RIBEIRÃO PRETO, SP – Aos 28 anos, Mariane (nome fictício, a pedido) foi diagnosticada com síndrome de burnout. No início, ela achou que aquilo que sentia era apenas preguiça. Acordava desanimada para ir trabalhar e sempre queria ficar mais tempo na cama. Depois de um tempo, entretanto, o cansaço se transformou em exaustão e ela percebeu que não seria possível manter o ritmo.
“O que me deixou mais preocupada foram alguns sonhos que eu tinha. Eu sonhava que tinha perdido alguma reunião ou algum prazo. Eu acordava exausta. Nem na hora do descanso, do sono, eu conseguia descansar a mente, e comecei a ficar preocupada”, afirma Mariane.
No começo da pandemia, Mariane começou a trabalhar como produtora de rádio e TV na mesma empresa onde antes era promotora de vendas, em Belo Horizonte (MG). Com a retomada das atividades presenciais, porém, ela acumulou as funções e isso foi o principal gatilho para o burnout.
Também conhecido como Síndrome do Esgotamento Profissional, o burnout é uma doença laboral, ou seja, uma associada às atividades profissionais.
Segundo Sérgio Dias Guimarães Junior, psicólogo e professor especialista em saúde mental e trabalho, o estresse é uma resposta normal do organismo, principalmente após um longo expediente, seja em seu ofício ou estudos.
Esse estresse, porém, se torna um problema quando não encontra espaço para elaboração, isto é, para ser aliviado e transformado em solução –seja por meio do desabafo com amigos ou mesmo de uma conversa com o chefe.
A “não-elaboração” é estimulada por aquilo que o psicólogo chama de “sociedade do desempenho”, que se caracteriza pela necessidade de ter ótima performance em todas as atividades cotidianas. Essa pressão vem tanto dos indivíduos quanto das organizações.
A cobrança constante, associada à alta concorrência que costuma ser estimulada dentro das empresas, faz com que os funcionários estejam sempre insatisfeitos com a sua produtividade.
De acordo com o psicólogo Wagner de Lara Machado, professor da PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul) e fundador da Neuroeconomics, por ser um problema relacionado ao trabalho, não se deve esperar que as soluções sejam apenas individuais.
Segundo ele, existem quatro medidas que as empresas devem tomar que são capazes de diminuir o nível de estresse dos trabalhadores.
A primeira é deixar claro para os colaboradores quais são as suas funções, quais as expectativas da companhia em relação a ele e de que maneira será avaliado. A segunda é manter uma comunicação clara, principalmente entre chefes e subordinados. A terceira é envolver os trabalhadores nas tomadas de decisões da empresa, em especial nas que interferem na rotina dos funcionários.
Por último, é importante que a empresa esteja atenta a casos de assédio moral, de gênero, sexual e étnico-racial, além de estabelecer uma linha segura para denúncias por parte dos funcionários.
Apesar do estresse laboral ser um problema que deve solucionado em uma parceria entre a instituição e seus funcionários, existem algumas medidas que os indivíduos podem tomar para diminuir a tensão e deixar a rotina menos extenuante.
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SEU PROBLEMA NÃO É INDIVIDUAL
A sensação de culpa é um dos sentimentos mais comuns associados à síndrome do esgotamento profissional. Os trabalhadores se sentem mal por não conseguirem fazer mais do que o possível em um dia de trabalho e essa se torna uma fonte contínua de tensão.
De acordo com psicólogos, entender que o estresse profissional é um problema coletivo –causado pela necessidade constante de ter um bom desempenho e pela concorrência generalizada– e deixar de lado a sensação de culpa pelas falhas da empresa é a principal maneira de aliviá-lo.
Ao lado da psicoterapia, esse foi um passo importante para Mariane. “Depois que eu percebi isso, eu consegui levar com mais tranquilidade. Não é um problema meu, e, sim, do sistema”.
TENHA UMA REDE DE APOIO EM SEU TRABALHO
Segundo os especialistas, a sensação de solidão é outra característica comum das pessoas que desenvolvem estresse crônico laboral. Ter colegas com quem seja possível compartilhar frustrações é uma das maneiras mais fáceis de aliviar esse estresse.
De acordo com eles, desabafar com colegas, superiores e com o RH, quando possível, é um modo de perceber que as dificuldades não são individuais e, muitas vezes, encontrar soluções para os problemas.
Isso também foi essencial para Mariane. Depois do diagnóstico, ela conversou com seus superiores e eles concordaram que não seria possível que ela continuasse acumulando funções.
PROCURE SIGNIFICADO
Encontrar um significado para o trabalho também pode ser uma maneira de tornar a rotina mais estimulante. De acordo com os profissionais, a falta de propósito é uma grande fonte de frustração entre os trabalhadores.
Reconhecer o valor das atividades que desenvolve e do produto final da empresa pode tornar o trabalho mais prazeroso, dizem. Caso não seja possível, buscar um emprego que faça mais sentido pode ser uma boa saída.
PROCURE ATIVIDADES PRAZEROSAS E REDESENHE SEU FLUXO DE TRABALHO
Outra sugestão dada pelos especialistas é inserir na rotina atividades que dão mais prazer e dar prioridade a elas.
Essa busca deve ser ativa. Muitas vezes algo que poderia dar prazer passa despercebido, sem que o trabalhador consiga aproveitar.
Quando possível, é importante reorganizar a rotina de maneira que sempre haja espaço para essas atividades “” como tomar café com um colega. Essa é uma maneira de trazer mais valor para o trabalho.
TENHA MOMENTOS DE LAZER E AUTOCUIDADO FORA DO EXPEDIENTE
Apesar da característica laboral do estresse, ter momentos de lazer fora do trabalho é essencial para ter alívio.
De acordo com Guimarães, o autocuidado não deve ser negligenciado. Isso não significa apenas um momento para cuidar da pele ou ir à academia, mas qualquer compromisso voltado para o próprio bem-estar.
Essas atividades precisam ganhar um espaço na agenda, sejam elas caminhar no parque ou ter um tempo de diversão e brincadeiras com os filhos. O psicólogo ainda destaca que a mesma tarefa nem sempre vai funcionar para todo mundo e cada indivíduo deve entender o que é melhor para si.
Sempre que necessário, é importante procurar ajuda de um profissional, como um psicólogo. Foi assim que Mariane notou que aquilo que sentia não era normal e percebeu que deveria mudar sua rotina.