Convênio entre Prefeitura e Liceu é discutido com a população


André Bueno | REDE CÂMARA SP

Audiência Pública da Comissão de Educação, Cultura e Esportes desta sexta-feira (10/3)

MARCO CALEJO
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A parceria entre a Prefeitura da capital paulista e o colégio particular Liceu Coração de Jesus esteve na pauta da Audiência Pública da Comissão de Educação, Cultura e Esportes, na manhã desta sexta-feira (10/3). Para evitar a suspensão das atividades da instituição, localizada na região central da cidade, o governo municipal assumiu o pagamento das mensalidades de 500 alunos dos ensinos Infantil e Fundamental.

O termo, assinado pelo Executivo no início deste ano, prevê o repasse mensal de R$ 388,3 mil pelas 500 vagas e R$ 139,4 mil pelo aluguel do espaço. Durante a audiência, foram registradas considerações favoráveis e contrárias ao acordo. O debate foi conduzido pela presidente da Comissão de Educação, a vereadora Edir Sales (PSD).

A audiência foi solicitada por meio do requerimento apresentado pelo vereador Celso Giannazi (PSOL), integrante do colegiado. O parlamentar explicou que o convênio foi firmado em dezembro passado. Giannazi reconhece a importância e a qualidade do Liceu, porém ele afirma que a parceria é inconstitucional.

“A Constituição Federal proíbe o repasse de verba pública para escolas particulares. Verba pública é para escola pública”, disse Celso Giannazi. “Temos também a questão do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica). A transferência de recurso público para escola particular faz com que a cidade de São Paulo perca transferências do Fundeb”.

Vice-presidente da Comissão, o vereador Dr. Nunes Peixeiro (MDB) defende o convênio. Para ele, é fundamental priorizar a educação dos estudantes. “São 500 crianças. A procura foi tão grande, que as vagas se esgotaram em apenas uma semana. Se teve essa procura tão grande, é porque houve necessidade”.

Membro do colegiado, o vereador Coronel Salles (PSD) também avalia de forma positiva a parceria entre o governo e o colégio Liceu, já que é importante garantir  ensino na cidade. “A questão não é o Liceu, a questão não é a Prefeitura, a questão são as nossas crianças. Um bairro (Campos Elíseos) depauperado por uma ausência do Estado gigantesca”.

Para a vereadora Elaine do Quilombo Periférico (PSOL), que também integra a Comissão, o Liceu tem condições para oferecer educação de qualidade e beneficiar a comunidade da região. No entanto, a parlamentar afirma que “não podemos tirar o foco aqui de qual é a função do Estado, qual é a função do município e a função dos vereadores, que é olhar para esses contratos e essas parcerias”.

Outro integrante do colegiado, o vereador Eduardo Suplicy (PT) fez algumas considerações. De acordo com o parlamentar, é necessário que os órgãos públicos analisem a legalidade do acordo. “Eu acho muito importante que o Ministério Público e a Defensoria Pública verifiquem se está tudo regular com a aplicação destes recursos”.

Participaram ainda da audiência as vereadoras Cris Monteiro (NOVO), Luana Alves (PSOL), Silvia da Bancada Feminista (PSOL), além dos vereadores Fabio Riva (PSDB) e Professor Toninho Vespoli (PSOL). Também contribuíram com o debate o deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL-SP) e a deputada federal Luciane Cavalcante (PSOL-SP).

Órgãos públicos

Registraram presença profissionais do MPSP (Ministério Público do Estado de São Paulo), da Defensoria Pública do Estado de São Paulo e do TCM-SP (Tribunal de Contas do Município de São Paulo). O promotor de Justiça João Paulo Faustioni e Silva considera relevante a realização da audiência, para que os órgãos públicos possam ouvir as opiniões e coletar informações para analisar o caso.

“Nossa preocupação é sempre a fiscalização da ordem constitucional e, portanto, o fortalecimento da escola pública e da destinação de recursos públicos para uma escola que de fato tenha gestão pública, toda a sua concepção e estrutura como deve ser”, falou o promotor de Justiça.

O defensor público Gustavo Samuel da Silva Santos é coordenador do Núcleo Especializado da Infância e Juventude. Ele destacou a necessidade de controlar os gastos públicos e manter no contrato a garantia da “diversidade do pensamento e da própria identidade”.

“Sobre o Liceu, especificamente, eu acho que seria muito leviano o Núcleo da Infância e Juventude fazer alguma manifestação. Nós lemos os documentos da Prefeitura e do Liceu, mas não temos ainda uma opinião fechada sobre o tema”, disse o defensor público.

