Com o lançamento da Purosangue, seu primeiro SUV, a Ferrari esqueceu que o mundo caminha para um futuro exclusivamente elétrico. É quase como se a montadora estivesse desafiando o senso comum. Agora, a 12Cilindri Spider (pronuncia-se “Dodici Cilindri” — com a letra “c’ soando como um “t”) vem com a mesma atitude da Berlinetta.
Uma generosa máscara preta liga os dois faróis e faz referência à 364 GTB de 1964. Em minha opinião, dá um toque de mistério extra à 12Cilindri. Na traseira, a faixa escurecida fica na extremidade superior, percorrendo toda a lateral e agregando as aletas traseiras, posicionadas nas pontas. Elas são móveis e, se a velocidade e a aceleração excederem os limites programados, as peças se erguem em um ângulo de 10 graus para maximizar a eficiência aerodinâmica. Na posição mais elevada, a pressão descendente faz uma carga equivalente a 50 kg quando o carro está a 250 km/h.
A diferença mais evidente em relação ao cupê é o teto removível, claro. “Optamos por uma capota rígida retrátil porque é a melhor solução em termos de conforto acústico e térmico”, disse Alessandro Caltagirone, o engenheiro responsável pelos esportivos “descapotáveis”.
Para lidar com o peso adicional de tal opção, Giuseppe Música, chefe de desenvolvimento da carroceria, afirmou que foi instalada uma nova barra de proteção estrutural de alumínio atrás dos dois assentos. De tal forma, é possível ter um mecanismo completo que é apenas 50 kg mais pesado do que uma capota flexível. Ao mesmo tempo, abre espaço para um porta-malas de 200 litros, generoso para um automóvel dessa concepção.
A Ferrari 12Cilindri está posicionada ao centro da atual gama da Ferrari, acima de Roma e Purosangue e abaixo de 296 e SF90. Utiliza a mais pura das configurações encontradas na marca: motor de 12 cilindros dianteiro-central, naturalmente aspirado, com 830 cv de potência e 69 kgfm de torque. Coincidentemente, repete o conjunto mecânico do primeiro automóvel a sair da linha de montagem de Maranello, a 125 S, de 1947.
A carroceria mede 4,73 metros de comprimento, 1,98 m de largura e 1,29 m de altura, o que significa que é um pouco mais comprida, alta e larga do que sua antecessora, a da 812 Superfast Spider. A distância entre-eixos de 2,70 m, no entanto, é 2 centímetros mais curta. O peso, por sua vez, aumentou 35 kg, atingindo 1.620 kg.
O intenso trabalho de reforço estrutural faz com que o conversível não perca muito em rigidez na comparação com o cupê. Para isso, as soleiras das portas são mais grossas e o método de montagem é específico para garantir que se integrem com perfeição entre os pilares A e B. O modelo possui, ainda, uma estrutura especial que combina três diferentes tecnologias de uso de alumínio: há painéis prensados, extrudados e fundidos.
No interior, os dois elegantes bancos esportivos são revestidos com uma harmoniosa simbiose de carbono e couro Alcantara. Se preferirem, os futuros proprietários podem escolher uma opção ainda mais esportiva, com apoios laterais reforçados e revestimento de fibra de carbono.
O painel revela uma separação clara, não apenas entre condutor e passageiro mas também no plano horizontal. Acima existem duas aberturas, para o quadro de instrumentos do motorista e o visor do passageiro, junto às saídas do ar-condicionado. Ao todo, são três telas, de 10,2 polegadas (à esquerda), de 15,6’’ (mais centralizada) e de 8,8’’ (à direita). A instrumentação tem gráficos modernos e precisos, mas demanda um certo tempo para o usuário se familiarizar.
O volante é repleto de botões e inclui o tradicional seletor de modos de condução rotativo “manettino”. Vale lembrar que a Ferrari ainda não oferece um head-up display para colocar à frente do motorista a informação mais importante em um carro desse tipo: a velocidade.
