Amazônia Azul: mapa do Brasil passa a incluir área equivalente à Europa Ocidental


Batizada de Amazônia Azul em referência à rica biodiversidade e recursos naturais, a área de 5,7 milhões de quilômetros quadrados que se estende ao longo dos 10 mil quilômetros da costa brasileira equivalente ao tamanho de toda a Europa Ocidental — só não é maior do que países como Rússia, Canadá, China, Estados Unidos, Austrália e o próprio Brasil continental.
Para além de abrigar bacias que tornaram o Brasil o nono maior produtor de petróleo do mundo e o maior da América Latina, inclusive à frente da Venezuela — detentora das maiores reservas mundiais —, a região possui uma infinidade de minerais, cordilheiras submarinas pouco conhecidas e recifes peculiares.
O professor do Instituto de Oceanografia da Universidade de São Paulo (IO-USP) e coordenador da Cátedra Unesco para Sustentabilidade do Oceano, Alexander Turra, reforçou à Sputnik Brasil sobre os potenciais da região.

“Tem implicações muito claras na questão da segurança energética, especialmente quando falamos de petróleo e gás, e também na oferta de minerais que são importantes para a indústria de alta tecnologia. Estamos falando das crostas cobaltíferas [que possuem alta concentração de importantes metais como níquel, cobalto e cobre], além de todo um contingente de organismos marítimos. Podemos ter exploração na biotecnologia, produzindo materiais para a indústria farmacêutica, alimentícia e cosmética”, pontua.

Para ampliar a soberania e a segurança nacional sobre a área, que vai além do limite máximo de 370 quilômetros definido pela Organização das Nações Unidas (ONU) como Zona Econômica Exclusiva (ZEE) do país, neste ano a Amazônia Azul passou a ser incluída no mapa brasileiro estampado em livros didáticos e materiais oficiais. “É um componente adicional que faz com que o país consiga ter uma garantia de acesso mais resguardada para recursos que estão nas águas, no solo e no subsolo marítimo, que agora estão sob jurisdição nacional”, acrescenta o pesquisador.
O tenente-coronel Edwardo Coelho de Oliveira, que é mestre em ciências militares e atua no 7º Grupo de Artilharia de Campanha (GAC) de Olinda, em Pernambuco, acrescenta à Sputnik Brasil que a região é chamada plataforma continental, que ainda não foi totalmente reconhecida pela ONU, apesar de estampar os mapas — é o prolongamento do território para o mar até as profundidades abissais.
© Marinha do Brasil/ReproduçãoInfográfico da Marinha do Brasil mostra a dimensão da chamada Amazônia Azul

Infográfico da Marinha do Brasil mostra a dimensão da chamada Amazônia Azul - Sputnik Brasil, 1920, 27.12.2023

Infográfico da Marinha do Brasil mostra a dimensão da chamada Amazônia Azul
Até agora, somente 20% da área, que vai entre Rio Grande do Sul e Santa Catarina, foi liberada. “Isso quer dizer que a maior parte do nosso pleito ainda está em estudo e não foi ratificado, mas há uma boa chance de se concretizar [são as margens Equatorial, do Amapá ao Ceará, e Oriental, do Rio Grande do Norte ao Paraná]”, diz.
Caso o pleito seja atendido, vai proporcionar maior acesso aos recursos naturais, a exemplo dos hidratos de gás que podem ser encontrados na região, e exploração comercial. “É uma forma sólida do gás natural e uma grama produz muitos metros cúbicos. Também posso citar as rotas marítimas internacionais e comércio de cabotagem”, destaca. Outro ponto de interesse que fica na plataforma é o arquipélago de São Pedro e São Paulo, a mais de mil quilômetros da costa e considerado “um trampolim do Brasil para a África”.

Quais mudanças ocorreram no mapa do Brasil?

Desde a Independência do Brasil em 1822, o mapa do país passou por inúmeras transformações, como a divisão da então província do Grão-Pará nos atuais estados do Amazonas, Roraima, Pará, Amapá e parte do Mato Grosso, além da incorporação do Acre há 120 anos após acordo diplomático com a Bolívia. Agora, no século XXI, os atlas e livros didáticos ganham a Amazônia Azul, onde já é gerado pelo menos 20% do PIB brasileiro. E diante de um território tão extenso, os desafios para fiscalizar tudo isso são enormes.
Conforme o especialista, está em desenvolvimento um sistema de vigilância da região pela Marinha a partir da Baía de Guanabara. “São diferentes tipos de sensores e equipamentos como satélites, boias, radares e drones para fazer o monitoramento desse espaço e garantir o uso dos recursos naturais de forma sustentável e beneficiando a população, sem serem desviados para outros países”, enfatiza. Um dos exemplos clássicos é a pesca ilegal na costa do país: na região amazônica, associações de pescadores denunciam há anos a atividade realizada por barcos chineses que capturam indiscriminadamente espécies ameaçadas de extinção.

