BRUNO CAVALCANTI
SÃO PAULO, SP – Foi graças ao isolamento causado pela pandemia de Covid-19 que Marco Nanini conseguiu realizar o antigo desejo de dividir o palco com Camila Amado, que morreu em 2021.
Amigos de longa data, os dois vinham adiando o encontro até que, com o cenário cultural congelado, conseguiram trabalhar na parceria, que deu origem a “As Cadeiras”, projeto multimídia que marcou a despedida da atriz, morta em junho de 2021.
Clássico do teatro do absurdo escrito por Eugène Ionesco, o texto ganhou montagem no Brasil no final da década de 1950 e foi o responsável por lançar Amado na carreira profissional. Desde então a atriz desejava voltar a cena com a obra, desde que do lado de Nanini.
“Era o momento adequado para pegar um texto de dois atores e, principalmente, dois atores que eram muito amigos. Eles sempre quiseram fazer e as agendas não permitiam, então aproveitamos que o mundo parou e decidimos que era hora de colocar isso para funcionar”, diz Fernando Libonati, produtor e companheiro de Nanini há mais de 30 anos, que estreia como diretor.
Inicialmente, “As Cadeiras” daria origem a uma peça-filme e a uma montagem que usaria elementos da gravação e rodaria o Brasil. A versão filmada estrearia durante a pandemia, enquanto a peça só chegaria aos palcos após o fim do isolamento. A saída de cena da atriz alterou os planos.
O filme de fato saiu e chegou ao Petra Belas Artes no último dia 13, onde permanece até quarta-feira (19). Já a montagem foi abortada. Montar a obra com outra atriz está fora de cogitação. “O processo foi muito forte e seria muito intenso emocionalmente falando. Era a Camila e vai ficar para sempre sendo a Camila”, diz o diretor.
Amado, inclusive, foi presença fundamental para que Nanini aceitasse mergulhar na estética do teatro audiovisual. “Tudo favoreceu. Minha admiração pela Camila foi fundamental, porque agora isso sempre vai ficar na minha memória, e hoje ver a reação do público nas salas de cinema me deixa muito emocionado. É para ela que fazemos”, diz o ator.
“As Cadeiras” narra o diálogo entre dois velhos num local deserto à espera de convidados ilustres, para os quais pretendem contar um segredo capaz de salvar a humanidade. Os convidados aparecem, mas o segredo nunca é revelado.
A montagem é, na concepção da dupla, uma forma de lançar um olhar mais ácido acerca da sociedade contemporânea e do momento político atual, que Nanini enxerga como estarrecedor.
“Essa coisa de país dividido enlouqueceu as pessoas. Isso é absurdo. Criamos um medo irracional da violência, e ninguém ficou calmo para escolher seu candidato. Essa coisa de torcida organizada é o que acho mais danoso”, afirma, o artista, que vai votar em Lula.
O voto no petista vem com a crença de que o mercado cultural pode reagir com mais força com as políticas públicas que o candidato promete voltar a aplicar. Nos últimos anos, diretor e ator viram fechar seu Galpão Gamboa, um dos principais espaços culturais do Rio de Janeiro, desmontado pela falta de políticas culturais durante a gestão de Marcelo Crivella na prefeitura e a soterrado pelo governo de Jair Bolsonaro.
Em 2023, Nanini se reunirá com Gerald Thomas, numa obra que o diretor também pretende registrar para as telas de cinema.AS CADEIRAS
Quando: De 13 a 19 de outubro
Onde: Cine Petra Belas Artes – r. da Consolação, 2.423, São Paulo
Preço: R$ 17 (meia) e R$ 34 (inteira)
Autor: Eugène Ionesco
Elenco: Camila Amado e Marco Nanini
Produção: Brasil, 2022
Direção: Fernando Libonati
Acessibilidade