Augusto Aras diz que restrição aos dados por meio de carta rogatória e MLAT seria atraso para o Brasil no combate aos crimes cibernéticos
Foto: Divulgação/STF
Os procedimentos de carta rogatória e Acordo de Assistência Jurídica Mútua (MLAT, na sigla em inglês) não são as vias exclusivas para a obtenção, pelo Poder Judiciário brasileiro, de dados telemáticos que estejam sob o controle de empresas estrangeiras provedoras de internet com subsidiárias ou filiais no território nacional, ou que estejam armazenados em “data centers” em outros países. O entendimento do procurador-geral da República, Augusto Aras, foi manifestado em sustentação oral na sessão desta quarta-feira (28) do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 51, ajuizada pela Federação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional).
A ação pede a declaração de constitucionalidade do Acordo de Assistência Judiciária em matéria penal entre os governos brasileiro e dos Estados Unidos, mais conhecido como MLAT (Mutual Legal Assistance Treaty), bem como de dispositivos do Código de Processo Penal e do Código de Processo Civil que regulamentam as cartas rogatórias. Para a Federação, os dados privados armazenados por empresas que estão fora do território nacional somente poderiam ser entregues às autoridades brasileiras por meio do procedimento previsto no MLAT (acordo de cooperação) ou por via de carta rogatória.
Para o procurador-geral, no entanto, acolher a pretensão pleiteada na ADC 51 “lançaria inevitavelmente o Brasil no rol do atraso e da ineficiência”, principalmente, em se tratando de persecução criminal. Segundo Aras, restringir o acesso do Poder Judiciário aos dados de empresas estrangeiras sujeita o sistema nacional de Justiça “a um frustrado combate à criminalidade cibernética”.
Aras assinalou que decisões judiciais que determinam a requisição de dados de comunicação privada sob controle desses provedores por vias diversas do MLAT ou da carta rogatória não implicam a declaração de inconstitucionalidade desses dispositivos normativos. De acordo com ele, apenas nos casos em que a empresa estrangeira não tenha filial ou sucursal no Brasil, há a necessidade do MLAT ou da carta rogatória.
O PGR frisou que o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) determina a compulsória observância da legislação brasileira em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de Internet, desde que pelo menos um desses atos ocorra em território nacional. Segundo Augusto Aras, esse dispositivo possibilita às autoridades brasileiras requisitarem diretamente das empresas estrangeiras que prestam serviços ou tenham filial no Brasil dados de comunicação telemática decorrentes da utilização de aplicações de provedores de Internet, cuja sede de controle de dados (data center) não esteja localizada em território brasileiro.
Nesse sentido, o procurador-geral apontou que a aplicação dessa previsão do Marco Civil da Internet está em sintonia com diversos instrumentos internacionais e citou, entre outros, a Convenção de Budapeste (Convenção sobre o Cibercrime do Conselho da Europa). Essa convenção determina que os Estados prevejam em suas legislações internas poderes para que autoridades nacionais possam obter diretamente dados de empresas estrangeiras provedoras de internet que prestem serviço em seu território. O julgamento será retomado na sessão desta quinta-feira (29).
Ação rescisória – No início da sessão de hoje, os ministros concluíram a votação da Ação Rescisória (AR) 1.718, iniciada na sessão da última quinta-feira (22). Seguindo entendimento da Procuradoria-Geral da República, o Plenário acolheu a ação ajuizada pela União e desconstituiu a decisão monocrática no Recurso Extraordinário (RE) 263.464, que, por um erro de fato, declarou inconstitucional a incidência de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre o ouro. Em sustentação oral, o procurador-geral reiterou parecer do MPF, de 13 de janeiro de 2004, e opinou pelo acolhimento da ação rescisória ajuizada em 2002 pela União contra a empresa Paranapanema (incorporadora da Caraíba Metais).