Para Augusto Aras, dispositivo que prevê execução fiscal no foro de domicílio do réu preserva pacto federativo e autonomia dos estados
Foto: Antonio Augusto/Secom/MPF
Em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu a constitucionalidade da norma do Código de Processo Civil (CPC) que trata da competência para a execução fiscal, ou seja, a cobrança de crédito fiscal (imposto) inscrito em dívida ativa. De acordo com o dispositivo, a execução fiscal será proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado.
A manifestação foi no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.327.576/RS, representativo do Tema 1.204 da Sistemática da Repercussão Geral, que discute a constitucionalidade do artigo 46, § 5° do CPC. Na avaliação do procurador-geral, a opção legislativa acolhida no dispositivo “representa escolha legítima, democraticamente alcançada pelo Parlamento nacional, do qual os Estados-membros participaram por meio de seus representantes, o que cumpre com um dos conteúdos essenciais do federalismo”.
Augusto Aras sustenta que a referida norma do CPC preserva o núcleo essencial do pacto federativo e a essência da autonomia dos Estados-membros, nas modalidades de auto-organização e autogoverno, tendo em conta que as normas gerais tributárias têm caráter nacional, coordenando e preservando a harmonia do sistema fiscal, sem esgotar sua disciplina.
Em outro trecho do parecer, Aras salienta que a relação tributária é tipicamente assimétrica, com diferença de posições entre o Estado-fiscal e o contribuinte. Para ele, impelir o contribuinte a responder em foro diverso daqueles previstos no artigo 46, § 5° do Código de Processo Civil poderia, em situações-limite, inviabilizar o devido processo legal, dados os custos que demandam o acompanhamento adequado do feito. “Assim, o afastamento de tal regra poderia representar limitação ao acesso à Justiça, na medida em que dificultaria o exercício do direito de defesa pelos particulares”, frisa Augusto Aras.
Além disso, o PGR observa que os avanços da tecnologia no processo permitem aos entes estatais e aos seus representantes judiciais o recebimento de citações e intimações, assim como a prática de atos processuais em meio eletrônico, sem necessidade de deslocamento a outro Estado da Federação. Aras afirma, ainda, que a “equalização também ocorre com a paridade de tratamento, sobretudo se considerada a grande estrutura jurídica à disposição do Estado, em contraposição aos meios geralmente mais limitados dos particulares”. O procurador-geral acrescenta, ainda, que a regra de competência prevista no CPC equaliza o pacto federativo com a promoção do acesso à Justiça, destacado na Meta 16 do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU).
Caso concreto – O estado do Rio Grande do Sul ajuizou execução fiscal contra a Marilliam Comércio, Importação e Exportação de Artigos Domésticos visando ao pagamento de crédito fiscal inscrito em dívida ativa referente ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A empresa questionou a competência do Juízo do local da autuação fiscal, com base no artigo 46, § 5° do CPC. O Juízo originário acolheu a preliminar de incompetência e determinou a remessa dos autos ao Juízo de onde está sediada a empresa. Após vários recursos, o caso chegou ao STF por meio do RE 1.327.576/RS, que foi reconhecido como representativo para o Tema 1.204 da Sistemática da Repercussão Geral.
Tese – Por fim, o procurador-geral sugere a fixação da seguinte tese para a Repercussão Geral: “É constitucional a previsão de foro contida no art. 46, § 5º do Código de Processo Civil, mesmo que implique o ajuizamento de execução fiscal por Estado-membro perante o Judiciário de outro ente federativo, tendo em conta a escolha democraticamente alcançada pelo Parlamento nacional no exercício de sua competência para legislar sobre processo civil”.