Apesar de ‘remédio amargo’, energia solar segue atrativa no Brasil, dizem analistas


Especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil acreditam que a proposta acaba por beneficiar as empresas distribuidoras de energia e pode desestimular os produtores domiciliares, que são principalmente de energia fotovoltaica. No entanto a energia solar seguirá atrativa para quem quiser investir em razão de seu retorno rápido e dos benefícios previstos em lei.
Um dos pontos principais da lei é a mudança do Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE), estabelecido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Diogo Lisbona Romeiro, pesquisador do Centro de Estudos e Regulação em Infraestrutura da Fundação Getulio Vargas (FGV CERI), explicou que esse sistema estava estabelecido desde 2012 e deveria passar por revisões pela própria Aneel em 2019. No entanto o tema acabou sendo levado para o Congresso, que acabou adotando uma regra mais rígida — e mais benéfica para as distribuidoras.
O sistema de compensação se baseia na concessão de créditos de energia a partir do excedente gerado pelo usuário nos micro e minigeradores. “Cada unidade de geração que se exporta para a rede, você compensa com a mesma unidade que recebe da rede”, explica o especialista. O cálculo é de um para um.
Para Raphael Amaral, professor de engenharia elétrica da Universidade Federal do Ceará (UFC), “a principal mudança [trazida pelo marco legal], e talvez única mudança, para o consumidor residencial é a cobrança da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD)“. “Quem já tiver sistema fotovoltaico funcionando ou conseguir protocolar até a entrada em vigor da lei continuará isento até 2045″, explica.

“Toda taxação atrapalha, não resta dúvidas. É uma medida antipática, um remédio amargo, que de início vai trazer um certo ‘esfriamento’ no mercado, mas, se forem feitas as contas direitinho, veremos que a geração fotovoltaica continuará sendo vantajosa no médio e longo prazos, entretanto com um payback maior, para dizer o mínimo”, avalia o professor da UFC.

O especialista defende que deveria haver um “prazo maior para que a cobrança da taxa entre em vigor, com aumentos percentuais mais brandos em um prazo que se equipare com o da isenção dos projetos existentes — o pagamento da taxa será total (100%) a partir de 2031, enquanto a isenção é até 2045. Seria visto com mais otimismo pelo mercado”.

“O marco legal em si não vem para trazer alívios ao Sistema Elétrico Brasileiro (SEB). Vem para remunerar as distribuidoras de energia com o uso da rede de distribuição para injetar a energia excedente gerada pela microgeração fotovoltaica na rede. Um desejo antigo das distribuidoras. O que vai trazer alívio para o SEB é o aumento da oferta de energia, e a contribuição da energia solar fotovoltaica só será mais expressiva no SEB se houver a instalação de mais e mais unidades geradoras, e um aumento de taxas vai na contramão desse propósito. Para o consumidor residencial em si, o marco não traz nenhum benefício, ao meu ver”, aponta.

O potencial de exploração [da energia fotovoltaica] no Brasil é enorme, e não estamos ainda nem vendo a ponta do iceberg. Ele [o mercado] não estava pronto para um ‘baque’ desses, pois taxação é desestímulo ao consumo”, reforça.
Romeiro também não enxerga o marco legal com muito otimismo e acredita que a lei diminui a atratividade para a adoção de painéis solares, mas não o torna desatrativo.
“É um investimento super atrativo no Brasil. […] Não vai deixar de ser atrativo em 2031. O que vai fazer é alterar um pouco o tempo de retorno do investimento. Agora, veja que é um bem que tem uma vida útil longa, de pelo menos 20 anos, e você fala de tempo de retorno de 2 a 3 anos. Há uma taxa para o retorno do investimento elevada”, ressalta.
O pesquisador da FGV, no entanto, faz um alerta para a questão do subsídio cruzado previsto na lei, o que pode ser um fator de aumento de desigualdades.

“Em termos de política, é desejável que a gente tenha investimentos em energia solar. É uma fonte que é complementar à eólica, é renovável, gera durante o dia, tem espaço no Brasil… É super importante que a gente tenha investimentos nessa fonte de energia. Mas o que a gente deveria ter cuidado em termos de política pública é se é uma política que gera subsídios cruzados e quem é que está pagando esses subsídios”, questiona Romeiro.

“O peso de uma conta de energia elétrica em proporção à renda é muito maior para estratos mais vulneráveis, de menor renda, do que para estratos de maior renda. Se é uma política que está tendo uma transferência e quem tem muita renda está adotando e quem tem pouca renda não está adotando, isso deveria ser um sinal de preocupação”, aponta.

Fonte: sputniknewsbrasil

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