Brasil no Atlântico Sul e a ampliação da liderança

A inclusão da Amazônia Azul no mapa nacional também traz implicações geopolíticas, aponta o professor Alexander Turra: a expansão da influência brasileira em todo o Atlântico Sul. “O Brasil já tem uma posição de liderança regional e nesse sentido tem a possibilidade de exercitar esse papel de uma forma um pouco mais efetiva, dar o tom do que vai acontecer na região no âmbito da Zona de Cooperação e Paz do Atlântico Sul, além de atuar na criação do Santuário de Baleias do Atlântico Sul”, argumenta o especialista.
Mas a mudança também traz grandes responsabilidades ao país, como desenvolver políticas ambientais que garantam uma exploração sustentável e conservação de todo o bioma marinho através de padrões estabelecidos nacionalmente. “O referencial para a agenda ambiental deixa de ser o que é colocado internacionalmente por órgãos associados à ONU [Autoridade dos Fundos Marinhos e o tratado de Biodiversidade Além das Jurisdições Nacionais]. Podemos ter coisas muito boas ou muito trágicas, vai depender de como essas políticas serão implementadas”, diz.

Onde o Brasil exerce sua soberania?

Espaço aéreo, solo, sub e o mar territorial. A Constituição Federal prevê que o Brasil exerça a sua soberania nessas localidades, que com relação à Amazônia Azul amplia o que está previsto na legislação. Ainda está em estudo acrescentar uma outra região ao mapa brasileiro: um milhão de quilômetros quadrados que pode ser anexado ao país, explica o professor da USP. Isso, segundo ele, pode trazer questionamentos geopolíticos internacionais. A região era uma ilha tropical conhecida como Elevação do Rio Grande.

“Essas solicitações de áreas normalmente desencadeiam reações contrárias, especialmente se há países limítrofes. No caso do Brasil, não existe nenhum tipo de sobreposição que poderia ser solicitada por outras nações, então a chance de ocorrer um questionamento é baixa. A única é a Elevação do Rio Grande, que é a última área que está sendo proposta [para a Amazônia Azul] a ser anexada, que é uma região com evidências cada vez maiores que foi um pedaço do continente que afundou e no passado havia uma conexão que se desprendeu”, afirma.

Já o tenente-coronel Edwardo Coelho lembra que a pujança brasileira em termos territoriais incomoda de forma regional e até internacional. Conforme o mestre em ciências militares, há relatos de que países como Uruguai e Argentina não são favoráveis à extensão da plataforma continental brasileira, além da China. “O governo chinês já pediu à ONU para explorar a cordilheira mesoatlântica, que é a espinha dorsal no meio do Atlântico. Não faz parte da Amazônia Azul, mas é uma área de interesse para o Brasil. Isso também ocorreu com a região do Rio Grande”, contou.

Amazônia Azul: área de ‘cobiça’ internacional

Estudo recente liberado por pesquisadores da USP é uma pequena amostra dos potenciais econômicos da região: com distância de 1,2 mil quilômetros da costa, a elevação era uma grande ilha vulcânica há 50 milhões de anos e conta com reservas de minerais raros, considerados essenciais para a produção de baterias, painéis solares e produtos da energia verde.
“O que se vê para o futuro é que, com a necessidade das nações ampararem seu desenvolvimento, como alimentar uma grande população, buscar matéria-prima e fornecimento de energia, a Amazônia Azul é uma área de cobiça que deve ser defendida a todo custo pelo Estado-nação”, argumenta o tenente-coronel.
Em abril deste ano, um navio alemão chegou a ser expulso da área pela Marinha do Brasil por realizar pesquisas sem autorização em águas do país. “Isso mostra a importância de termos um sistema de vigilância denso que seja capaz de detectar não só essa como outras embarcações. Ameaça é tudo que atenta contra os interesses do estado brasileiro”, disse o almirante Marcos Sampaio Olsen à época, durante uma comissão da Câmara dos Deputados.
O Brasil já se posicionou de forma contrária à mineração em águas profundas por conta dos riscos à biodiversidade e, por isso, proteger a Amazônia Azul é crucial para garantir a sustentabilidade em toda a região. “Que acontece é que a gente precisa então organizar o uso desse espaço para poder desenvolver não uma economia azul, e sim uma economia sustentável do oceano que tenha como pilares a proteção efetiva, sustentável e o compartilhamento equitativo de recursos. Esse é o grande ponto, como que a gente faz isso conciliando os diferentes interesses que estão aí colocados na mesa”, concluiu.

Fonte: sputniknewsbrasil

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