Enquanto o diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI) iniciava reuniões com a equipe técnica do organismo para avaliar, entre outros temas, um novo acordo com o governo argentino, o presidente francês surpreendeu com uma publicação no X, em espanhol, na qual afirmou ter conversado com o presidente argentino Javier Milei sobre a situação econômica do país sul-americano e garantiu que “o povo argentino sempre poderá contar com o apoio da França”.
O presidente francês também enfatizou que “muito mais do que uma aliada em setores-chave, como metais críticos, a Argentina é uma amiga com quem queremos construir a economia do futuro“.
‘Ele é capaz de entregar qualquer coisa’
Para o economista argentino Julio Gambina, a referência do presidente francês aos recursos estratégicos da Argentina não surpreende, dadas as necessidades dos países europeus.
“No capitalismo transnacional, há necessidade dos bens comuns [recursos] da América Latina, Ásia e África e, portanto, surgem diferentes caminhos que levam a comprometer a transferência de soberania sobre esses recursos dos países do Sul para as empresas transnacionais”, alertou o especialista.
Também falando com a Sputnik, o sociólogo e doutor em economia Jorge Elbaum afirmou que referências a metais críticos estão começando a “virar moda” no contexto geopolítico, à medida que as potências buscam “obter os elementos básicos para eletrônica, computação e construção de drones”.
O analista enfatizou que é bem possível que esses interesses das potências encontrem eco no presidente argentino, dada sua ideologia e a urgência de seu projeto econômico.
“Milei é capaz de entregar qualquer coisa para demonstrar a privatização e a ‘estrangeirização’ de tudo, porque a soberania e o meio ambiente não existem em seu conceito“, enfatizou.
Para Elbaum, Milei usará os recursos minerais da Argentina da mesma forma que o ex-presidente Carlos Menem (1989-1999) usou as empresas públicas argentinas como “joias da avó”, que ele poderia penhorar em troca da obtenção de novos recursos para sustentar a taxa de câmbio e evitar o aumento da inflação.
Modelo ‘acabará por se esgotar’
Nesse sentido, Elbaum alertou que o modelo do governo argentino “acabará ficando sem recursos“, porque ficará sem recursos para vender e “um processo de desvalorização” começará.
“O problema da Argentina é que ela está tentando enfrentar a inflação de uma forma não competitiva; em vez de criar empresas que competem em preço e valor, ela está fazendo isso mantendo o valor do dólar, e isso tem seus limites porque o país não tem dólares suficientes”, argumentou o especialista.
Por essa razão, fechar um acordo com o FMI para obter um novo empréstimo se tornou tão urgente para o governo de Milei, concordam analistas. Gambina lembrou que, desde o início do ano, a Argentina destinou cerca de US$ 6 bilhões (cerca de R$ 34,4 bilhões) de suas reservas para conter o dólar como forma de reduzir a inflação, principal objetivo econômico do governo.
Para o economista, se a hipótese de que o FMI concederá um novo empréstimo de US$ 20 bilhões (mais de R$ 114,6 bilhões) se confirmar, o governo argentino destinará “entre US$ 5 bilhões e US$ 8 bilhões” (entre R$ 28,6 bilhões R$ 45,8 bilhões) desses recursos exclusivamente para “reforçar as reservas” e manter esse modelo. O restante, por sua vez, seria usado para honrar compromissos de dívida já assumidos com a mesma organização para o empréstimo de 2018.
“Milei sabe que sem o empréstimo, ela está em uma situação muito difícil devido à perda diária de reservas, o que criaria um desastre ligado ao peso. O único elemento importante que o governo de Milei tem, que é esse declínio fictício no valor do dólar, entraria em colapso”, acrescentou Elbaum.
Para o analista, o apoio de Macron permite que Milei “faça mais uma amiga” no cenário internacional, permitindo-lhe “resistir um pouco mais diante do desastre econômico que mais cedo ou mais tarde chegará” à Argentina.
Gambina explicou que a busca pelo apoio francês também é entendida no âmbito da urgência de Milei em “mostrar ao sistema global, e especialmente ao conselho do FMI”, que conta com apoio político, como o dos governos Trump e Macron, como representantes “dos principais governos do capitalismo global nos EUA e na Europa”.
Neste sentido, Elbaum acredita que um novo empréstimo do FMI à Argentina já foi acertado devido ao apoio político de Washington, mas ainda não se sabe “quando e como o peso argentino será desvalorizado”, o que acabará impactando a inflação e a agenda política do presidente argentino.
Fonte: sputniknewsbrasil