Por décadas, Toyota Corolla e Honda Civic travaram duelos épicos. E, até pouco tempo atrás, os sedãs médios mais vendidos no Brasil ainda se digladiavam pela vitória no povoado campo de batalha — que um dia já teve uma dezena de combatentes.
A Honda foi parar nas trincheiras ao deixar de produzir localmente o Civic e trazê-lo importado com uma tecnologia híbrida interessantíssima, porém muito cara. Do outro lado, a Toyota segue atirando. Agora as conterrâneas japonesas disputam outro território: o de SUVs médios.
Em novembro do ano passado, o Honda ZR-V trouxe a artilharia do “SUV do Civic”, por usar a moderna plataforma do irmão. O Toyota Corolla Cross já está na linha de frente desde 2021 com o nome famoso, espaço conquistado e, agora, visual e pacote renovados. Qual deles cumpre melhor a missão?
Infelizmente não dá para dizer que há uma disputa entre Corolla Cross e ZR-V. Não em vendas, ao menos. É um verdadeiro massacre do Toyota. No acumulado deste ano, tem quase sete vezes mais emplacamentos que o Honda — 14 mil unidades contra pouco menos de 2 mil. Vale ressaltar que o ZR-V tem somente oito meses de mercado, mas ainda não pegou tração.
Um dos fatores principais para essa diferença, com certeza, está na oferta. O ZR-V é vendido em versão única, Touring, com motor 2.0 aspirado só a gasolina e preço alto: R$ 214.500 (a conta pode subir dependendo da cor). A Honda sentiu o golpe e, na tentativa de alavancar as vendas, tem feito algo que quase nunca faz: está oferecendo o ZR-V com até R$ 20 mil de desconto em algumas concessionárias.
O Corolla Cross parte de R$ 164.990 e chega a R$ 197.790 na opção mais cara, GR-S, também 2.0 aspirado (mas flex). Para este comparativo, vamos considerar a configuração sem apelo esportivo, XRX, de R$ 191.790.
Vale lembrar que é o Jeep Compass que domina (com larga vantagem) o território dos SUVs médios. Lançado em 2016, conquistou a soberania pelo sétimo ano consecutivo em 2023. E mais: por duas vezes, em 2017 e 2018, reinou como SUV mais vendido em âmbito geral, superando modelos compactos e mais baratos. Em 2024, a supremacia continua.
“Ah, mas o Compass custa até R$ 240 mil”, você pode pensar. Sim, é verdade. Porém, o SUV da Stellantis tem uma gama de versões e motores mais ampla (que começa em R$ 180 mil), motor turbo e alguns equipamentos extras. Sem falar no status que a marca Jeep pode conferir ao comprador. Quase uma Otan…
Como mencionado anteriormente, o Honda ZR-V traz apenas o motor 2.0 aspirado que só bebe gasolina. São 161 cv de potência e 19,1 kgfm de torque. Com câmbio automático CVT e sem injeção direta de combustível, o desempenho do SUV é moroso. Tanto nas acelerações quanto nas retomadas, é preciso ter paciência. Em nossa pista de testes, o Rota 127 Campo de Provas, o Honda precisou de longos 11,1 segundos para ir de 0 a 100 km/h.
Não que o Corolla Cross seja um caça supersônico, longe disso. Mas o SUV da Toyota, cujo 2.0 foi recalibrado na linha 2025 e agora rende até 175 cv de potência e 20,8 kgfm de torque, cumpriu a mesma marca em 10,2 s, quase 1 segundo a menos. Vale lembrar que o motor Dymamic Force da Toyota também é aspirado, mas, além de já ser flex, possui um sistema inteligente de injeção variável entre direta ou indireta.
As retomadas são mais parelhas. Enquanto o ZR-V precisa de 4,4 s no 40-80 km/h, 5,8 s no 60-100 km/h e 7,4 s no 80-120 km/h, o Corolla Cross faz o mesmo em 4,3 s, 5,4 s e 6,8 s, respectivamente. Para uma comparação mais justa, ambos foram testados com gasolina, visto que o ZR-V não permite o uso de etanol.
O comportamento linear, sem arroubos, de ambos os SUVs médios se deve muito ao câmbio automático continuamente variável, que, digamos, tira a graça e a esperteza dos motores de 2 litros — sem contar o ruído que entra no interior quando o acelerador é pressionado com certo vigor. E olha que, no caso do Corolla Cross, há uma engrenagem na primeira marcha a fim de agilizar as arrancadas e o comportamento da caixa.
Tudo bem que são carros familiares e sem pretensão esportiva alguma, porém poderiam dar mais prazer de dirigir a quem vai atrás do volante. Ao menos o consumo é satisfatório. O Honda, que só bebe gasolina, faz 10,2 km/l (cidade) e 12,1 km/l (estrada). O Toyota, com o mesmo combustível, se mostra um pouco mais econômico: 11,6 km/ (urbano) e 13,3 km/l (rodoviário).
