Congo: o legado de violência e sofrimento da colonização belga


Franco Alencastro, mestre em relações internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e responsável pelo podcast 54 países, participou do podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, e abordou as nuances da exploração desmedida.
Ao ser questionado sobre as particularidades da colonização belga no Congo, Alencastro explicou que, ao contrário da maioria das colônias africanas, o Congo foi um “projeto pessoal” do rei Leopoldo II, da Bélgica.
“O caso do Congo, da colonização do Congo pela Bélgica, é um pouco diferente do que a gente normalmente pensa por colonização”, destacou, enfatizando que o Congo não era uma colônia formal da Bélgica, e sim uma propriedade privada do monarca.

“O Congo, na verdade, era como se fosse uma propriedade particular de uma única pessoa. Ele [o país] não pertencia à Bélgica, era uma sociedade, era um grupo pertencente ao Leopoldo, como se fosse uma fazenda, um grande fazendão pertencente a ele”, explicitou.

Leopoldo II, à frente do Estado Livre do Congo, criou a fachada de “organização filantrópica” com a Associação Internacional do Congo, que supostamente visava promover o livre comércio e combater a escravidão.

“A Associação Internacional do Congo era, em essência, oficialmente uma organização filantrópica para ajudar a promover a civilização, o livre comércio e o combate à escravidão“, explicou Alencastro.

Tropas do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) chegam para assumir posições ao redor da baía de Luanda abandonadas por tropas coloniais portuguesas durante a guerra por independência. Angola, 10 de novembro de 1975 - Sputnik Brasil, 1920, 21.02.2025

Porém, essa máscara de benevolência ocultava uma exploração brutal, na qual a população local era forçada a trabalhar em plantações de borracha e marfim sob condições desumanas. O historiador alertou para o contraste entre a imagem pública e as realidades por trás da cortina: “Grande parte do território do Congo foi loteado para empresas particulares, muitas das quais o proprietário principal era o rei Leopoldo, mas que tinham também outros acionistas poderosos na Europa.”
As atrocidades cometidas no Congo, segundo Alencastro, foram responsáveis pela morte de milhões de pessoas.
“A estimativa é de que tenha morrido algo entre 8 e 20 milhões de pessoas no Congo durante esses praticamente 30 anos em que ficou sob o controle do Estado Livre do Congo, capitaneado pelo rei Leopoldo”, afirmou o historiador.
O especialista também mencionou as campanhas que revelaram esses abusos, como o trabalho do jornalista britânico Edmund Morel e do diplomata Roger Casement, que expuseram a exploração e os crimes contra a população congolesa.
“Ele percebeu que o comércio entre a Bélgica e o Estado Livre do Congo era estranho. Como um país pode importar só armas e correntes?”, comentou Alencastro, referindo-se à análise de Morel, que desencadeou uma campanha global por justiça.
Tropas do governo congolês são posicionadas fora de Goma, República Democrática do Congo, 24 de janeiro de 2025, enquanto rebeldes do M23 estão se aproximando da cidade - Sputnik Brasil, 1920, 25.01.2025

Alencastro também refletiu sobre a natureza de um possível genocídio no Congo, ponderando: “O genocídio é uma tentativa de exterminação de um povo. No caso do Congo, não havia uma política de exterminar o povo congolês, mas sim explorar a população para extrair riquezas.”
Apesar de a intenção do rei Leopoldo não ser exterminar o povo, as consequências foram devastadoras para a população local, que sofreu com trabalho forçado, tortura, mutilações e abusos imensos.
O impacto dessa violência colonial, segundo Alencastro, ainda reverbera no Congo contemporâneo. “Hoje em dia, Cabo Verde tem um PIB [produto interno bruto] per capita oito vezes maior do que a República Democrática do Congo“, destacou, mencionando que o legado da colonização contribuiu para o subdesenvolvimento do país.
Além disso, apontou os fatores internos, como a corrupção sob o regime do ex-presidente Mobutu Sese Seko, que dificultou ainda mais o desenvolvimento do Congo após a independência. “Mobutu conseguiu amealhar uma fortuna de bilhões antes de ser derrubado em 1997“, afirmou o especialista.
Hoje, apesar de a Bélgica participar de missões de paz na África, como a Missão das Nações Unidas para a Estabilização na República Democrática do Congo (Monusco), ela é frequentemente criticada por sua atuação colonial e seu envolvimento em conflitos regionais.
Logo da emissora Sputnik - Sputnik Brasil
Acompanhe as notícias que a grande mídia não mostra!

Siga a Sputnik Brasil e tenha acesso a conteúdos exclusivos no nosso canal no Telegram.

Já que a Sputnik está bloqueada em alguns países, por aqui você consegue baixar o nosso aplicativo para celular (somente para Android).

Fonte: sputniknewsbrasil

Anteriores Alemanha libera mais € 3 bilhões para Kiev; total já chega a € 7 bilhões somente em 2025
Próxima Ataque ucraniano a Sudzha descredibiliza Zelensky na mesa de negociações, dizem analistas