(FOLHAPRESS) – O empresário Carlos Ernesto Augustin, umas das principais pontes da campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com o agronegócio, afirmou à Folha de S.Paulo que o petista errou ao se referir a parte do setor como “fascista” em entrevista ao Jornal Nacional, na semana passada.
“Lula não precisava se referir ao agronegócio dessa maneira. Ele generalizou. Eu vou sugerir que ele peça desculpas, não devia ter feito isso. Não é a realidade geral”, disse Augustin.
Segundo ele, a declaração cria dificuldades para os esforços de aproximação do candidato com atores do campo.
No Jornal Nacional, Lula sugeriu que uma ala do agronegócio “é fascista e direitista” e se opõe ao PT por ser contra políticas de preservação do meio ambiente.
Teti, como é conhecido, é produtor de soja e algodão e irmão do economista Arno Augustin, que foi secretário do Tesouro Nacional no governo Dilma Rousseff.
Para Augustin, é necessário que tanto Lula como integrantes do agronegócio “se desarmem” de olho numa boa relação num eventual governo petista.
PERGUNTA – Boa parte do agronegócio apoia Bolsonaro. Por quê?
CARLOS ERNESTO AUGUSTIN – Vamos examinar o passado: havia uma pressão muito grande do MST [Movimento Sem Terra], uma pressão muito grande de ambientalistas e, de uma forma exagerada e radical, [isso] criou [uma reação no] sentido contrário.
Meus colegas perguntam se eu vou apoiar um governo que vai incentivar invasão de terra. Existe invasão de terra hoje? Esse é um problema para nós hoje?
Nunca perto de mim houve uma invasão de terra. Eu não sei o que é isso. É o que o Lula perguntou: existe a invasão de área produtiva? Eu não conheço.
P. – Houve casos no passado.
CA – Existiu um momento em que houve. Eu acho que o que está acontecendo hoje é uma reação muito forte a isso.
O que existe hoje por parte do setor é uma intransigência muito grande em pensar diferente, de maneira não ideológica. Então, se um dia houve uma ideologia de esquerda muito forte, do MST, hoje está acontecendo o oposto de uma maneira desmesurada. Infelizmente, estão perdendo bom senso e indo para ideologia de direita. Lula tem feito movimentos para reduzir o distanciamento em relação ao agro… Mas eu tenho que criticar. O Lula chamar agricultor de fascista, ele não precisava ter feito isso. Como é que eu vou justificar o fato de ele ter chamado o agro de fascista?
– [Em setembro do ano passado, o cantor] Sérgio Reis estava reunido com toda diretoria da Aprosoja [Associação de Produtores de Soja], de onde saiu um videozinho famoso dizendo que se esses caras não saíssem por bem, os ministros do STF, eles sairiam por mal. Isso todo o Brasil ficou sabendo.
P. – O sr. quer dizer com isso que existe um agro fascista?
CA – Me diga você. Está ali o Sérgio Reis em toda a diretoria da Aprosoja no Brasil. Isso é uma brincadeira? É uma brincadeira o presidente da República dizer assim: não vou mais respeitar o Judiciário?
Agora, o Lula não precisava se referir ao agronegócio dessa maneira. Ele generalizou. Eu vou sugerir que ele peça desculpas, não devia ter feito isso. Não é a realidade geral.
P. – Que efeitos vê nessa declaração?
CA – Aquele que já era bolsonarista vai ficar mais ainda, e aquele que tinha um sentimento positivo com relação [ao Lula] se assustou. Para os indecisos, foi ruim. O presidente tem que enaltecer o agro pela importância que ele tem no Brasil. Agora, tem que ter correções? Claro. Correções ambientais, que não custam caro e nos dão dinheiro.
O problema não é um agricultor correto, o problema está em outro lugar. O problema está num cara sem vergonha, um criminoso que faz isso de forma irregular. E ele faz pressão econômica, pressão sobre os parlamentares para legalizar o ato criminoso dele. Bota fogo na caminhonete do Ibama. Aí vai o presidente da República, de uma certa forma, dando apoio a esse pessoal. Esse antagonismo entre meio ambiente e produção, ele não precisa existir.
P. – É possível para Lula ter apoio no agro?
CA – Isso é difícil, porque os votos já estão 70% definidos. Não se trata somente de apoiar o Lula, mas de ter um bom entrosamento. Nós temos que fazer algumas sinalizações positivas porque a chance de o Lula ganhar a eleição é uma realidade bem palpável. E todo esse povo aqui, seus parlamentares, como é que não convivem com isso depois?
O setor deveria fazer um gesto de aproximação. Por outro lado, o Lula não deve falar o que falou. Estou querendo ajudar ele a dizer o que nós podemos fazer de melhor.
P. – Quantas vezes o sr. já esteve com Lula?
CA – Eu já estive com ele duas vezes e com Alckmin umas quatro vezes.
