(FOLHAPRESS) – As Forças Armadas se preparam para realizar pela primeira vez na sua história uma checagem paralela da totalização dos votos da eleição.
A verificação sobre a contagem dos votos é um dos processos da fiscalização das eleições.
Qualquer pessoa pode coletar os boletins de urna e checar com os dados disponibilizados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na internet.
A novidade neste ano é o plano das Forças Armadas de realizarem a checagem, pela primeira vez. A justificativa, segundo militares ouvidos pela reportagem, é a inclusão da instituição na lista de entidades fiscalizadoras do pleito.
A criação do plano de conferência da totalização segue o que o TSE define em resoluções, segundo relatos de generais e coronéis com conhecimento do assunto.
A checagem de boletins de urna não é o principal pleito do Ministério da Defesa nas negociações com o TSE sobre as regras eleitorais. A principal demanda dos militares é pelo projeto-piloto do novo teste de integridade.
Na noite desta terça (13), o TSE atendeu o pleito do Ministério da Defesa. A corte aprovou uma resolução que determina que de 32 a 64 das 640 urnas que devem ser auditadas devem usar a biometria de eleitores reais.
Como a Folha de S.Paulo mostrou, o projeto inicial de conferência paralela feito pelas Forças Armadas envolve a coleta de 385 boletins de urna, com militares tirando fotos dos papéis fixados nas seções eleitorais. A partir daí, deve ocorrer a checagem para conferir se os números registrados nos documentos são os mesmos que chegam para a contagem do TSE.
O acordo que havia sido inicialmente fechado entre o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, e os militares envolvia disponibilizar os dados divulgados pelo tribunal na internet de forma bruta para as entidades fiscalizadoras. A informação foi confirmada à Folha de S.Paulo por dois militares e um integrante do tribunal com conhecimento do assunto.
A revelação de detalhes da checagem paralela desagradou parte da cúpula do TSE, e o tribunal divulgou uma nota para negar que tenha feito um acordo para dar “acesso diferenciado” de dados das eleições às Forças Armadas.
Em reação, Moraes cancelou uma reunião com o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, que era negociada para acontecer nesta terça-feira (13). O assunto que seria tratado era o projeto piloto do novo teste de integridade –a principal demanda dos militares para o processo eleitoral.
O Ministério da Defesa também divulgou nota. A pasta disse que as Forças Armadas “não solicitaram qualquer permissão de acesso diferenciado em tempo real aos dados enviados para a totalização do pleito eleitoral pelos Tribunais Regionais Eleitorais”.
Entenda como será feita a checagem paralela da contagem dos votos e o que dizem os envolvidos.
Como as Forças Armadas planejam fazer a checagem da contagem dos votos?
A conferência da totalização vai envolver a coleta de boletins de urna e a checagem dos dados com os números divulgados pelo TSE durante a contagem dos votos.
Em plano inicial, as Forças Armadas decidiram enviar militares para coletar 385 boletins de urna espalhados pelo Brasil. Pelas contas deles, a amostragem para estimar o resultado garantiria 95% de confiabilidade, embora exista receio entre especialistas de que haja divergência nos números por falhas metodológicas.
O objetivo principal é verificar se os dados que chegam ao TSE não passam por nenhuma modificação e são registrados de forma correta na contagem final dos votos.
Os militares conseguem fazer a checagem mesmo sem o TSE disponibilizar os dados brutos?
Sim. Mesmo com o recuo no acordo entre o tribunal e o Ministério da Defesa, as Forças Armadas ainda podem coletar os dados da contagem dos votos no site do TSE. Interlocutores dizem que os planos para essa checagem estão mantidos.
Trata-se do mesmo processo de conferência já feito por outras entidades ligadas à transparência eleitoral. Além disso, qualquer cidadão pode coletar os boletins de urna e realizar sua própria checagem.
O que é o boletim de urna?
Documento emitido em cada seção eleitoral após a conclusão da votação, apontando o total de votos por candidato, além de dados sobre comparecimento às urnas, identificação da seção eleitoral e de horários da votação no local. Uma das cópias do boletim é colada na porta da seção eleitoral. Há um QR Code no documento para chegar se o papel divulgado nas seções eleitorais tem a mesma informação daquele que é considerado pela Justiça Eleitoral na totalização dos votos. Esse documento ficava disponível no site do TSE em até três dias, mas na eleição desse ano será divulgado em tempo real durante a totalização.
