Augusto Aras se manifestou em ADIs que questionam leis de PE e CE que vedam uso de veículos licenciados em outros estados por locadoras
Foto: Antonio Augusto/Secom/MPF
O procurador-geral da República, Augusto Aras, encaminhou parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) alertando para o risco de bitributação gerado pela Lei Complementar 459/2021, do estado de Pernambuco. Objeto de ação de controle de constitucionalidade (ADI 7.059) de autoria da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), a norma proíbe que as locadoras de automóveis que atuam no estado utilizem veículos licenciados em outras unidades da Federação. Segundo o PGR, a legislação não contempla salvaguarda às sociedades empresariais contribuintes que impeça a dupla tributação do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), no mesmo ano, de carros que estavam registrados em outros estados.
Na manifestação, Aras opina pela procedência parcial da ADI quanto à inconstitucionalidade da possível bitributação do IPVA e das sanções promovidas pela lei questionada. “O diploma objurgado não prevê mecanismo que resguarde o contribuinte de eventual cobrança simultânea de IPVA, determinando, por exemplo, que aquele imposto viesse a incidir de forma proporcional, somente a partir do registro e licenciamento naquele estado da Federação”, pontua o procurador-geral.
Nesse sentido, Aras sugere que o Plenário do STF mantenha a decisão manipulativa conferida pela liminar do ministro André Mendonça na ação. Provisoriamente, o relator concedeu interpretação à lei complementar pernambucana de modo a impedir a tributação duplicada no exercício financeiro de 2022, garantindo ao contribuinte a restituição do IPVA pago no período em que o automóvel não estava licenciado naquele estado.
Outro ponto considerado inconstitucional por Augusto Aras na legislação de Pernambuco é a falta de proporcionalidade das sanções promovidas pela lei às locadoras de automóveis. Na redação atual, a norma prevê como medida administrativa a apreensão do veículo que não esteja registrado em Pernambuco. Segundo o PGR, o estado “adentrou competência da União para legislar sobre trânsito e transporte”, uma vez que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) não prevê a apreensão de veículos como a lei estadual.
Augusto Aras esclarece, ainda, que a aplicação de multa às locadoras de automóveis no valor de R$ 53 mil, podendo chegar ao dobro em caso de reincidência, é “excessiva e desproporcional”. Para ele, embora o STF permita a adoção de percentuais rigorosos com o intuito de coibir a prática de crimes tributários, o valor da multa “deve ter como limite o montante devido pela obrigação principal”, sendo vedado o uso do tributo com efeito confiscatório.
Constitucionalidade – Apesar de apontar inconstitucionalidades na lei pernambucana, Augusto Aras considera que a norma não deve ser invalidada na sua totalidade. Ele aponta precedente do STF no julgamento da ADI 4.612, ocasião em que a Corte definiu a aplicabilidade do critério espacial para a exigência do IPVA. Segundo o PGR, o estado de Pernambuco “atuou nos limites de sua competência tributária de instituir e regular” o IPVA, observando as leis federais.
O parecer esclarece que a LC 459/2021 define o domicílio tributário das empresas locadoras de veículos, adotando como critério a autonomia de cada estabelecimento sem se importar com a localidade da sede da empresa. A medida, de acordo com o procurador-geral, está amparada pelo Código Tributário Nacional (CTN) e pelo Código Civil. “A esse respeito, cite-se precedente do STF no sentido de que a imposição do IPVA supõe que o veículo automotor circule no Estado em que licenciado”, afirma.
Extinção – Além da ADI 7.059, a Confederação Nacional de Transportes entrou com outra ação de controle de constitucionalidade contra a mesma lei pernambucana, a ADI 7.097. Esta, de acordo com Aras, está configurada na “hipótese de litispendência” e deve ser extinta. Essa condição ocorre quando duas ações idênticas estão em tramitação ao mesmo tempo, devendo uma delas ser anulada antes da resolução do mérito, como prevê o Código de Processo Civil (CPC).
Lei do Ceará – Na ADI 7.046, ajuizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o PGR também se manifestou pela procedência parcial do pedido, para que seja declarada a inconstitucionalidade do art. 20- C, § 2º, da Lei 12.023/1992, na redação dada pelo art. 4º, VII, da Lei 17.080/2019, ambas do estado do Ceará. Segundo Augusto Aras, ao legislar sobre trânsito e transporte, contrariando o disposto no art. 22, XI, da Constituição da República, a lei cearense invadiu a competência privativa da União sobre o tema.
Em relação à alegada bitributação, Aras diz que, ao contrário da lei pernambucana, essa possibilidade está descartada, pois a lei cearense expressamente determina, para veículos usados oriundos de outros estados ou novos adquiridos para locação, que o imposto seja cobrado de maneira proporcional. Ou seja, a partir do momento do registro ou do licenciamento do veículo no Ceará, não incidindo o IPVA sobre o período anterior.
Na ação, a CNC afirma que a norma do Ceará desconsiderou o art. 127, II, do CTN, que trata do domicílio tributário das pessoas jurídicas. Para o PGR, ao contrário do alegado, a lei “questionada trata do domicílio tributário das empresas locadoras de veículos que prestam serviço ao poder público do Estado do Ceará e dos motoristas de automóveis atuantes na área de transporte por aplicativo naquele ente da Federação” e não de todas as empresas do ramo de locação de veículos. Sendo assim, a Lei 17.080/2019 não contraria o CTN, pois o código autoriza a definição do domicílio tributário adotando-se como critério a autonomia de cada estabelecimento, independentemente de onde seja sua sede.
Para o PGR, também não há de ser acolhida a afirmação da CNC de afronta aos princípios da livre iniciativa, da livre concorrência, da isonomia e da vedação ao emprego de tributo com o objetivo de limitar o tráfego de pessoas ou de bens. Como a lei do Ceará não exige que as locadoras de veículos tenham sede no estado como condição para que lá atuem, Augusto Aras diz que a norma não cria reserva de mercado para as empresas ali sediadas. A norma cearense determina apenas que os veículos utilizados habitualmente e para fins comerciais naquele estado sejam registrados e licenciados no Ceará.
Íntegras das manifestações