UENOS AIRES, ARGENTINA – Mergulhado em uma crise política, o presidente do Peru, Pedro Castillo, viu o Congresso lançar duas novas cartadas contra sua gestão em dois dias.
Nesta terça-feira (29), um grupo de parlamentares liderado por Edward Málaga protocolou a terceira moção de vacância contra o líder esquerdista, acusado de incapacidade moral de governar. O mecanismo é uma espécie de impeachment, ainda que seja uma figura jurídica distinta.
Na véspera, outro deputado, Esdras Medina, já tinha apresentado uma moção de suspensão, que afastaria o presidente por 12 meses para que se julguem ações que correm contra ele na Justiça.
A eventual aceitação do processo de vacância deve ser analisada pelo Congresso em até dez dias. O total de apoios obtidos para a apresentação do pedido, porém, é menor do que o mínimo necessário para afastar o presidente, de 87 votos. Nas duas moções anteriores, em dezembro do ano passado e março deste ano, a oposição falhou ao reunir os votos, mantendo Castillo no cargo.
A moção de suspensão ainda não tem prazo para ser analisada, mas reforçou o acirramento de tensões entre Legislativo e Executivo. Ambos os lados se acusam de tramar um golpe de Estado, para dissolver o Congresso ou derrubar o presidente, a depender da visão.
Na última sexta (25), o mandatário anunciou uma renovação de seu gabinete, a quinta em 16 meses de mandato –processo obrigatório após o pedido de demissão do primeiro-ministro, Aníbal Torres. A ex-deputada Betssy Chávez foi nomeada para o posto, mas tanto ela quanto os novos ministros terão, em até um mês, que obter o voto de confiança do Legislativo, em meio a esse clima de confronto.
Castillo vem tentando cumprir uma promessa de campanha, de formar uma Assembleia Constituinte, mas por ora não encontrou eco para isso no Congresso, e a saída de Torres está diretamente ligada a atritos envolvendo a questão.
A Constituição peruana estabelece que, se o governo for derrotado em um voto de confiança, o presidente deve recompor seu gabinete. Se o processo se repetir, o chefe do Executivo então pode dissolver o Parlamento e convocar novas eleições legislativas.
Este passo já ocorreu em 2019, sob o então presidente Martín Vizcarra, depois de os congressistas rejeitarem dois votos de confiança. No ano seguinte, porém, a nova configuração do Legislativo conseguiu removê-lo do poder em meio a acusações de corrupção, coroando uma convulsão política crônica que se repete no mandato de Castillo.
No momento, há duas acusações constitucionais contra o esquerdista sendo debatidas no Congresso. A primeira é por traição, apoiada na ideia de convocar um plebiscito para perguntar à população se estaria de acordo com a concessão de um acesso ao mar para a Bolívia.
A segunda alega que o presidente é o líder de uma organização criminosa que busca obter propina em troca de contratos de obras públicas. Se as acusações forem concluídas, Castillo poderia perder o cargo por meio de uma moção de vacância.
Desde o início da gestão, em meados de 2021, o líder esquerdista tem dificuldades para governar e formar alianças no Congresso –às quais neste ano se somaram protestos nas ruas.
Segundo o Instituto de Estudos Peruanos, Castillo tem hoje 28% de popularidade, mas a mesma pesquisa aponta que mais de 80% da população está insatisfeita com o Congresso.
“As pessoas não querem algo parecido com a instabilidade causada pelas quedas de PPK [Pedro Pablo Kuczynski] e de Vizcarra. Tampouco um deputado desconhecido vestindo a faixa de novo “, diz a analista política Rosa María Palacios, em referência à fugaz Presidência de Manuel Merino, de cinco dias. “A política já não estava em alta quando Castillo foi eleito, e agora a moral dos representantes é ainda pior.”
Nesse contexto, mesmo as manifestações de rua, que tiveram um pico em 2019, nunca voltaram ao volume de antes da pandemia. “A lista dos problemas ficou tão grande que protestar passou a parecer menos importante.”