A diferença mais gritante está no rodar. A Honda tentou deixar o acerto de suspensão menos duro, mas ainda é rígido se comparado ao do Toyota, que é mais macio e tem uma dinâmica bem parecida com aquela que consagrou seu homônimo sedã, com ajustes voltados especialmente ao conforto.
O ZR-V traz refinamento no conjunto traseiro com suspensão multilink (o Corolla Cross usa um simples eixo de torção) e as rodas menores, aro 17, com pneus de perfil alto, suavizam o movimento. O ZR-V também passa a impressão de ter uma direção mais calibrada e assertiva que a do Toyota. Se você quer conforto total, o Corolla Cross é a pedida.
Há três anos na luta e com algumas marcas de guerra, o Toyota passou pela primeira “recauchutagem” recentemente. A reestilização na linha 2025 deu ao Corolla Cross um novo estilo visual, além de corrigir algumas soluções muito criticadas do passado, como o freio de estacionamento (antes no pé e agora eletrônico, por tecla).
Agora, o SUV médio traz também quadro de instrumentos totalmente digital e porta-malas com acionamento elétrico para abertura e fechamento (o que o ZR-V não tem, aliás). O resultado é um pacote mais moderno para tentar diminuir o contingente do Compass.
Quanto ao espaço interno, apesar de o ZR-V ter 2 centímetros a mais de entre-eixos do que o Corolla Cross (2,66 metros x 2,64 m), mas os ocupantes traseiros desfrutam de boa área para cabeça e pernas nos dois SUVs. Os assentos centrais são mais estreitos para se acomodar. Em compensação, o túnel central é baixo. No porta-malas, vitória do Corolla Cross: 440 litros contra 389 l.
Um quesito no qual o Honda leva vantagem é o acabamento. A dupla de SUVs adota um tom mais claro nos painéis e bancos, para passar uma mensagem de mais requinte. Só que, no ZR-V, esse padrão vem acompanhado de materiais melhores, mais vistosos, e está em quase todo o interior.
Quanto à central multimídia: empate. Apesar de as duas telas terem 9 polegadas, serem simples de mexer e oferecerem boas funções, não fazem jus ao preço dos carros. As bordas são grosseiras e os grafismos, simplórios.
Já o arsenal eletrônico dos SUVs é bem fornido, especialmente em termos de segurança. O ZR-V, por exemplo, traz oito airbags, contra sete do Corolla Cross (o Honda tem bolsa extra de joelho para o passageiro), e o sistema Sensing, que agrega farol alto automático, controle de cruzeiro adaptativo (ACC), sistema de frenagem para mitigação de colisão e evasão de pista e também de permanência na faixa de rolagem com correções no volante.
O Corolla Cross traz os mesmos itens e ainda o alerta de ponto cego. O Honda, por sua vez, tem uma câmera embaixo do retrovisor direito que reproduz a imagem da lateral do carro quando o motorista liga a seta para a direita, justamente para cobrir o ponto cego. Atrapalha um pouco se você está usando o GPS espelhado, já que a tela “some” enquanto a seta está acionada. Além disso, peca na resolução. É possível desativar manualmente o sistema.
Já o retrovisor esquerdo traz o espelho convexo e os objetos surgem nele mais perto do que realmente estão. Ou seja, é melhor olhar para o retrovisor central se quiser ter certeza da localização exata dos automóveis ao redor.
O duelo entre Civic e Corolla quase sempre foi dominado pelo sedã da Toyota, mas o Honda, em alguns momentos, tinha poder de fogo para conseguir alguns triunfos. O ZR-V até tem predicados, como espaço interno, acabamento e equipamentos de segurança.
Mas nem o prestígio da marca parece cooperar para o sucesso de um carro que tem um custo de propriedade (consumo, peças e revisões) mais alto e desempenho pior. Já o Toyota Corolla Cross cumpre a missão de derrotar o modelo de sua marca arquirrival com sobras, mas ainda tem um longo caminho para vencer a guerra e ser o zero um do segmento. Especialmente porque agora, além do Compass, tem a concorrência dos SUVs chineses.
O Toyota Corolla Cross segue o legado do sedã homônimo e triunfa contra o Honda ZR-V. Os SUVs estão próximos em quesitos como espaço, consumo e equipamentos. Preço, custo de propriedade, desempenho e um motor só a gasolina depõem contra o ZR-V. O Corolla Cross conserta erros do passado e agora vai em busca do líder, Compass.
*Cesta de peças: Retrovisor direito, farol direito, para-choque dianteiro, lanterna traseira direita, filtro de ar (elemento), jogo de quatro amortecedores e pastilhas de freio dianteiras.
**Seguro: O valor é uma média entre as cotações das principais seguradoras do país com base no perfil padrão de Autoesporte, sem bônus. O levantamento foi feito pela Minuto Seguros.
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Fonte: direitonews