P. – O que diz Lula sobre a aproximação com o agro?
CA – O objetivo dele é exatamente diminuir essas diferenças. Ele escalou o Alckmin para fazer isso, mas não houve nenhuma reunião importante do Alckmin ainda com o setor. Está devagar. Eu já tentei, mas acho que vai acontecer no devido tempo.
Eu acho que os dois lados têm que se desarmar, inclusive o Lula, porque ele não deveria ter dito [o que falou sobre fascistas] -embora eu concorde com ele, que esse pessoal que fez reunião com Sérgio Reis, aqueles que financiaram Sete de Setembro, a intenção deles era golpista, né? Tudo bem, mas não precisa chamar o setor de fascista em razão disso. Ali acho que ele se excedeu.
P. – O sr. mencionou a participação do setor no Sete de Setembro do ano passado. O que esperar neste ano?
CA – Esse cara que está vindo apoiar o Bolsonaro com trator, ele é um golpista? Ele não sabe direito o que ele é. Ele está indo numa manada porque todos os vizinhos dele, o sindicato, a liderança dizem que isso é melhor. A pergunta é: esse cara é um golpista? Não, é bolsonarista porque acha que o Bolsonaro não vai atrapalhar ele na questão ambiental, que vai permitir que ele desmate. É retrógrado, é conservador? É.
P. – O agro deve ficar contra Lula num eventual governo do PT?
CA – Nós já passamos por vários governos. O agricultor não é politizado, vamos falar a verdade. Ele está ali para trabalhar e fazer o negócio dele. Então, logo que se estabeleça o novo presidente, as condições vão voltar ao normal. Assim, a aproximação com o próximo governo é imediata. Vai ficar algum ressentimento, mas nesse ponto o agricultor é pragmático.
Existem grandes empresários que estão apoiando Lula? Quem são? Você sabe quem é o Blairo [Maggi, ex-ministro, ex-senador e um dos maiores produtores de soja do mundo]. Ele foi um bom ministro da Agricultura, tem comércio internacional da sua soja, tem enorme respeito pelo meio ambiente e pelos trabalhadores. Então vamos perguntar o que ele acha do governo Bolsonaro, sobre relações internacionais, quanto a respeito ao meio ambiente e às pessoas? Eu não vou dizer.
P. – Os empresários têm receio de sofrer algum prejuízo por apoiar uma candidatura de oposição? Eu sou produtor de sementes. Quem me compra semente?
CA – Os agricultores. Vamos ver o que acontece comigo. [Mostra uma imagem distribuída pelo WhatsApp que ataca seu apoio ao PT e pede que não comprem seus produtos] Essa não é a primeira vez que acontece comigo. Eu tenho 20 vendedores no campo, todos eles receberam isso. Cadê meu direito político de pensar numa coisa? Eu posso quebrar por causa disso? Que país é esse? Onde nós estamos?
P. – No Jornal Nacional, o ex-presidente disse que o MST mudou. A campanha tem que passar alguma mensagem sobre isso voltada aos grandes produtores?
CA – Eu acho que tem que reforçar a mensagem de que, por lei, terra invadida não pode ser desapropriada para reforma agrária. E dizer “não vou apoiar ilegalidades”, algo simples de dizer. Acho que ele [Lula] não foi enfático ainda.
P. – Qual é a posição que a campanha deve ter sobre acesso a armas de fogo no campo?
CA – O agricultor ter arma, isso já é da lei, né? Não vejo problema. Acho até interessante, mas é uma bobagem sem tamanho. Eu tenho casa na fazenda, moro lá há 40 anos e nunca chaveei a porta de casa. Onde é que está esse medo, aí o que que tá acontecendo? Não está acontecendo nada, está acontecendo uma insuflação de uma possível invasão de terra pelo MST apoiada pelo próximo presidente da República.
P. – Que propostas para o agro o sr. pretende levar à campanha de Lula?
CA – [Uma delas é um programa de] juros diferentes para comprometimento social e ambiental. Reduzir, por exemplo, a taxa de juros para aqueles produtores que tenham todos os trabalhadores com plano de saúde. Juros menores para quem usar biodefensivos. A questão do carbono, a abertura de áreas de pastagem para a produção de soja, a juros baratos. A gente precisa de conectividade com a Internet. As inovações tecnológicas têm que ter um aporte grande de recursos. Outro pilar: não podemos fazer juros inspirados na taxa Selic. Uma alternativa é nós fazermos financiamento de longo prazo em dólar, porque tira o problema da Selic.Raio-x
Carlos Ernesto Augustin, 65 anos
Conhecido no setor como Teti, é um dos maiores vendedores de semente de soja do país. Criou a empresa Petrovina há mais de 40 anos, que além de soja produz algodão. É irmão do economista Arno Augustin, secretário do Tesouro Nacional no governo Dilma Rousseff.