‘Ataque do Irã foi muito útil para Netanyahu conseguir uma sobrevida no poder’, diz especialista


Em entrevista ao programa de podcast Mundioka, a especialista em relações internacionais da Universidade de Sorocaba (Uniso) e colaboradora do Instituto Brasil-Israel Karina Calandrin comentou que, devido às fortes pressões internas por novas eleições em Israel e à insatisfação popular com o governo, o primeiro-ministro Benjamim Netanyahu se beneficiou do ataque iraniano do último fim de semana.

“O ataque do Irã foi muito útil para Netanyahu”, avalia a especialista. “Para ele foi muito bom, no sentido de conseguir fazer esse tipo de discurso, melhorar um pouco a popularidade, porque as pessoas ficam assustadas, ficam com medo. Então esse tipo de ação tende a unir as pessoas”, declarou.

Com isso, acrescentou ela, Netanyahu conseguiu uma sobrevida no poder. Entretanto, não interessa a ele a guerra com o Irã, afirmou:

“Ele sabe que não tem fôlego político para enfrentar uma guerra com o Irã, está muito enfraquecido. Sabe que não tem um gabinete com o mínimo de competência para lidar com uma guerra com o Irã.”

O temor regional também é grande, ponderou. Já que Irã e Israel não fazem fronteira, uma guerra poderia afetar países como Arábia Saudita, Jordânia, Líbano, Síria e Iraque.
Ao mesmo tempo, apesar das pressões externas para que Israel abra mão de uma ofensiva contra o Irã, Calandrin destacou que o gabinete de guerra do governo israelense integra “figuras muito polêmicas, de extrema-direita, que têm acusação de racismo, que pressionam internamente o governo a seguir o embate com o Irã”.
Calandrin vai além e diz que Netanyahu “está torcendo” para que a pressão do Ocidente para que não haja guerra seja maior do que a pressão interna para uma guerra.

‘Israel não é invencível’

Mestre em economia política internacional e analista de geopolítica, Dominique Marques também conversou com a Sputnik Brasil. Segundo ela, o poderio bélico do Irã, quase todo desenvolvido nacionalmente, não deve ser desprezado, tampouco suas Forças Armadas em termos de pessoal militar:

“Israel está com contingente militar de 177 mil, só que a força especial do Irã passa disso, tem 190 mil, e a força total acho que passa de 600 mil”, comentou.

A integrante do Instituto Brasil-Israel também destacou que, ao longo das últimas décadas, foi construída uma imagem de invencibilidade de Israel, de potência militar, que não é verdadeira.
“Israel não é invencível, não tem superioridade incontestável a todos os países da região. Isso foi construído, é uma imagem que foi construída e tem sido colocada em xeque desde o 7 de outubro, desde que Israel sofreu o ataque do Hamas e agora sofre esse ataque do Irã.”

“Ele está se importando com a posição dele no poder, fugir da cadeia. Então, assim, ele enfrentaria o Irã se precisasse, mas sabe que é melhor não enfrentar, porque causaria um estrago muito maior do que um benefício”, completou.

Marques lembrou que, de acordo com as convenções de Genebra, o Irã esteve “completamente de acordo com o direito internacional humanitário, nesse sentido, de que avisou” com antecedência sobre os ataques de sábado, dando tempo de evacuação de civis e que Israel se defendesse.
Ambas as entrevistadas concordam que os envios de mísseis do Irã em solo israelense foram apenas um recado, uma vez que tais ofensivas foram anunciadas, bem como os armamentos utilizados.

“Foi uma resposta mostrando que ‘olha, se continuar, estou disposto a dar mais um passo, não me cutuque mais’. Foi uma resposta também às próprias pessoas iranianas ali que morreram, que eram figuras importantes para o Irã”, esclareceu Marques.

Independentemente da capacidade militar e potência, ambas avaliam que não interessa ao Irã enfrentar Israel de maneira mais ostensiva, a fim de evitar uma aliança Ocidental muito forte contra ele.

Saia justa dos EUA

O fato de ser ano eleitoral nos EUA coloca o presidente do país, Joe Biden, “em uma saia justa”, salientou Calandrin.

“Ele não está muito bem nas pesquisas eleitorais, então precisa agir de forma que garanta melhores resultados nas eleições e […] de maneira que consiga contemplar vários grupos internos nos Estados Unidos.”

Ela defende que para evitar se envolver em uma guerra, entrar em conflito com outras potências, os EUA farão de tudo para que Israel desista de seguir atacando o Irã.
“Ele [Biden] precisa conter Israel o máximo possível, só que a gente tem que lembrar que mesmo no gabinete de guerra, não estando as figuras mais extremas do governo Netanyahu, o governo por si só já é um governo extremista e há uma pressão para a guerra”, opinou a especialista.
O apoio a Israel faz parte da “praxe da política externa dos Estados Unidos”, mas Biden tem “pressionado muito Netanyahu” para segurar um ataque ao Irã, frisa:

“Biden não pode deixar Israel totalmente de lado, porque existem forças internas nos Estados Unidos e na própria política interna, como o lobby israelense no Congresso estadunidense, que representam forças políticas importantes e que não podem ser ignoradas”, opinou Calandrin.

Dominique também argumentou que para os EUA é estratégico ter um aliado na região, sobretudo pelos insumos energéticos.

‘Não podemos perder o foco nos palestinos’

Calandrin chamou a atenção para o fato de que o atual conflito com o Irã tira o foco da tragédia humanitária que os habitantes da Faixa de Gaza têm enfrentado nos últimos meses.

“A gente tem que lembrar que, hoje, um conflito com o Irã tiraria o foco dos palestinos, que são as principais vítimas. Isso é também uma perda, uma perda muito grande se considerarmos um conflito entre Israel e Irã, porque tira o foco dos palestinos”, lamentou ela.

Quase 34 mil pessoas já morreram por conta do conflito entre Hamas e Israel na Faixa de Gaza, o que já provocou diversas acusações contra Israel por genocídio na região.
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Fonte: sputniknewsbrasil

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