Seguindo, a 12Cilindri tem chassi de alumínio. A suspensão é independente de braços duplos sobrepostos na dianteira e multilink na traseira. Há também a função Lateral Slip Control, que permite curvas rápidas com um certo grau de perda de aderência para que o motorista tenha a sensação de que pode retomar o controle quando quiser. No caso do eixo traseiro direcional, as rodas posteriores podem girar independentemente até 2,5° em ângulos distintos, mas com uma diferença de ângulo que nunca ultrapassa 1° no mesmo eixo. É um sistema igual ao da Purosangue.
A frenagem é do tipo by-wire. A bomba convencional atrás do pedal do freio foi substituída por um sensor que mede a pressão sobre o pedal, enviando o sinal correspondente ao sistema hidráulico. Na outra extremidade, há discos cerâmicos de carbono de série e uma evolução do sistema ABS — que, de acordo com os engenheiros italianos, é capaz de detectar níveis de aderência mais cedo.
As rodas de 21 polegadas calçam pneus nas medidas 275/35 (na dianteira) e 315/35 (na traseira). O comprador poderá escolher entre as linhas Michelin Pilot Sport SS e Goodyear Eagle F1 Supersport.
Mesmo com um torque relativamente modesto (menos de 70 kgfm), a resposta do motor V12 pode deixar o motorista colado ao banco. E a relação peso/potência inferior a 2 kg/cv ajuda a explicar a aceleração incrivelmente rápida do carro: vai de zero a 100 km/h em 2,9 segundos e chega aos 200 km/h em 8,2 s. É um dos conversíveis mais velozes do mundo.
O câmbio automatizado de oito marchas e dupla embreagem tem comportamento abrupto. Já a suspensão Magnaride semiativa é confortável o suficiente para o uso diário, especialmente em modo Sport (que é sua programação “normal”). Mesmo no mapa Race, o conforto de rolamento é razoável — e aceitável para um esportivo.
Eis uma falha: não é possível combinar os parâmetros de condução conforme as preferências do motorista — ou seja, configurar uma suspensão mais suave com direção mais pesada, e vice-versa. De fato, a direção rápida e precisa não varia de acordo com o modo de condução selecionado, provando mais uma vez que os engenheiros da Ferrari confiam mais em seus anos de estudo do que na capacidade de seus clientes.
É um conversível que se encaixa perfeitamente numa viagem de fim de semana para a Riviera Francesa e nas ruas de Montecarlo, onde as lombadas são menos ameaçadoras para a área inferior da carroceria. Esse carro oferece o melhor acesso VIP à bella vita — um privilégio reservado a poucos.
Pela primeira vez em um motor aspirado foi desenvolvida uma estratégia de software para variar o torque máximo em função da mudança selecionada, gerando uma resposta mais suave e progressiva na transmissão. Quem me explicou isso foi Ruggero Cevolani, líder do projeto de motores da Ferrari. Combinada aos pneus maiores calçados em rodas de 21 polegadas, a solução proporciona relações de transmissão 5% mais curtas a velocidades mais baixas.
A Ferrari manteve a gigantesca cilindrada de 6,5 litros (mais de quatro vezes o tamanho do V12 original de 1947, que citamos anteriormente). Ao atingir 9.500 rpm, luzes vermelhas piscam na parte superior do volante para alertar o condutor. As bielas são de titânio, e componentes como pistões e virabrequim são feitos de materiais mais leves.
Certamente, os 830 cv e 69 kgfm não impressionam em tempos de propulsão elétrica em que os carros têm potência na casa do milhar e torque de três dígitos. Em defesa da 12Cilindri, é preciso considerar que este pode ser o último carro da Ferrari com motor V12 da história. Então, a saída é desfrutar o presente com as referências do passado e nos prepararmos para o futuro. Nada mais bella vita do que isso.
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Fonte: direitonews