O pedido é referente aos anos de 2015 e 2016. Cada pescador também poderá receber R$ 10 mil pelas perdas individuais
Foto por Arnoldo Riker em licença CC BY-NC-SA 2.0
Entre os anos de 2015 e 2016, por causa de uma portaria do governo federal, pescadores de todo o país não receberam os pagamentos do seguro-defeso, que assegura a sobrevivência desses profissionais durante os períodos de piracema dos peixes, em que a legislação ambiental proíbe a atividade da pesca.
A suspensão provocou dificuldades de sustento para milhares de famílias e foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que ordenou o pagamento retroativo dos períodos em que o seguro foi suspenso. Até hoje, os pescadores da bacia do rio Xingu, no Pará, não receberam o pagamento.
Com base nesses fatos, o Ministério Público Federal (MPF) iniciou esta semana uma ação civil pública para obrigar o governo federal a pagar os retroativos que deve aos pescadores do Xingu, acrescidos de indenizações por danos individuais – de R$ 10 mil para cada pescador, e por danos morais coletivos, de R$ 5 milhões, que devem beneficiar toda a coletividade dos pescadores nos municípios de Altamira, Anapu, Brasil Novo, Medicilândia, Porto de Moz, Senador José Porfírio e Vitória do Xingu.
A portaria que suspendeu os períodos de defeso e, consequentemente, o pagamento do seguro-defeso foi a de número 192/2015 e baseou-se em uma nota técnica do Ministério do Meio Ambiente que, de acordo com o entendimento de especialistas, desconsiderou a preservação da vida marinha, lacustre e fluvial, bem como a subsistência dos pescadores artesanais. Diante das inconsistências, o Senado aprovou um decreto sustando os efeitos do ato.
O governo federal na época respondeu com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), levando a discussão para o STF. Em março de 2016, o ministro Luís Roberto Barroso restabeleceu o pagamento do seguro, mas só após decisão final do plenário do Supremo, em 2020, é que foi determinado o pagamento do retroativo, referente ao período de outubro de 2015 a novembro de 2016.
O MPF em Altamira questionou o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) sobre o cumprimento da decisão do STF e os pagamentos aos pescadores da região do médio Xingu. O Instituto reconheceu que os pagamentos são devidos e deveriam ser pagos imediatamente, mas até o presente momento, os pescadores não receberam os retroativos. Diante do impasse, o MPF recorre agora à Justiça Federal.
Para o MPF, além dos valores do seguro, os pescadores da região também devem receber pelos danos individuais, já que tiveram o sustento de suas famílias prejudicado pela decisão do governo federal. Ainda que se alegue que a pesca estava permitida pelo mesmo ato governamental, o MPF lembra que a portaria foi emitida poucos dias antes do início do período do defeso, sem informação direta aos pescadores.
“Para além do desconhecimento do ato interministerial por parte dos pescadores, afinal, a região da bacia do Xingu conta com comunidades distantes dos grandes centros urbanos – locais estes que sequer funciona sinal de telefonia móvel –, o tempo foi extremamente curto para qualquer planejamento visando nova temporada de pesca”, argumenta a ação judicial. A pesca também foi inviabilizada, explica o MPF, pelo temor da fiscalização dos órgãos ambientais que provoca consequências administrativas e criminais aos pescadores.
Mesmo que pescassem, acrescenta o MPF, o sustento de suas famílias estaria ameaçado, porque na época da reprodução das espécies o pescado não tem tanto valor comercial, seja pela alteração da massa magra ou pela presença de ovas no interior dos peixes. Por esses motivos, e porque os pescadores artesanais compõem um grupo socialmente vulnerável o MPF pede que a União indenize individualmente todos com o valor de R$ 10 mil.
“Com a suspensão abrupta do período de defeso, faltando pouco mais de trinta dias para seu início, e, como consequência, do direito ao recebimento do seguro-desemprego, a Portaria nº 192/2015 retirou dos pescadores sua única fonte de renda durante o período de reprodução de diversas espécies de peixes. Além disso, a categoria de pescadores é nitidamente vulnerável, seja pelo seu modo de vida, seja pelas limitações de transportes, armazenagem e venda de seus produtos, ou mesmo pela ineficaz tutela estatal”, diz a ação judicial. Pelos danos morais coletivos, o MPF pede o pagamento de R$ 5 milhões.
Processo no.1002596-31.2022.4.01.3903
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