e Equador dispostas sobre mesa - Sputnik Brasil, 1920, 03.02.2025

“Não sei se hoje a gente pode dizer que essa polarização se constitui integralmente nessa divisão correísmo-anticorreísmo, mas talvez em uma oposição atual ao governo, que de fato tem tido uma gestão bastante problemática dos principais desafios do país, seja na segurança, seja na economia, a crise energética que teve […] no último trimestre do ano passado…”, afirma.

Adriano Cerqueira, professor de relações internacionais do Ibmec Belo Horizonte, afirma ao podcast Mundioka que a surpresa do segundo turno indica uma mudança na comunicação política, que cada vez mais é feita pelas redes sociais.
“Se antes a transmissão de informações, as últimas notícias vinham pela imprensa, a pessoa tinha que ler, aí conversar com o amigo, com o vizinho, enfim, hoje a coisa é mais instantânea. Isso gera uma possibilidade de mudanças de última hora, dependendo de como quem está disputando a política lá está usando as redes sociais”, afirma.
Entretanto, ele acrescenta que os resultados divergentes das pesquisas também podem ser fruto de problema metodológico dos institutos.
“O ideal é que pesquisas feitas no mesmo período — e se são bem feitas, os resultados dentro das respectivas margens de erro de cada pesquisa — os resultados possam bater […], mas o que a gente vê, muitas vezes, são resultados bastante disparatados, que, mesmo usando a margem de erro, não chegam a coincidir.”
Polícia monta guarda na entrada da penitenciária onde o ex-vice-presidente Jorge Glas está preso, em Guayaquil, Equador, 6 de abril de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 01.12.2024

O especialista destaca que a polarização no Equador tem um elemento diferente da do Brasil, por conta da proximidade do país com os EUA, o que faz com que seja mais explorada politicamente.

“Se aqui no Brasil já vivemos um ambiente de forte polarização de esquerda e direita e em relação à própria presença americana, à influência dos EUA aqui no Brasil, imagina lá no Equador, que é muito mais próximo [dos EUA], perto do canal do Panamá, [com] a economia dolarizada há vários anos […]. Ou seja, a importância dos EUA no dia a dia do equatoriano é muito maior do que aqui no Brasil, e isso alimenta tanto o sentimento de aproximação quanto o de rejeição aos EUA.”

Segundo Cerqueira, esse cenário foi muito bem explorado por todos os lados, levando “esse quadro bem polarizado para o segundo turno”.
Por sua vez, Nicodemos aponta que é preciso manter os olhos abertos em relação ao Equador, porque ainda que “hoje seja considerado o país menos relevante na América do Sul” (em termos de cooperação), já foi por muito tempo “um polo onde a convergência da cooperação sul-americana se estabelecia”.
“A sede da Unasul [União de Nações Sul-Americanas] foi no Equador. Então o Equador tinha, principalmente na gestão do Correa, esse papel que, de alguma forma, ajudava a unir uma região que hoje está cada vez mais fragmentada e separada.”
Segundo Nicodemos, caso Noboa vença o segundo turno, é provável que não se alinhe automaticamente a Donald Trump, mas sim avalie, conforme a conveniência, e fique do lado de “quem pagar a conta”.

“E, no caso da González, a gente tem perspectivas um pouco mais positivas e proativas, principalmente em cooperação com os governos progressistas da região. Então acho que esse é, talvez, o meu prognóstico hoje. […] Vamos ver como os próximos meses vão andar, porque até abril muita coisa pode mudar, levando em conta a história recente do Equador”, conclui o analista.

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Fonte: sputniknewsbrasil

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