Acesso a dados em investigações cr1min4is deve ser regulamentado, apontam especialistas


acesso dados investigacoes criminais deve ser regulamentado apontam especialistas

Via @jornalextra | O uso de ferramentas de inteligência na segurança pública passa pelo debate em torno da proteção de dados dos cidadãos. Um dos desafios para a implantação de novas tecnologias apontado pelos especialistas é a regulamentação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no âmbito penal, ainda sem previsão legal no Brasil. O tema foi abordado por palestrantes das duas mesas do Seminário EXTRA, que aconteceu na segunda-feira.

A advogada criminal e professora da FGV Rio Maíra Fernandes lembrou que, em 2019, foi feito um anteprojeto de uma LGPD Penal, mas que não chegou a ser apresentado como projeto de lei:

— Quando a LGPD foi aprovada, intencionalmente deixou-se de lado o uso pela segurança pública, porque isso demandaria uma discussão mais aprofundada e muito complexa. Em 2019, uma comissão de juristas desenvolveu um anteprojeto, que nunca se transformou em lei. Até hoje não existe uma lei tramitando para essa discussão. Falta o legislativo apresentar um projeto de lei e atualizar o que já foi feito.

Apesar de não estarem descritas em uma lei específica voltada para a área de segurança, a privacidade e a proteção de dados são direitos fundamentais previstos no artigo 5º da Constituição Federal, segundo destacou Rodrigo Dias de Pinho Gomes, presidente da Comissão de Proteção de Dados e Privacidade da OAB-RJ:

— É urgente uma LGPD Penal, mas não podemos esquecer que temos uma Constituição. A gente já tem alguns fundamentos na lei que está em vigor, e na Constituição, que podem sustentar uma fiscalização e uma cobrança pelo gestor público.

Pinho Gomes lembrou que o artigo 4º da LGPD não se aplica a segurança pública, investigação criminal, persecução penal e defesa de estado. Mas os parágrafos 1º e 3º ditam que a atuação no âmbito criminal têm que seguir não só os princípios da lei, mas os direitos do titular.

— Outro ponto é que o parágrafo 3º do artigo 4º prevê que a autoridade de proteção de dados pode solicitar, dos agentes públicos, um relatório de impacto à proteção de dados. Semana passada, essa autoridade impediu a Meta (dona do WhatsApp e do Facebook) de usar inteligência artificial e treinamento com dados de brasileiros — destaca Pinho Gomes.

Os cuidados com o rigor da lei são uma questão global. Ele lembrou o caso da empresa de dados Clearview, que foi proibida na França por varrer dados de cidadãos nas redes sociais e vender a empresas e instituições.

— Não se faz política pública sem dados, o maior exemplo que a gente tem é da Covid. A vacinação foi feita com dados pessoais, demográficos, de profissão, comorbidades. No caso da segurança pública, não podemos combater ilegalidades cometendo ilegalidades. Em uma investigação, você não pode grampear um telefone sem autorização da Justiça, ou descumprir ritos, pois corre o risco de anular toda uma operação — diz o presidente da comissão da OAB.

A recomendação de Maíra Fernandes é que o uso de tecnologias seja compatível com os direitos de confiabilidade e privacidade.

— Eu sou uma entusiasta do uso de inovações tecnológicas na segurança. Mas o sistema precisa ter um regramento cuidadoso, com métodos e protocolos. O direito à privacidade é fundamental e a proteção desses dados também. O acesso a informações sem regulamentação pode ser perigoso e gerar onda de desconfiança das pessoas.

Em meio a erros, humano é soberano

Diante de um momento social de intensa aceleração tecnológica e constante renovação das ferramentas, é preciso “dar um passo atrás” e prestar atenção no humano. Esta é a avaliação da perita Maria do Carmo Gargaglione, atual diretora da Divisão de Evidências Digitais e Tecnologia da Coordenadoria de Segurança e Inteligência do Ministério Público do Rio (CSI/MP-RJ):

— Eu tenho um pouco de receio de creditar à tecnologia a solução dos nossos problemas. A gente começa a esquecer que o humano preparado, capaz, criativo, é muito mais importante do que a ferramenta que ele usa. A gente cria milhões de dados. Se a gente deixa o poder de decisão sobre essas informações a um sistema informatizado, a gente corre risco. Um ser humano preparado e capacitado é mais efetivo na solução dos problemas.

A diretora citou um caso que acompanhou de um cidadão que tinha, em seu registro criminal, fotos com a altura, em medidas oficiais, variando de 1,62m a 1,69m. Para chegar à identificação dele, a equipe de perícia teve que coletar a imagem e fazer medição manual:

— É algo básico, mas que toma tempo. Nós temos uma tecnologia de ponta, a melhor do país, com acurácia milimétrica, de fazer medições com até três milímetros de diferença. Mas ela não funciona sozinha. Precisamos rever os critérios de aquisição desses padrões para, quando chegar num laboratório como o nosso, conseguirmos poupar tempo e oferecer um serviço melhor para a sociedade.

Ela entende a capacitação das pessoas como um pré-requisito para avançar no desenvolvimento tecnológico.

— É crucial que as pessoas se capacitem para entender o real fundamento da tecnologia, e aí, sim, a gente parte para uma discussão mais profunda — completa.

Por Camila Araujo — Rio de Janeiro
Fonte: @jornalextra

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