Quais eram os termos do acordo?
A pedido das Forças Armadas, o TSE iria entregar a todas as entidades fiscalizadoras –e não somente aos militares– o mesmo arquivo de dados brutos compilados que abastecerá a divulgação da contagem dos votos no site do tribunal.
Não se trata, portanto, de envio de dados dos TREs para as Forças Armadas, como foi mencionado pelo TSE e Ministério da Defesa.
A proposta visava somente facilitar o trabalho das entidades fiscalizadoras, que não precisariam acessar a internet para coletar os dados. Na visão dos militares, o envio dos dados brutos iria somente acelerar o trabalho de checagem.
O que diz o TSE?
Em nota, o TSE negou que tenha fechado um acordo para dar “acesso diferenciado” aos dados enviados pelos Tribunais Regionais Eleitorais.
“O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) informa, em relação à apuração das eleições 2022, que não houve nenhuma alteração do que foi definido no primeiro semestre, nem qualquer acordo com as Forças Armadas ou entidades fiscalizadoras para permitir acesso diferenciado em tempo real aos dados enviados para a totalização do pleito eleitoral pelos TREs, cuja realização é competência constitucional da Justiça Eleitoral”, disse.
Apesar da negativa do tribunal, a Folha de S.Paulo não mencionou nos textos sobre o tema a liberação de dados diretamente dos TREs para as Forças Armadas ou demais entidades fiscalizadoras.
O TSE ainda afirmou que a contagem dos votos, por meio dos boletins de urnas, é possível “há várias eleições”. Neste ano, o tribunal ainda decidiu disponibilizar os documentos pela Internet, logo após o encerramento da votação, para “acesso amplo e irrestrito de todas as entidades fiscalizadoras e do público em geral”.
“Independentemente dessa possibilidade, como ocorre há diversas eleições, qualquer interessado poderá ir às seções eleitorais e somar livremente os BUs (boletins de urna) de uma urna específica, de dez, de trezentas ou de todas as urnas”, concluiu a corte.
O que diz o Ministério da Defesa?
O Ministério da Defesa divulgou nota na noite de segunda (12) em sintonia com o TSE. A pasta negou que tenha solicitado acesso diferenciado aos dados enviados pelos TREs.
“As Forças Armadas não solicitaram qualquer permissão de acesso diferenciado em tempo real aos dados enviados para a totalização do pleito eleitoral pelos Tribunais Regionais Eleitorais (TRE), cuja realização é competência constitucional da Justiça Eleitoral”, disse.
A pasta ainda afirmou que as Forças Armadas têm atuado com base em resolução do TSE como “uma das entidades fiscalizadoras, legitimadas a participar das etapas do processo de fiscalização do sistema eletrônico de votação”.
“Por fim, cabe ressaltar que o Ministério da Defesa e as Forças Armadas não demandam exclusividade e tampouco protagonismo em nenhuma etapa ou procedimento da fiscalização do sistema eletrônico de votação e permanecerão pautando a sua atuação pela estrita observância da legalidade, pela realização de um trabalho técnico e pela colaboração com o TSE”, concluiu.
O que é o teste de integridade?
Feito no dia das eleições, o teste verifica se os votos são corretamente registrados nas urnas eletrônicas. Em eleição simulada que é filmada, são digitados nas urnas eletrônicas votos previamente feitos em cédulas de papel. A ideia é comparar o resultado da eleição física e digital.
Este procedimento é feito em locais indicados pelos TREs (Tribunais Regionais Eleitorais), com urnas de seções sorteadas ou escolhidas na véspera da eleição.
O principal pedido dos militares é usar a biometria de eleitores reais para acionar a urna que será auditada, como forma de evitar fraude no teste. Para isso, a auditoria precisa ser feita nos locais de votação, com a biometria de eleitores voluntários. O TSE decidiu ceder ao pedido das Forças Armadas e aplicar a biometria em até 10% das 640 urnas que serão avaliadas neste ano.