Representando o TCM-SP, Adriano Cremonesi se colocou à disposição. “O Tribunal de Contas está à disposição desta Casa para o que for preciso, para assessorá-los no que for preciso”.

Sociedade civil

A Audiência Pública também ouviu a opinião de representantes da sociedade civil e de entidades. Ao longo do debate foram registradas manifestações favoráveis e contrárias ao convênio. Iézio Silva, da Associação Pró Campos Elíseos, defendeu a parceria. “O nosso objetivo, como morador e representante de todas as associações do centro, é brigar para que esta parceria permaneça. Que estes alunos tenham as mesmas oportunidades que os alunos de bairros chiques”.

Em nome da Associação Geral do Centro, Sônia Domingues lembrou que o colégio tem 137 anos, e que a informação da possível suspensão das atividades gerou apreensão entre os moradores locais. Ela também é favorável ao convênio. “Uma escola daquele tamanho, que ocupa uma quadra inteira, vazia, em uma região em que nós estamos, carente de segurança, de educação. Quem conhece, sabe do que estou falando”.

Já Rosana Capputi Borges, do Sinesp (Sindicato dos Especialistas de Educação do Ensino Público Municipal de São Paulo), não concorda com o acordo. “Recurso público determina que seja utilizado para escola pública. Portanto, nós temos também a lei do Fundeb, que se essas crianças foram para lá vamos perder recursos públicos e a Prefeitura vai ter que pegar esse dinheiro e tirar de outro lugar”.

A professora Margarida Genofre falou em nome da APROFEM (Sindicato dos Professores e Funcionários Municipais de São Paulo). Ela disse que valoriza as escolas públicas, porém entende que a medida é ilegal e quer investimentos na rede pública de educação. “O que eu sou contra é o desrespeito à Constituição, de repassar verba pública para entidades privadas”.

Colégio Liceu Coração de Jesus

A assessora jurídica do Liceu Coração de Jesus, Claudia Santos, destacou a tradição da escola, fundada há 137 anos. Ela ressaltou ainda que o colégio é uma entidade filantrópica, ou seja, sem fins lucrativos. Claudia também explicou que a partir do convênio assinado, a nomenclatura da instituição foi alterada.

“A escola Liceu que funcionou até dezembro de 2022 é uma outra instituição, salesiana também. O que funciona hoje é EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) Liceu e EMEF (Escola Municipal de Ensino Fundamental) Liceu. Recebeu essa nomenclatura por quê? Porque ela atende alunos da rede pública municipal. Eles são ensinados baseados no currículo da cidade, e não no material salesiano, e tiveram entrada no colégio pelo sistema da Prefeitura”, explicou Claudia.

A assessora jurídica também assegurou a responsabilidade da instituição ao firmar o acordo com o governo municipal. “O Liceu, com sua história de 138 anos, nunca formalizaria um documento, nunca atenderia essas crianças de forma irregular. Nós não temos esse histórico, então não seria agora. O nosso intuito é contribuir com a sociedade e com o bairro”.

Prefeitura

Bruno Lopes Correia, secretário adjunto da Secretaria Municipal de Educação, esclareceu alguns pontos discutidos na audiência. Segundo ele, o acordo firmado com o Liceu foi debatido ao longo do segundo semestre de 2022, garantindo a transparência do convênio.

“Não foi uma opção salvar ninguém de nada. A Prefeitura não é um banco”, disse Bruno, que afirmou que o governo se aprofundou nos estudos para analisar a realidade do colégio antes de firmar acordo.

De acordo com o secretário adjunto, o modelo de gestão do Liceu Coração de Jesus segue os critérios utilizados na administração das escolas públicas municipais. “Acessórios de apoio, como alimentação escolar, uniforme, material escolar e transporte a todos os estudantes, todos eles seguem exatamente o mesmo modelo que a Prefeitura oferece em sua rede”.

Bruno também explicou que o plano de educação do município prevê escolas com ensino em tempo integral. Segundo ele, essa é uma demanda da região central da cidade. “Não há nenhuma escola na região, municipal ou estadual, de tempo integral na região. Isso é uma demanda, um clamor da população”.

O servidor esclareceu que a Prefeitura da capital não deixou de investir em outros setores em detrimento do acordo com o Liceu, e que o convênio está dentro da legalidade. De acordo ainda com Bruno, os recursos destinados ao colégio são do próprio governo municipal.

A íntegra da Audiência Pública está disponível no vídeo abaixo:

 

 

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